Ciência e Tecnologia

Estrangeiros dominam pedidos de patentes e marcas no Brasil

Instituto Nacional de Propriedade Industrial reconhece importância de professores pardais no país

Por Mário Lima / Wellington Santos 17/05/2024 00h11 - Atualizado em 17/05/2024 17h52
Estrangeiros dominam pedidos de patentes e marcas no Brasil
Para Fábio Barros do INPI, grande mercado consumidor do Brasil vem atraindo muitas empresas estrangeiras, como China e Estados Unidos - Foto: Edilson Omena

O Brasil pode estar passando por uma forma de neocolonialismo, pelo menos no que se refere a pedidos de patente e propriedade industrial junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). Para se ter uma ideia do atual cenário de registro, entre 50% e 70% dos pedidos vêm do exterior, principalmente da China, Europa e Estados Unidos. O tigre asiático é o recordista mundial na fila de registros e patentes, chegando ao espetacular número de um milhão de pedidos anuais de registro em todo mundo, contra, por exemplo, os 30 mil pedidos por ano no Brasil.

“Mais da metade das patentes que são depositadas no Brasil pelo INPI é de estrangeiras, em áreas específicas. O Brasil como grande mercado consumidor atrai muitas empresas estrangeiras e elas querem expandir essas tecnologias que possuem em outros países como o Brasil. Eles trazem para cá a tecnologia de seus produtos no sentido de proteger a marca. O Brasil, apesar de seu desenvolvimento tecnológico, não consegue ainda atingir esse patamar, e um nível de competição igualitária a nível dessas patentes que vem do exterior”, revela Fábio Barros, doutor em Ciências de Alimentos da Universidade de Campinas (Unicamp) e examinador de patentes do INPI.

O doutor em Ciências de Alimentos da Universidade de Campinas (Unicamp) e examinador de patentes do INPI, Fábio Barros - Foto: Edilson Omena

Barros foi um dos conferencistas do painel Propriedade intelectual – Trâmites prioritários de processos – no quarto dia do 8º Congresso Internacional Profnit e 14º ProspeCT&I – que está sendo realizado em Maceió, no auditório do Sebrae Alagoas. Os eventos vão até esta sexta-feira (17), com o patrocínio do Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Caixa e Governo Federal, e realização do Fórum de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia (Fortec) e da rede Profnit, maior programa de mestrado e pós-graduação em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia e Inovação do país.

Ainda segundo Fábio Barros, o INPI, escritório do Governo Federal para patentes, enfrenta problemas de infraestrutura, como a falta de pessoal para atender a demanda cada vez mais crescente de pedidos de registro de patentes. Hoje são 300 examinadores em média do INPI, para examinar os 30 mil processos em trâmite hoje, o que significa mil exames anuais para cada servidor.

“A questão é que temos um grande volume de pedidos, mesmo que não seja da mesma magnitude de uma China, mas o problema é a quantidade de pessoal. Entre as medidas que estão sendo tomadas para melhorar o INPI é a contratação de novos servidores para dar maior vazão aos pedidos. Agora mesmo acaba de sair o resultado do concurso para novos examinadores, que devem ter curso de mestrado concluído e conhecimento tecnológico”, assinalou Barros.

O INPI trabalha também para acelerar os processos e pedidos, já que até uma patente ser concedida, os trâmites podem durar até 20 anos. Essas barreiras podem ser atenuadas na sequência do processo – que vai do depósito até a concessão da patente. “Os produtos podem ter as patentes pendentes ou produtos patenteados, o que pode melhorar a reputação e permitir a comercialização, a partir do próprio pedido de depósito. Além de melhorar a delimitação. O titular pode ser mais forte em caso de disputa”.

PROFESSOR PARDAL E PIRATARIA

O INPI ver com bons olhos, por exemplo, as invenções vindas do povo, do pesquisador popular, dos curiosos que trabalham em fundos de quintais, quase todos eles desconhecidos do mundo acadêmico ou de pesquisas. É o que o examinador de patentes Fábio Barros chama de “inventor isolado”.

“Os professores pardais são chamados por nós de inventores isolados e eles são muito importantes no sistema de propriedade intelectual. Muitos deles se transformam em vetores isolados que surgem de todos os lados com grandes invenções de sucesso. Existem muitos casos exitosos no Brasil”, revela Barros.

