Interior

Município de Piranhas quer perícia sobre limites territoriais em Usina de Xingó

Cidade alagoana perdeu ano passado direitos sobre ICMS relativos à geração de energia da hidrelétrica

Por Wellington Santos / Tribuna Independente 28/09/2024 15h30 - Atualizado em 28/09/2024 15h55
Município de Piranhas quer perícia sobre limites territoriais em Usina de Xingó
Complexo Hidrelétrico de Xingó é motivo de briga judicial do ICMS por mais de 20 anos entre as duas cidades e que o STF decidiu favorecer sergipanos - Foto: Adailson Calheiros

A Tribuna traz à baila nesta edição de fim de semana a quarta e última reportagem sobre os imbróglios de divisas e territórios que, ao longo do tempo, têm colocado Alagoas com histórias de conflito de divisas, estaduais, municipais e até interestaduais.

Nas três edições anteriores, a reportagem mostrou como se encontram os conflitos e polêmicas territoriais envolvendo os municípios de Maceió e Rio Largo sobre os impostos gerados pelo Aeroporto Internacional Zumbi dos Palmares.

Em outras duas, a Tribuna trouxe à tona a confusão gerada na população da trinca de municípios da Região Metropolitana como Rio Largo, Satuba e Maceió sobre os limites e, consequentemente, sobre quem tem direito a cobrar os impostos territoriais, como o IPTU, água e energia.

Esta semana, a Tribuna mostra um desses que ultrapassam os limites do Estado. Atualizamos o leitor de como se encontra a briga travada pelo município sertanejo de Piranhas, que perdeu, recentemente, a disputa judicial em impostos como o ICMS para o município Canindé do São Francisco, em Sergipe, por conta da Usina Hidrelétrica de Xingó.


Imagem na divisa entre Alagoas e Sergipe no limite dos municípios de Piranhas, do lado alagoano (Foto: Adailson Calheiros)


SUPREMO DECIDIU DISPUTA DE MAIS DE 20 ANOS

Mesmo perdendo em decisão no Supremo Tribunal Federal (STF), a novidade é que Piranhas vai requerer uma nova perícia sobre os limites onde está instalado o Complexo Hidrelétrico de Xingó, situado a 12 km do município alagoano e a 6 km do município de Canindé do São Francisco/SE (Veja detalhes nos textos abaixo e ao lado).

Uma perícia realizada pelo Exército Brasileiro foi fundamental para decisão. A fronteira foi definida pela linha de maior profundidade do Rio São Francisco.

Como se sabe, em 30 de junho de 2023, o Plenário do STF definiu, por unanimidade, que as unidades geradoras de energia elétrica de Xingó estão situadas no Município de Canindé do São Francisco (SE). A decisão se deu, no julgamento da Ação Cível Originária (ACO) 631, em que o município sergipano pedia a definição do limite entre ele e o Município de Piranhas.

Em seu voto pela procedência do pedido, o relator, ministro Edson Fachin, observou que, segundo laudo pericial apresentado pelo Exército, o limite entre as duas cidades é a linha de maior profundidade (talvegue) do leito do Rio São Francisco, e as instalações da casa de força (unidades geradoras) de Xingó estão completamente situadas em Canindé do São Francisco. O talvegue é o curso d’água principal em um vale, que funciona como o ponto mais baixo da área e ao longo do qual a água flui.

Segundo Fachin, as unidades geradoras de eletricidade estão situadas no município de Canindé, enquanto Piranhas abriga, somente, os vertedouros da usina, em que é descarregada a água não utilizada na geração de energia.

Imagem na divisão em Canindé do São Francisco, do lado sergipano (Foto: Adailson Calheiros)

Os ministros levaram em conta principalmente uma perícia feita pelo Exército brasileiro no ano de 1972. O estudo concluiu que o critério definidor da divisa é o chamado talvegue do rio, que é a sua linha de maior profundidade.

“Onde não foi possível identificar o talvegue, adoto o critério pericial da linha geométrica que liga os pontos da intersecção observada e que se aproxima do curso e da direção do talvegue do rio original. Conclui-se, dessa forma, que a casa de força do Complexo Hidroelétrico do Xingó, ou seja, a unidade geradora da hidroelétrica, situa-se no município de Canindé do São Francisco”, disse o relator Edson Fachin em seu voto.

O município sergipano foi defendido na causa pelo advogado José Rollemberg Leite Neto, sócio do escritório Eduardo Ferrão Advogados Associados. Segundo ele, a decisão evitará que a arrecadação de tributos de Sergipe seja cortada pela metade. Até julho de 2023, o acumulado de ICMS distribuído a Canindé era de R$ 39 milhões.

“A decisão pacifica a declaração de produção da referida Usina, para fins fiscais, e, por conseguinte, o modo como o ICMS é distribuído para os municípios sergipanos, o que também era alvo de constantes discussões”, disse o advogado, na ocasião do julgamento ano passado.

Com a decisão, a arrecadação de R$ 39 milhões em ICMS deixa de ser repartida entre os estados, o que pelo visto acarretaria para Alagoas um prejuízo de pelo menos R$ 18 milhões só no primeiro semestre de 2023. A Tribuna tentou confirmar os valores, tanto com a prefeitura de Piranhas como tentou falar com a Secretaria da Fazenda de Alagoas (Sefaz), mas não conseguiu confirmar a informação.

A decisão de 30 de junho de 2023 pôs fim a uma disputa de mais de 20 anos entre Sergipe e Alagoas.

“PERÍCIA DO EXÉRCITO E DO IBGE É ANTIGA E BASEADA SÓ EM FOTOS”, CONTESTA ADVOGADO

Em contato com a Tribuna, o advogado Marcelo Tadeu, que representa os interesses do município de Piranhas e um dos integrantes do Escritório Bulhões & Bulhões, é taxativo ao analisar as possibilidades de reversão do caso, mesmo com o veredicto do STF em favor do município sergipano. “Solicitamos uma nova perícia sobre os limites territoriais de Xingó, porque entendemos que a perícia que foi feita está baseada apenas em fotos e artigos de jornais, isso no ano de 1972, ou seja, há muito tempo”, argumenta o advogado.

Ele reforça que a perícia foi solicitada pelo Exército e requerida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) “no escritório que fica do lado sergipano” e completa: “A decisão do STF não se refere a valores pecuniários, como saiu na imprensa, mas apenas onde estão localizados os motores da Usina de Xingó”, diz Marcelo Tadeu.

Nos autos, a defesa de Piranhas argumenta que o Complexo Hidrelétrico de Xingó estaria localizado nos dois municípios – embora alegasse, também, que a decisão do STF não impactaria a sua arrecadação tributária.

O município alagoano baseou sua decisão de recorrer à decisão do STF com os chamados “embargos de declaração”, que buscam esclarecer pontos eventualmente omissos ou contraditórios do julgamento.