Cidades
Sacramento anuncia fechamento após 118 anos: ‘um desgosto sem tamanho’
Encerramento das atividades do colégio causa tristeza em ex-alunos

Após 118 anos de funcionamento, o tradicional Colégio Sacramento anunciou o encerramento das atividades em Maceió. A notícia foi recebida com muita tristeza pelos alunos e ex-alunos da instituição. A professora Ana Carolina Beltrão é ex-aluna do colégio, junto com os dois irmãos e o filho. Ela disse sentir uma dor gigante com o comunicado emitido pela escola.
“Uma dor gigante. Um verdadeiro desgosto sem tamanho. Ver o meu colégio, das mais profundas e melhores lembranças de minha vida, onde fiz meus melhores amigos, laços indestrutíveis. Como me dói ler a notícia de seu fechamento. Inacreditável. O meu sonho era ter um filho que estudasse no Sacramento. Eu dizia que, no dia em que eu tivesse um filho, ele estudaria lá porque tudo que eu vivi, tudo que eu passei, os meus melhores amigos, tudo foi no colégio. E meu sonho era que ele concluísse os estudos no Sacramento, assim como eu e meus irmãos”, afirmou.
Ana Carolina Beltrão disse que tirou o filho da escola com muita dor no coração e revolta. “Ele já estava há oito anos estudando lá com os coleguinhas. Meu filho sempre pergunta: mamãe, e os meus amigos do Sacramento? É um colégio gigantesco, com uma estrutura gigantesca que você não encontra em nenhum outro. É uma dor. Um colégio tradicionalíssimo”, contou.
A ex-aluna acredita que diversos fatores levaram ao fechamento do colégio, como a redução na quantidade de alunos, o grande número de funcionários, as despesas com manutenção e segurança. Ela disse que, há cinco anos, tentou conversar com a direção para que evitasse culminar no encerramento das atividades da instituição.

“Como administradora e professora, ex-aluna e mãe de aluno que lá estava, clamei para que a gestão ‘nova’ me ouvisse. Muito triste, eu entendo que existe hierarquia, mas as irmãs de antigamente eram polivalentes, formadas em várias universidades fora, elas eram completas em contabilidade, finanças. Nos últimos anos, eu já percebia uma queda na formação dessas sacramentinas. Eu vi na carta que foi a dificuldade de acompanhar o avanço tecnológico, mas não foi. Acho que foi falta de visão dos gestores e dos próprios profissionais contratados”, desabafou.
Ana Carolina Beltrão estudou da quinta série até o terceiro ano do ensino médio no Sacramento, concluindo os estudos em 1995. Segundo ela, a turma ainda tem contato e costuma realizar reencontros. “São quatro turmas, aí temos entre 40 e 50 alunos em cada grupo. De cinco em cinco anos, nos reunimos, fazemos missa no colégio e nos reencontramos”, disse.

A educadora Maria Lydia Lyra Costa, de 63 anos, também é ex-aluna do Sacramento, junto com os três filhos. Segundo ela, foi um choque receber a notícia do fechamento. “Foi um choque quando abri o WhatsApp e lá estava a notícia em diversos grupos. Chorei muito. Olho para o colégio e caio no choro. Não tem como não ficar triste, ainda mais eu, morando na mesma rua e passando sempre pela porta. Realmente, é uma dor ver um colégio de 118 anos fechar. Eu vou olhar todo dia e ver ele fechado”, contou.
Maria Lydia iniciou os estudos na instituição aos quatro anos de idade, mas saiu aos seis anos e depois retornou na quinta série, permanecendo até concluir o terceiro ano do ensino médio, em 1976.
“Terminei em 1976, mas desde 1977, fazemos encontro todos os anos. Antigamente, levávamos as irmãs todos os anos para o encontro. Mas depois não levamos mais porque já estavam bem velhinhas e nós éramos mais ou menos 80 alunos. Desses 80, alguns já se foram. A turma é muito unida e animada. A mais nova da turma tem 62 anos, a maioria tem 63 anos e o resto 64 e 65”, afirmou.
As filhas mais velhas de Maria Lydia – Maria Daniela e Ana Paula – concluíram os estudos no Sacramento, assim como a mãe. “No meu tempo, gostava bastante da equipe e algumas madres, que eram da minha época, minhas filhas alcançaram, como as irmãs Altina, Jacinta e Antonina. É um colégio muito família, até hoje minhas filhas têm contato com os amigos que estudaram com elas. Todo mundo está super chateado com a notícia”, contou.
No comunicado, a direção do Sacramento afirmou que o pequeno número de alunos, os gastos com folhas de pagamentos, o alto custo de manutenção do prédio, a necessidade de acompanhar os avanços tecnológicos e outros, estão impossibilitando a continuidade de oferecerem os serviços educacionais com qualidade.
“Há alguns anos estamos buscando mudar o cenário, que piorou com a pandemia, mas sem muito sucesso. Tudo procuramos fazer para não chegarmos onde estamos. Depois de um tempo de discernimento, não é sem tristeza, que lhes comunicamos o encerramento das atividades escolares do nosso Colégio Santíssimo Sacramento em 2022, não oferecendo a opção de matrícula para o ano de 2023. Informamos ainda aos nossos alunos e seus responsáveis legais que estaremos concluindo, com a mesma competência e zelo, o ano letivo de 2022, não havendo assim qualquer prejuízo para o currículo escolar dos mesmos”, diz trecho da nota.
“Colégio elevou qualidade do ensino em Alagoas”
O jornalista e pesquisador Edberto Ticianeli contou que as irmãs de caridade da Congregação do Santíssimo Sacramento chegaram a Maceió, nos primeiros dias de 1904, a convite do então governador Paulo Vieira Malta, para assumir a administração do Asilo das Órfãs Bom Conselho, em Bebedouro, que ocorreu no dia 16 de janeiro daquele ano.
“Como em Maceió havia crescente demanda por escolas que atendesse as estudantes das famílias mais abastadas, que valorizavam a educação francesa, algo somente possível de se ter com o envio das jovens para Recife ou Salvador, a presença das Irmãs Sacramentinas estimulou a instalação em Maceió de um colégio com essas características”, explicou.
Segundo Ticianeli, é provável que essa iniciativa tenha recebido a interferência dos irmãos Wandesmet. “Félix e Gustavo eram franceses e proprietários da Usina Brasileiro, em Atalaia. Félix, que era então vice-cônsul da França em Alagoas, tinha muita aproximação com a Igreja Católica. Além disso, foram eles que patrocinaram a construção da sede do Colégio Sacramento no Alto do Jacutinga, hoje bairro do Farol”, disse.
O Colégio funcionou, a partir de sua instalação em 12 de abril de 1904, no prédio da viúva do Dr. Pedro Loureiro, ao lado da Catedral, na Praça D. Pedro II. Ali permaneceu até 29 de outubro de 1905, quando foram inauguradas as novas instalações na Rua Ângelo Neto.
As aulas na casa ao lado da Catedral continuaram até o fim do ano de 1905. Neste mesmo ano, teve início a construção da sua sede própria, inaugurado com a celebração de missa pelo bispo Dom Antônio Brandão.
De acordo com Ticianeli, houve um ganho superlativo na qualidade do ensino em Alagoas com a instalação do Colégio Sacramento. “O mais importante é que, além de atender a uma clientela oriunda da elite econômica, passou também a receber jovens de outros segmentos sociais, que ali se matricularam beneficiados por bolsas, ampliando assim o número de estudantes que usufruíram daquela instituição”, explicou.
O jornalista e pesquisador afirmou ainda que há, evidentemente, prejuízos no aspecto educacional, mas como existe uma ampla oferta de vagas no mercado, não vê isso como a principal perda.
Além do Colégio Sacramento, que não funcionará mais a partir do próximo ano, outras escolas tradicionais fecharam suas portas nos últimos anos, em Maceió, como os colégios Batista Alagoano, que encerrou suas atividades em 2011, após declarar falência, e Santa Terezinha, ambos localizados no Farol.
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