Técia Carvalho, Pós-Doutora pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Engenharia e Doutora pelo Instituto Federal de Educação e Tecnologia do Ceará pela Renorbio, ao lado do reitor da Ufal, Josealdo Tonholo, e o presidente da Cooperativa de Jornalistas e Gráficos do Estado de Alagoas, José Paulo Gabriel - Foto: Edilson Omena

Para ele, o país não corre o risco de pirataria, pelo menos com relação a pedido de registros de patente. “Não cabe em nossa área, pois existe um trâmite chamado de expectativa de direito, quando a partir do depósito já existe um resguardo. Por exemplo: a patente não foi concedida, aí o inventor faz uma notificação extrajudicial contra os concorrentes que está usando a sua tecnologia. Mas importante: isso é uma prerrogativa do inventor, o INPI não interfere nesse aspecto. É preciso que ele esteja ligado ao que está acontecendo, observando o mercado”, sugere Barros.

INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

No Brasil, a impossibilidade de indicação ou de nomeação de inteligência artificial como inventora em um pedido de patente foi anunciada pelo INPI, através de publicação na Revista de Propriedade Industrial (RPI) 2696 de 06/09/2022. Essa decisão resultou na publicação da retirada do pedido de patente da fase nacional brasileira, cabendo ao requerente do mesmo a possibilidade de recorrer desta decisão. A Procuradoria do INPI se baseou no disposto no Art. 6 da Lei nº 9.279/96 (doravante, LPI), na CUP (Convenção da União de Paris) e no Acordo TRIPS (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio) para barrar o pedido de registro.

“No caso de inteligência artificial não seria para gerar o documento, mas para gerar tecnologia, então uma etapa anterior. Já foi dito por nossa Procuradoria que existem outros pareceres de outras instituições internacionais que não consideram a inteligência artificial uma ameaça. Em última instância, inclusive no nosso ordenamento jurídico, são pessoas que criam as coisas, não são as máquinas. Em softwares, por exemplo, que não é um ente corporificado, embora algo artificial, a criação é humana”, finalizou Flávio Barros.

“PÓS-GRADUAÇÃO PRECISA SER MENOS ENGESSADA E MAIS INOVADORA NO PAÍS”

Nos debates da parte vespertina durante o Profnit na quinta-feira (16), o destaque ficou para o painel “Modelo de Avaliação: Desafios e Perspectivas”, cuja mediadora foi a professora Wagna Piller Carvalho e que teve como palestrantes o diretore de Avaliação da Capes, Antônio Gomes de Souza, e o professor Eduardo Winter, que é coordenador de Área da Capes.

Diretor de Avaliação da Capes, Antônio Gomes disse ontem que Pós-Graduação ainda está engessada no país (Foto: Edilson Omena)

Professor Eduardo Winter, da Capes, foi um dos palestrantes de ontem no Profnit (Foto: Edilson Omena)

A Capes é a abreviação de Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Essa fundação faz parte do Ministério da Educação (MEC) e é a responsável por incentivar, regrar e dispor sobre os cursos de pós-graduação stricto sensu (Mestrado e Doutorado). A instituição também atua na formação de professores da educação básica no Brasil.

“Infelizmente, nosso sistema de pré-requisitos para o ingresso da Pós-Graduação ainda é engessado”, pontuou Antônio Gomes, ao levar uma reflexão do público presente do Profnit e ressaltar que poucos profissionais mudam de área ao ingressar no Mestrado ou Doutorado, o que leva à formação de pesquisadores e profissionais com perfil menos diversificado ao mercado.

“A ambiência da Pós-Graduação precisar motivar o estudante a ser inovador, encorajando projetos criativos nas suas atividades ou na interação com outros setores da sociedade”, completou Gomes.

O diretor da Capes revelou ainda que a maioria da qualificação (e atuação) dos pós-graduandos tem sido para as áreas da Administração Pública nas esferas federal e estadual e na Educação. “A boa notícia é que temos gente bem qualificada nessas duas áreas de atuação de quem termina a Pós-Graduação”, ressaltou o diretor da Capes.

Durante a explanação, foi revelada ainda a informação de que a oferta de Pós-Graduação nos municípios brasileiros saltou em 1970 de apenas 23 municípios para 323 cidades em 2022.

O quarto dia do 8º Congresso Internacional Profnit e 14º ProspeCT&I – que está sendo realizado em Maceió, no Sebrae Alagoas -, contou ontem com a presença de Técia Carvalho, Pós-Doutora pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Engenharia e Doutora pelo Instituto Federal de Educação e Tecnologia do Ceará pela Renorbio, ao lado do reitor da Ufal, Josealdo Tonholo, e o presidente da Cooperativa de Jornalistas e Gráficos do Estado de Alagoas, José Paulo Gabriel.

Assista ao vídeo do quarto dia do evento: