Turismo
Valorização das paisagens alimentares impulsiona turismo sustentável no Nordeste
Comunidades tradicionais de Alagoas, Pernambuco e Sergipe participaram, na última quarta-feira (29), em Maceió, do encontro final e do workshop de governança turística sustentável do projeto Paisagens Alimentares, coordenado pela Embrapa Alimentos e Territórios e financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Com foco no desenvolvimento do turismo de base comunitária, o projeto foi realizado entre 2022 e 2025, buscando a valorização ambiental e social dos territórios selecionados.
“As paisagens alimentares são espaços geográficos singulares que integram elementos que permitem contar a história do território do ponto de vista das conexões de pessoas a práticas e saberes tradicionais, a símbolos e significados e aos patrimônios cultural, agrícola, alimentar e ambiental”, de acordo com Aluísio Goulart, analista da Embrapa. O conceito foi construído ao longo do projeto de forma colaborativa pelos coordenadores e representantes das comunidades e instituições participantes.
“Esses espaços refletem a construção dos sistemas agroalimentares locais a partir da evolução da dinâmica territorial e social de guardiões da sociobiodiversidade. As paisagens alimentares evidenciam as funções paisagísticas, ambientais e sociais da agricultura, que podem ser compreendidas em vivências compartilhadas por meio do turismo sustentável de base comunitária”, complementa Goulart, coordenador do projeto de inovação social.
A secretária-executiva da Secretaria Estadual de Turismo (Setur), Marília Herrmann, reforçou a mudança no perfil do turista após a pandemia, mais interessado em conhecer o modo de vida das pessoas visitadas. Ela destacou as ações do governo de Alagoas para apoiar as comunidades, incentivando o turismo gastronômico e sustentável de base comunitária. “Estamos fazendo um trabalho conjunto com as secretarias de Desenvolvimento e da Agricultura para inserir os produtos rurais e agrícolas nos hotéis e restaurantes e fomentar esse turismo de experiência”, afirmou.
Para Manuela Lourenço, superintendente de Políticas para a Igualdade Racial, da Secretaria Estadual da Mulher e dos Direitos Humanos (Semudh), é importante refletir sobre os desafios na valorização dos territórios. Um deles é a tradicional monocultura presente na região, como a da cana-de-açúcar, num contraste com a diversidade da produção agrícola apresentada pelas comunidades durante o evento. Ela ressaltou a necessidade de se ampliar as parcerias com o governo, a Embrapa e os povos tradicionais, para fortalecer esse processo de valorização dos saberes tradicionais.
João Flávio Veloso Silva, chefe-geral da Embrapa Alimentos e Territórios, falou das ações conduzidas pela Embrapa, especialmente no Nordeste, para valorizar a cultura alimentar, numa abordagem extremamente nova na história dos 50 anos da Empresa. “Vocês estão nos ajudando a construir conceitos e referências que serão fundamentais para a atuação da Embrapa do futuro”, enfatizou. Veloso ainda salientou a importância da manutenção da Rede Territórios de Saberes e Sabores, criada pelas comunidades nordestinas em 2024.
Riquezas alimentares e culturais
Representantes dos territórios integrantes do projeto expuseram suas histórias e produtos. Anatalia Neta, Joaninha dos Santos e Vanessa dos Santos representaram os Povoados de Pontal, Preguiça e Terra Caída, em Indiaroba (SE). Vanessa falou com orgulho do ofício das catadoras de mangaba, Patrimônio Cultural Imaterial de Sergipe, e das práticas ancestrais das marisqueiras, além das riquezas alimentares e culturais da região. Também abordou a variedade de produtos e receitas à base de mangaba e de aratu, alimentos típicos locais.
O território de São Cristóvão (SE) foi representado por Maria Reis, Simone de Souza, Vânia Fontes e Vera Maria Gomes. Vânia destacou a mandioca, o coco e o açúcar como os principais ingredientes da cultura alimentar. Os biscoitos bricelets e as queijadas lá produzidos também são patrimônios imateriais sergipanos, reconhecidos pelo modo de fazer transmitido por gerações. As comunidades ainda se dedicam ao artesanato, com o reaproveitamento de materiais, contribuindo para a preservação do meio ambiente.
As ações desenvolvidas no Assentamento Nova Esperança, em Olho d’Água do Casado (AL), foram ressaltadas por Ana Paula Ferreira. Entre elas, houve diversas oficinas de capacitação, como a de economia criativa, oferecida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que incentivou a produção de artesanato com motivos rupestres. Os trabalhos de educação ambiental e a criação de mapas temáticos relativos à biodiversidade da caatinga também foram apontados como exemplos de reconhecimento e valorização das práticas tradicionais.
Salete Barbosa, da Cooperativa Mista de Produção e Comercialização Camponesa
(Coopcam), em Palmeira dos Índios (AL), lembrou que as conversas com a Embrapa começaram em 2018. Com consultorias do Sebrae e apoio de outras Unidades, como a Embrapa Semiárido, os cooperados estão aperfeiçoando os processos de produção, especialmente dos derivados de jabuticaba, e diversificando seus produtos. As capacitações os levaram a “descobrir muitas outras coisas no território”, segundo ela. Com isso, os agricultores já estão pensando em inovar os roteiros turísticos, beneficiar novos produtos e expandir os trabalhos com sementes crioulas.
A Associação das Marisqueiras de Sirinhaém (Amas), representada por Cícero Silva, Eliane Silva e Viviane Wanderley, localiza-se na Área de Proteção Ambiental Guadalupe, em Sirinhaém (PE). As marisqueiras são guardiãs dos saberes e fazeres tradicionais da pesca artesanal. Lá os turistas têm a oportunidade de vivenciar as experiências de adentrar o manguezal para coleta de crustáceos, especialmente o aratu, além de provar as delícias culinárias preparadas por essas mulheres, como os típicos caldinhos de aratu e sururu.
Também localizada na APA Guadalupe, a Associação da Comunidade Quilombola do Engenho Siqueira (Acqes), reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial de Rio Formoso (PE), agora consegue ter mais acesso a políticas públicas para alimentação. A Acqes, representada por Amara Magaly da Silva, Cláudio Pageú e Rodney da Silva, está oferecendo alimentos agroecológicos para a merenda escolar, por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). