Cidades

Enem: estudantes se preparam via meios remotos

Com aulas presenciais suspensas, eles enfrentam desafios do estudo on-line e avaliam que este ano exame será desigual

Por Lucas França com Tribuna Independente 16/05/2020 09h05
Enem: estudantes se preparam via meios remotos
Reprodução - Foto: Assessoria

Mesmo com as aulas presenciais suspensas em todo o País por conta da pandemia do novo coronavírus - Covid-19, estudantes que irão fazer o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), este ano, buscam as ferramentas que têm à disposição e se preparam para as provas. Em Alagoas, cursinhos preparatórios seguem com a rotina de aulas por meios remotos, assim como algumas escolas que também estão auxiliando os alunos.

A estudante do 3º do ensino médio, Ana Luiza Soares Castro Gaia, 16 anos, disse que está estudando bastante. Mas confessa que sempre teve dificuldade de aprender com aulas on-line. “Em toda minha trajetória no colégio, sempre tive muita dificuldade em estudar por videoaula. E não tá sendo diferente das aulas on-line. Os meus professores estão me ajudando demais! Estou sempre em contato com eles, principalmente agora, que meu colégio deu férias. Sempre tiro dúvida, eles me mandam o que mais cai no Enem pra estudar, dicas, questões. Acho isso extremamente importante ter a ajuda deles nesse momento’’.

Além do contato direto com os professores, a estudante também faz cursinho preparatório. “Estou fazendo isolada. Tenho certeza que foi a melhor decisão que eu tomei este ano. Eu faço isolada de matemática, química e redação. E os meus três professores estão se virando de onde dá pra sempre ter aula, simulados on-line, tirar dúvidas nos grupos’’, conta Ana Luiza que faz o Enem desde quando estava 9º ano.

Quem também prestará o exame é a estudante do 3º do ensino médio, Ketley Melo Pereira, 17 anos, da Escola Estadual Deputado José Medeiros, em Paulo Jacinto. Apesar de seguir a rotina de estudos de forma on-line com auxílio de professores, ela acredita que muitos colegas serão prejudicados. “Mesmo seguindo a rotina de aulas on-line, acredito que muitos alunos irão se prejudicar porque não são todos que têm acesso a internet, a exemplo dos alunos da zona rural. Isso vai complicar para eles na hora do exame’’, ressalta.

Já para José Maxdowell dos Santos Silva, 18 anos, que concluiu o ensino médio em 2019, e se prepara para o Enem, a rotina de estudos continua por meios remotos, e para ele não há dificuldade. Ele lamenta que nem todos os estudantes têm acesso a internet. “Não tenho dificuldades, pois facilita pesquisar e otimiza o tempo o qual pode ser estendido com as pausas e dá pra manter o foco se ocorrer disciplina e dedicação, porém sem exaltar a meritocracia. 2020 trouxe muitas surpresas, pois ninguém esperava mudar a rotina totalmente. Alguns estudantes estão conseguindo manter a rotina de estudos por meio de uma organização de horário e acesso as plataformas digitais, mas em contrapartida uma parcela da população não tem acesso à web, a qual, segundo o Marco Civil da Internet, todos os cidadãos têm direito. Isso me preocupa pois dificulta ascensão dos menos privilegiados e elitiza o ensino superior’’, lamenta.

[caption id="attachment_375560" align="aligncenter" width="225"] Maxdowell, 18 anos, lamenta que nem todos os estudantes tem acesso a internet (Foto: Cortesia)[/caption]

O professor de redação Thalles Barros explica que os alunos não estão tendo Educação à Distância (EAD) e sim aulas remotas. “São aulas feitas por meio remotos, mas com os mesmos moldes das aulas presenciais. Seguimos nessa maratona desde do dia 17 de março, migramos do físico para o ambiente virtual, mas seguimos com o mesmo perfil da presencial - no mesmo dia da semana, no mesmo tempo de aula para que o aluno consiga se habituar a nova realidade. Ou seja, não é EAD. Os nossos alunos estão recebendo o acompanhamento individualizado e todo o suporte pedagógico necessário para a que consiga continuar a preparação para o Enem já que o Governo Federal não assegurou ainda o adiamento dessa prova. É possível que haja, porém não é certeza”.

ENEM DESIGUAL

Thalles também lembra que nem todo os alunos conseguem ter o suporte tecnológico necessário para ter a preparação. “O Enem este ano, acredito, será mais desigual que nos anos anteriores. É importante se pensar nisso. Segundo dados do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas], um pouquinho mais que 30% dos estudantes no Brasil não têm acesso a internet. Então, esses que têm acesso a tecnologia, suporte de professores, de cursinhos, estão bem a frente daqueles que moram em regiões periféricas, no interior do país. Inclusive estou em um projeto nacional dando aula para alunos do Sul e Sudeste de maneira remota a jovens que não têm suportes nenhum da escola e já estão há dois meses sem aula. São alunos da rede pública, por isso será desigual”, ressalta.

As inscrições do Enem 2020 começou no último  dia 11 e se encerra no dia 22. “Alunos brasileiros ainda não têm hábito de estudar no ambiente virtual’’

De acordo com Thalles Barros, um ponto relevante para ser analisado é que embora os alunos estejam bem ambientados com a internet, rede social e a vida conectada, ainda existem dificuldades para fazer com que o ambiente seja um espaço favorável ao ensino. “O aluno brasileiro de forma geral ainda não tem o hábito de estudar no ambiente virtual. Nosso grande desafio é fazer com que esses alunos consigam utilizar os meios pedagógicos na internet do mesmo jeito que é utilizado no ambiente físico. É uma modalidade que mundo a fora já é utilizada e chamamos de escola 4.0 - que é essa escola conectada, que oferece aulas remotas já com monitoria e uma série de aspectos, mas os alunos daqui precisam passar por esse processo’’, ressalta Barros.

[caption id="attachment_375561" align="alignnone" width="300"] Thalles Barros, "alunos brasileiros ainda não estão habituados com ensino remoto'' (Foto: Cortesia)[/caption]

O professor diz que no momento o grande empecilho não é tanto a adaptação do ambiente virtual e sim o suporte da família. “Com o isolamento social, a sala de aula dos nossos alunos são suas residências. Então, a maioria não tem um ambiente favorável em casa, suporte dos pais para criar um ambiente silencioso, a propagação do conhecimento. Acho que muito mais que a adaptação da realidade do ensino on-line é esse aluno ter um ambiente favorável a isso - e depende da família’’.

O psicólogo Carlos Gonçalves, explica que chegada do coronavírus mexeu, não só com a vida dos alunos que vão se submeter ao Enem, mas com toda população de administrar a ansiedade, seguida de medo, e acima de tudo de dúvidas. “Além da rotina diária de estudos, muitos não conseguem se identificar tendo que se debruçar remotamente diante de um computador, a falta de aulas presenciais, pode ser uma barreira para alunos que irão prestar o exame. Por isso, não adianta muito ir de encontro a realidade, é um momento atípico e que requer do candidato um pouco de maturidade e busca de equilíbrio emocional’’.

O especialista ressalta que ter momentos de conversa é muito importante, porque ajudam a diminuir o estresse e a ansiedade, além de sempre manter uma boa alimentação. “Compartilhar com a família os medos e conflitos. Nesses momentos de troca é onde o estudante ouve a família e a família ouve o estudante. Para a rotina de lazer, recomenda que os estudantes vejam um filme, façam exercício físico, procurem fazer chamada de vídeos com amigos para se divertir um pouco’’.

Gonçalves diz que controlar o acesso às redes sociais também pode ajudar na hora do cronograma de aula. “Outro fator que pode prejudicar ou dificultar um pouco os estudos nessa quarentena é o fato de que a família está em casa. Então a presença dos pais e irmãos também pode atrapalhar o ambiente de estudo. O momento de instabilidade gera estresse e é normal sentir emoções como medo e a ansiedade. Se isso acontecer, dê vazão a esses sentimentos e sensações. Pode chorar, escrever (ou anotar em um papel o que está sentindo). Caso essas emoções estejam muito intensas, a ponto de impedir que realize suas atividades, ou caso se sinta sozinho, procure um profissional de saúde’’, orienta.