Economia

Medo do Aedes faz venda de repelente disparar e impulsiona novos negócios

Fabricante do Exposis foi comprada pela gigante SC Johnson e marcas como SBP e Baruel resolveram também entrar no filão

Por G1 01/02/2017 15h57
Medo do Aedes faz venda de repelente disparar e impulsiona novos negócios
Reprodução - Foto: Assessoria

O medo de contrair alguma doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypt, vetor da zika, chikungunya, dengue e febre amarela, fez não só disparar a venda de repelentes no país como também acirrar a disputa por esse mercado. Multinacionais e pequenas fabricantes entraram no segmento e marcas em ascensão, como o Exposis, foram alvo de aquisições.

Essa categoria de consumo foi uma das poucas que registrou crescimento em meio à recessão. As vendas de repelentes no Brasil saltaram 49% em volume em 2016 na comparação com 2015, após terem crescido 32,5% no ano anterior, segundo dados da consultoria Nielsen. Em receita, o crescimento foi ainda maior, de 84%, depois de um aumento de 49,5% em 2015, em meio a forte demanda pelo produto e disparada dos preços no ano passado.

Repelentes de alta duração chegaram a sumir das prateleiras entre o fim de 2015 de começo de 2016, sobretudo depois que o Ministério da Saúde reportou a relação entre o surto de zika e bebês com microcefalia.

As vendas de marcas como Exposis, que até o início de 2016 era o único repelente do mercado brasileiro com a substância icaridina (de mais longa duração), aumentaram em até 30 vezes em 1 ano, o que chamou a atenção tanto dos grandes laboratórios como de pequenos empreendedores, que decidiram apostar neste novo mercado.

Dona da Off! compra Exposis

Em dezembro, a gigante norte-americana SC Johnson, dona das marcas OFF! e Raid, anunciou a sua entrada no segmento de repelentes a base de icaridina com a compra do laboratório de origem francesa Osler do Brasil, fabricante do Exposis. O valor da transação não foi divulgado.

"Desde que as doenças transmitidas por mosquitos, como Zika e dengue, atingiram a América Latina, vimos a demanda aumentar. Nós também identificamos um aumento significativo nas vendas repelentes este ano", diz Stephane Reverdy, presidente da SC Johnson no Brasil. "Podemos assegurar que teremos capacidade de fabricação para atender possíveis demandas extras que podem surgir além das previsões atuais".

A compra da Exposis foi anunciada um mês após a concorrente anglo-holandesa Reckitt Benckiser (RB), dona da marca SBP e Repelex, ter lançado a sua primeira linha de repelentes para o corpo com icaridina em sua fórmula. “A indústria vê hoje a proteção dentro de casa e fora de casa como duas categorias, estamos tentando fazer sumir essa barreira", diz Loic Lelann, gerente de marketing da SBP. Desde a década de 70, a marca usa a assinatura “Terrível contra os insetos. Contra os insetos”, mas até então não tinha um repelente corporal, apenas soluções para a casa, como aerosol e repelente elétrico.

Embora não divulgue valores, a RB afirma que o lançamento do repelente com icaridina foi o maior investimento da história da RB no Brasil e que elevará em 30% os investimentos em publicidade em relação ao ano anterior.

A Baruel, que atua no segmento de cuidados para os pés, foi outra que decidiu lançar uma linha própria de repelentes no final do ano passado, incluindo também opções com icaridina. Segundo a empresa, já foram colocadas cerca de 150 mil unidades no mercado e a expectativa é se posicionar entre as 4 maiores marcas do segmento.

Ainda que mais caros, os produtos à base de icaridina passaram a ser os mais procurados em função de sua baixa toxidade e da longa duração de seu efeito. Alguns chegam a prometer 10 horas de proteção, ainda que médicos e fabricantes alertem que, em dias muito quentes ou no caso de contato com a água, o produto precisa ser reaplicado com maior frequência.

Além da substância icaridina, outros dois princípios ativos aprovados pela Anvisa protegem contra o Aedes aegypti: DEET e IR3535. O que os diferencia é o tempo de ação.

Número de produtos mais que dobra

Levantamento do comparador de preços Zoom mostra que o número de opções de repelentes disponíveis no mercado mais do que dobrou, saltando de 139 em janeiro de 2016 para 351 em janeiro deste ano. Os mais buscados no comércio eletrônico são Exposis, Repelex e SBP Advanced.

Segundo estudo da Kantar Worldpanel, 75% das famílias que compraram repelentes em 2016 não tinham adquirido o item em 2015 e 2014. O levantamento aponta ainda que aumentou em aproximadamente 800 mil o número de residências que passaram a comprar o produto.

Pequenas fabricantes

A corrida por repelentes a base de icaridina também impulsionou o crescimento da produção de empresas menores brasileiras. A Henlau, fabricante do Sunlau, lançado em janeiro de 2016, viu seu faturamento crescer 40% no ano passado.

A empresa, que atua no mercado de protetor solar e repelente há mais de 15 anos foi uma das pioneiras em produto a base de icaridina no país. Segundo o engenheiro químico e fundador da Henlau, Norberto Luiz Afonso, a oportunidade de negócio foi enxergada antes mesmo do surto de zika no final de 2015.

"Foi empreendedorismo. Quando veio o Exposis para o Brasil, decidimos pesquisar como fabricar um repelente com icaridina. Levamos 3 anos para o registro na Anvisa, que saiu justamente na hora em que veio a epidemia", conta o empresário.

Até então, a empresa, com sede em Garça (SP) e 45 funcionários, atuava basicamente no mercado profissional, como fornecedora de equipamentos de proteção individual, os chamados EPIs, para trabalhadores que atuam em construção civil e em locais de mata e selva ou que tenham proliferação de mosquitos.

Protetor solar e repelente 2 em 1 com icaridina

O dono da Henlau explica que o único produtor de icaridina é o laboratório alemão Bayer, que detém sua patente. "Consegui trazer o ativo para o Brasil importando diretamente através de um distribuidor exclusivo na Itália", diz Afonso.

A empresa afirma ter vendido 1,2 milhão de unidades do repelente Sunlau no primeiro ano de atuação no mercado, o que resultou em um faturamento de R$ 24 milhões ou cerca de 60% do faturamento da empresa no ano.

Para 2017, a Henlau projeta dobrar a produção e fazer suas primeiras exportações. A empresa também lançou neste mês um protetor solar e repelente 2 em 1, também a base de icaridina, anunciado como o "primeiro do tipo no mundo".

"É uma inovação. Conseguimos adaptar a matéria-prima a icaridina no protetor solar e estabilizá-la. Hoje é único no mercado, mas com certeza vai vir outros também. Então tenho que aproveitar esse timing", diz o empresário, que diz ter investido R$ 600 mil no projeto.

Outra brasileira pioneira é a Alergoshop, especializada em produtos para pessoas alérgicas e que atua no mercado de repelentes com icaridina desde 2012. Segundo a empresa, as vendas cresceram 28% no ano passado. A sócia-diretora Sarah Lazaretti afirma, no entanto, já estar sentindo o efeito do aumento da concorrência.

"Em 2015 foi um absurdo as vendas, não dávamos conta de produzir a quantidade para atender toda a demanda. Já em 2016 não foi igual", diz a empresária. A produção da empresa é terceirizada e o faturamento em 2016 ficou em cerca de R$ 10 milhões.

Futuro do mercado de repelente

Segundo levantamento do Zoom, a procura por repelentes cresceu 62% na segunda semana de janeiro, na comparação a segunda semana de dezembro de 2016. Já os preços caíram cerca de 15% na comparação com 1 ano atrás.

Apesar do aumento da demanda por repelentes estar diretamente relacionado com os surtos de doenças e as preocupações relacionadas à proliferação do Aedes, o entendimento da indústria é que a demanda continuará em alta em 2017 e próximos anos, e que o uso do produto tende a ser cada vez mais frequente.

"Quando tem esses booms as pessoas aprendem, passam a usar as coisas que elas conhecem. Antes ninguém sabia o que era icaridina. Vai ter um consumo perene", acredita Sarah.

Loic Lelann, da RB, lembra que se trata de uma categoria com penetração ainda muito baixa nas residências. Para ele, o repelente tende cada vez mais a integrar a cesta padrão de consumo dos brasileiros e produto de uso rotineiro e não só para o verão.

“Obviamente, tem uma parte de negócios por trás disso, mas é uma questão de saúde pública, sobretudo. A empresa vê uma oportunidade em nível mundial uma vez que este é um dos grandes desafios de saúde pública no mundo”, afirma.