Política

PL sobre religião causa polêmica na Câmara de Vereadores de Maceió

Vereadora Gaby Ronalsa apresenta projeto que versa sobre criação de estatuto da liberdade religiosa na capital alagoana

Por Thayanne Magalhães com Tribuna Independente 12/04/2023 10h37 - Atualizado em 12/04/2023 11h42
PL sobre religião causa polêmica na Câmara de Vereadores de Maceió
Vereadora Gaby Ronalsa ressaltou que o projeto é uma adaptação de propostas existentes em outros municípios - Foto: Reprodução

Tramita na Câmara de Vereadores de Maceió o Projeto de Lei “Estatuto da Liberdade Religiosa”, apresentado pela vereadora Gaby Ronalsa (PV) à Mesa Diretora. O projeto propõe a criação de um Estatuto de Liberdade Religiosa e o assunto já tem gerado discussões nas redes sociais.

À reportagem da Tribuna, a vereadora argumenta que o Projeto de Lei tem o intuito de proteger toda e qualquer religião. “Primeiro, é importante deixar claro que diferente do que está sendo propagado, inclusive nas redes sociais, o projeto ‘Estatuto da Liberdade Religiosa’ é claro, ao especificar que tem o intuito de proteger a liberdade de exercer toda e qualquer religião e não apenas a católica, assim como a liberdade de não professar nenhum credo”, explica.

Quanto à participação referente à elaboração da proposta, Gaby Ronalsa informou que o projeto não é criação sua e que já existe em outros entes federativos.

“Apenas trouxe e adaptei para Maceió, e, pelo que eu soube, ele foi elaborado por um adepto da religião de matriz africana, caindo por terra tal alegação [de que a vereadora estaria interessada em defender apenas a sua religião, a católica]. Então, por não ter sido idealizado por mim, eu não tinha como convidar nenhuma religião para participar da elaboração, destaque-se que também não sentei com religiosos católicos, se é isso que deduziram”, continuou.

Gaby Ronalsa ressalta que, como católica apostólica romana, defende os valores cristãos, mas que pensa no coletivo.

“Como eu não sou de segregar e sim de agregar, e pensando no coletivo e não no individual, trouxe a ampliação para todos, deixando claro no art. 1º que: fica instituído, no Município de Maceió, o Estatuto da Liberdade Religiosa, que se destina a combater toda e qualquer forma de intolerância religiosa, discriminação religiosa e desigualdades motivadas em função da fé e do credo religioso que possam atingir, coletiva ou individualmente, os membros da sociedade civil, protegendo e garantindo assim, o direito constitucional fundamental à liberdade religiosa a toda população maceioense”, explica a parlamentar.

A vereadora também cita que há casos de vandalismos com imagens sagradas e estas situações são prejudiciais e desrespeitosas.

“Todavia, presenciamos situações contínuas de intolerância religiosa e de vilipêndio e isso precisa parar! Vivenciamos tempos tempestuosos de desrespeito para com as religiões. Há inúmeros casos de vandalismos com imagens sagradas, igrejas e templos invadidos e profanados, pessoas perseguidas e impedidas de exercerem sua liberdade de consciência e crença, sofrendo prejuízos e tendo direitos mitigados. O Município de Maceió precisa de leis que realmente protejam as religiões e a liberdade de crença”, reforça.

O artigo 28 do projeto de lei prevê que o abate religioso de animais deve respeitar às disposições legais aplicáveis em matéria de proteção dos animais o que, para Gaby Ronalsa, torna descabida a alegação de que isso iria interferir nas religiões de matriz africana.

“Isso é o óbvio! Todo e qualquer ato deve ser pautado em legislação pertinente, por isso a existência dessa previsão, contudo não quer dizer que com isso eu estou restringindo um direito ou interferindo em uma religião. Diferente seria se estivesse previsto: ‘o abate de animais está vedado, em respeito ao não sofrimento animal’, e não é isso que está escrito”, explica.

Quanto ao papel do Município em relação à religiosidade, a vereadora defende que se deve estar atento e vigilante para que os princípios que dizem respeito à liberdade religiosa, presentes na Declaração dos Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário, e também presentes na nossa Constituição Federal, não sejam violados.

Mãe Graça de Oxum defende que vereadora ouça representantes

Para a Mãe Graça de Oxum, dirigente do Templo de Umbanda Cabocla Jurema e Caboclo Ubirajar, a vereadora Gaby Ronalsa (PV) deveria ouvir representantes de todas as religiões para que a lei valha para todos.

“A liberdade religiosa está relacionada ao conceito de laicidade, e para ser criada um estatuto sobre esse tema devem ouvir as necessidades da liderança de todas as religiões praticadas no município. Pois, as necessidades e tudo o que assegura o direito de professar a fé ou culto de cada religião são distintas umas das outras”, opina Mãe Graça de Oxum em contato com a reportagem da Tribuna.

Ela lembra que a Quebra de Xangô foi a maior forma de silenciar e agredir os adeptos das religiões de matrizes africanas em Alagoas. Foi no ano de 1912, quando milícias armadas destruíram terreiros e casas religiosas de matriz africana, além de violentar e expulsar seus adeptos.
“Continuamos sofrendo intolerância religiosa todos os dias e não existem garantias que nós, religiosos de terreiros, teremos um dia direito de expressar nosso culto em praça pública. Nossos terreiros são invadidos e destruídos com uma frequência muito elevada”, disse a religiosa à Tribuna.

Mãe Graça de Oxum comenta ainda que a Legislação diz que o Brasil é laico.

“O artigo nº 5 da Constituição trata especialmente da liberdade religiosa e de crença: ‘é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias’, diz o texto.

“E mesmo com leis não temos garantias nenhuma que não sofreremos ataques. A princípio, não há nada de errado em políticos revelarem suas convicções religiosas e serem a voz, nas instâncias de poder, das populações que professam a mesma religião. Tal representatividade pode ser benéfica à democracia, ao opor diferentes perspectivas existentes na sociedade. Mas, para que isso aconteça, os representantes de todas as religiões precisam ser ouvidos”, defende a Mãe Graça de Oxum.

“Entendo que a vereadora queira contribuir para garantir interesse de todas as religiões e da sociedade como um todo, e não somente de grupos específico, mas para que a lei valha para todos precisamos ser ouvidos também”, concluiu.