Escritos
Bom Parto: mais de três mil pessoas ainda precisam ser realocadas
Líder comunitário Fernando Lima expõe a angústia dos que não foram realocados
O líder comunitário do bairro do Bom Parto, Fernando Lima, avalia que a situação do local segue sem solução adequada, pois mais de três mil pessoas necessitam de realocação.
“Faço parte do Núcleo de Defesa Civil Comunitária, além de ser representante dos moradores, e, antes mesmo do tremor, já havíamos feito um levantamento de moradores que residem mais próximos à lagoa que precisavam ser realocados. Então foi detectado que as falhas em cima da placa tectônica tinham relação com escavações para extração de mineral e isso mostrou que a encosta do Mutange estava descendo e puxando os bairros 'a reboque'. Daí começou a nossa luta que segue até hoje sem uma solução adequada para muitos’’, relata Fernando Lima.
O líder comunitário, que também foi atingido pelas fissuras e rachaduras, lembra que, no início, eram apenas 76 casas detectadas com anomalias: “Mas isso era um fato que, para mim, era inaceitável, porque era bem mais que esse número. Era uma questão abrangente’’.
O ACORDO
“Esse foi um acordo que a população não teve voz, foi colocado de garganta abaixo na vida dos moradores dos bairros afetados. Ou seja, tínhamos que aceitar sem falar nada. A gente não pode entrar nem com um processo que não vinga. Temos que voltar para o acordo. Daí as famílias começaram a sair de suas moradias. Foram duas mil e, em seguida, mais três mil. E, hoje, aguardamos a nova atualização do mapa’’, destaca.
“Essas outras três mil pessoas precisam ser realocadas com urgência, mas os órgãos responsáveis afirmam que não foi detectado algo para que sejam realocados. Não pedimos porque achamos, mas sim porque há fatos que mostram essa necessidade. É vergonhoso que se protelem tanto a condição de subvida nessas ruas. Estamos pedindo o óbvio. A subsidência aqui é a olhos vistos’’, conclui Lima.
RUAS QUE NÃO SECAM MAIS
"A subsidência já afeta uma rua inteira e muitas casas estão com rachaduras, algo que piorou com as últimas chuvas. No entanto, a Justiça não faz nada porque estamos à mercê deste famigerado acordo, mesmo com essas residências na situação que estão. Como pode parte de um bairro sair por conta de fissuras nas paredes e pisos das residências e outras ruas com o mesmo problema não? Estamos esperando que alguém morra para isso acontecer?", questiona Lima.
RECOMEÇO
Fernando Lima diz que, para quem foi realocado, existe a chance de um recomeço, mesmo de uma forma injusta. Mas, para quem ficou, a luta é constante. “Foi justa a forma que tiveram que sair de suas casas? Digo que não. Mas, pelo menos, há uma chance de um recomeço. O fardo de verdade está para quem ficou, pois há um caos. A metade da rua saiu na direita, mas a esquerda ficou. A gente passa por uma pandemia, por uma enchente. Pessoas morrendo espiritualmente, fisicamente e nada de solução’’, desabafa.
PROCESSO
O líder comunitário fala que, por não acreditar na justiça do Brasil, os moradores representados por um movimento que agrega todos os bairros atingidos tiveram que atravessar o oceano para buscar justiça em outro país. No caso, na Holanda.
“A gente buscou ajuda fora por não acreditar na justiça brasileira. Fomos a Roterdã porque a Braskem tem sede por lá. Antes disso, buscamos conhecer os processos de Brumadinho e Mariana, que foram levados a essa instância, então, entramos com processo no mesmo escritório e será julgado pela mesma corte. Inicialmente todos diziam que era loucura. Ninguém acreditava que daria certo e hoje se tornou a porta principal para termos uma sensação de justiça’’, expõe.
Em relação à fala do líder comunitário, a atualização foi que o tribunal holandês aceitou o pedido dos moradores afetados pela Braskem em Maceió no dia 21 de setembro.
“Acreditamos que temos o empenho para sairmos vitoriosos. Aí, todos os moradores poderão entrar com processos sem precisar passar pelo mesmo julgamento. Eles abrirão precedentes’’, finaliza Lima.