Cidades

Gerações de jornalistas alagoanos se unem contra o retrocesso da redução salarial

Jornalista com 45 anos de carreira lembra de greve por aumento salarial em 1979, mas não imaginava que um dia lutaria contra uma proposta de redução do piso salarial da categoria

Por Thayanne Magalhães 28/06/2019 14h53
Gerações de jornalistas alagoanos se unem contra o retrocesso da redução salarial
Reprodução - Foto: Assessoria
Há quatro dias os jornalistas alagoanos decidiram entrar em greve depois de se negarem a aceitar a proposta de redução de 40% do piso salarial da categoria, proposta feita a princípio pela TV Gazeta (afiliada da Globo) e em seguida pelas TVs Pajuçara (Record) e Ponta Verde (SBT). Depois de várias tentativas de conciliação em audiências no Tribunal Regional do Trabalho (TRT), os empresários se mostraram determinados a diminuir os salários dos jornalistas e a categoria decidiu pela greve. O Sindicato dos Jornalistas de Alagoas (Sindjornal) estima que 90% dos jornalistas de Alagoas aderiram à greve. Na Pajuçara, os principais apresentadores como Gernand Lopes e Oscar de Melo pararam de apresentar os programas Fique Alerta e Cidade Alerta, obrigando a emissora a transmitir os jornais nacionais. Na Gazeta de Alagoas a apresentadora Sofia Sepreny, que aceitou substituir Thaíse Cavalcante no AL1, teve vídeos com erros de português e confusão na história da morte do cantor Gabriel Diniz viralizados em todo o país. Ela afirma que o cantor morreu com a “queda” de um caminhão e os “detroços” estavam passando por “periça”. Na TV Ponta Verde, com exceção de Estela Cavalcante, que estava apresentando o Programa Tudo de Bom, todos os apresentadores continuam trabalhando normalmente, apesar da escassez de matérias por conta da adesão dos principais repórteres e câmeras da emissora à greve. Os jornalistas acusam a empresa de estar contratando profissionais de outros estados para substituir os grevistas, o que seria irregular. O Sindjornal informou que o jurídico da entidade já analisa as denúncias. A velha guarda [caption id="attachment_310017" align="aligncenter" width="600"] Arnaldo Ferreira, Valdice Gomes e Paulo Omena (Foto: Edilson Omena)[/caption] Diretor de Jornalismo da Organização Arnon de Melo, Arnaldo Ferreira chegou ao mercado do jornalismo alagoano em 1982. Ele conta que desde sexta-feira (21) não foi mais cumprir sua função e se juntou à greve. “Minha filha é jornalista e foi minha aluna na universidade. Ela trabalha em uma assessoria de imprensa e aderiu à greve. Está sem trabalhar. A mãe dos meus filhos, minha amiga e conselheira, é jornalista e aderiu à greve. A minha companheira é jornalista e aderiu à greve. Eu não posso trair a minha família. Eu não acredito em um homem que trai a família”, relatou. “Além desse argumento que acho muito forte, estão aqui nessas manifestações meus ex-alunos de graduação, ex-alunos de pós-graduação, porque eu também sou professor em faculdade e na Universidade Federal de Alagoas [Ufal]. Então eu tenho um compromisso histórico com a formação desses jornalistas, um compromisso que é muito maior do que o meu compromisso com a empresa”, continuou. Arnaldo Ferreira comentou que entende pelo que as empresas vêm passando desde o ano de 2014, mas que a folha já foi muito enxugada em veículos de comunicação de todo o país e redução salarial não se discute. “Compreendo que as empresas vivem um momento terrível na economia, com queda nos faturamentos, mas reduzir salário não é proposta. Não se discute. A gente sabe que muitas sucursais foram fechadas em todo o país e houve demissão em massa”, afirmou. Para o jornalista as empresas devem procurar mercado e para isso precisam dos jornalistas. “Por esses motivos todos eu defendo que as empresas devem procurar os jornalistas para sentar e buscar uma solução que compatibilize com os interesses dos dois lados. Uma semana parada não está bom para ninguém. Os jornalistas estão cansados e as empresas estão perdendo faturamento”, opinou. Greve sem líder Arnaldo Ferreira comentou que o diferencial da greve dos jornalistas alagoanos é que as manifestações partiram de toda a categoria. “Não houve um líder convocando a greve. A categoria toda se mobilizou e se uniu para lutar contra a redução salarial. É a greve de uma categoria inteira. Não há um líder”, concluiu. [caption id="attachment_310020" align="aligncenter" width="600"] Gal Monteiro (Foto: Edilson Omena)[/caption] Gal Monteiro se formou pela Ufal em 1995. Ela é jornalista e trabalha no Instituto Zumbi dos Palmares (IZP). “Esse movimento dos jornalistas reúne várias gerações da nossa categoria. Antes de se alcançar qualquer sucesso, já é um movimento vitorioso, porque ele constitui a retomada da luta que os jornalistas alagoanos sempre travaram em Alagoas. Somos uma categoria de referência nacional”, opinou. Para Gal Monteiro, a proposta das empresas para redução do piso salarial é de total desrespeito com os profissionais. “É uma forma que os empresários encontraram para desmotivar os jornalistas. Um desrespeito não só com essa categoria, mas com todos os trabalhadores. Ninguém pode trabalhar com redução salarial. A gente tem que trabalhar com reposição de todas as perdas que nós já tivemos ao longo da história”, disse a jornalista. Em 1979, Paulo Omena, que atua há 45 anos no jornalismo alagoano, estava em greve pelo reajuste do salário da categoria. Ele se diz indignado por hoje ter que lutar para que as empresas não reduzam os salários. “É uma proposta ridícula. Vergonhosa. Essa greve está tão bonita quanto a de 79, sem balbúrdia, todos tranquilos e respeitando o movimento, mas eu nunca pensei que um dia tivesse que lutar contra a redução do piso salarial dos jornalistas”, afirmou. “As empresas querem reduzir em 40% o piso salarial dos jornalistas. Isso é um absurdo. Sempre lutamos por aumento. Hoje temos uma vida estabilizada de acordo com o salário que recebemos e como vamos fazer para sustentar nossos filhos com uma redução dessas? Não vamos arredar o pé. Vamos lutar até o fim”, continuou Paulo Omena. O dissídio entre os representantes das empresas e os jornalistas grevistas está marcado para a próxima quarta-feira (3) no Tribunal Regional do Trabalho em Alagoas (TRT/AL). Até lá, a greve deve continuar. Programação [caption id="attachment_310018" align="aligncenter" width="600"] Jornalistas alagoanos entram no quarto dia de greve contra a redução salarial (Foto: Edilson Omena)[/caption] No sábado (29) os jornalistas, em parceria com a Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito (SMTT), vão bloquear o trânsito na rua em frente à Gazeta de Alagoas, na portaria do antigo Colégio Batista, e promover um dia de diversão para toda a família. As crianças poderão desfrutar de piscina de bolinhas, pula-pula e tobogã. A categoria deve promover um piquenique em um dia inteiro de convivência, das 7h às 19h. No domingo a categoria deve se reunir na orla de Maceió dando continuidade à mobilização.