Interior
Esquema irregular de venda de óculos renderia R$ 960 mil a oftalmologistas
Mutirão realizado por médicos em Murici oferecia consultas gratuitas, desde que fossem pagos valores abusivos por óculos
Cerca de 1.600 pessoas na cidade de Murici, em Alagoas, se tornaram alvo de um suposto esquema de irregularidades detectado pelo Conselho Regional de Medicina de Alagoas (Cremal). A fiscalização constatou a prática de venda de óculos com alegação de prestação de serviço social e diagnósticos oftalmológicos imprecisos. Cada óculos seria vendido a R$ 600,00, o que poderia gerar uma renda média de R$ 960 mil apenas na cidade.
A fiscalização realizada na manhã de ontem (6) identificou que três médicos de São Paulo realizavam triagem de pacientes em cidades alagoanas onde aconteciam os mutirões. A empresa, registrada em Goiás, que tinha os médicos como sócios, produzia os óculos de acordo com os atendimentos realizados, mas com um preço muito acima do mercado.
“Eles não cobravam a consulta, mas nos valores dos óculos já vinha a consulta embutida. Os óculos chegavam a R$ 600,00, onde um óculos para pessoas de baixa renda, com receita, não passa de R$ 200,00. Só em Murici iam atender 1.600 pessoas. Imagina o lucro que eles teriam”, diz o presidente do Cremal, Fernando Pedrosa.
Ainda segundo Pedrosa, as irregularidades vinham sendo investigadas há três meses, mas o suposto esquema estava em atividade no Estado desde setembro do ano passado.
“A equipe médica entrava em contato com a Secretaria de Saúde dos Municípios com a alegação de que iria realizar um trabalho comunitário”, diz Fernando Pedrosa.
Um paciente de Marechal Deodoro fez a denúncia a partir de um produto mal confeccionado pela empresa, a partir daí as investigações começaram.
“Como esses médicos haviam se inscrito no conselho, solicitando a inscrição provisória, dizendo que iam fazer um trabalho humanitário, nós acreditamos que era uma ONG [Organização não Governamental]. Aí, foi quando uma pessoa que tinha feito exame de vista e os óculos com essa empresa procurou uma conselheira nossa dizendo que não tinha ficado bom e que ia deixar de pagar, mas tinha começado a sofrer ameaças de cobrança, de inclusão em cadastro de crédito, foi aí que descobrimos que não era trabalho humanitário, que era um trabalho vinculado e irregular”, explica.
A prática segundo o presidente do Cremal “não é legal e nem ética, chamada de venda casada”, porque obriga os pacientes a confeccionarem os óculos a partir de uma consulta aparentemente ‘gratuita’. Outro problema encontrado foi a forma como o diagnóstico era realizado, com um equipamento insuficiente para detectar patologias na visão.
“Eles fizeram uma triagem e identificaram quem supostamente pode ter um déficit visual. O equipamento que eles têm lá não é suficiente para a consulta. É uma máquina destinada à medição do grau, que não detecta outros problemas. É possível que pessoas tenham sido diagnosticadas inadequadamente ou pago por óculos que não precisavam de fato”, destaca o presidente.
COMUM
A venda casada de consultas e óculos é recorrente no Estado, diz o presidente Fernando Pedrosa. Segundo ele, o órgão está em alerta e realizando fiscalizações no sentido de coibir práticas irregulares.
“Nós estamos nesse encalço também, já condenamos um médico que trabalhava com isso e estamos aguardando a decisão da Justiça para dar divulgação da sentença. Muitas pessoas, sem a devida capacitação, atuam receitando óculos. É o caso dos optometristas. Para eles precisamos do apoio da Polícia e Vigilância Sanitária porque não são médicos. Fizemos uma operação em Arapiraca há três semanas nesse sentido”, diz.
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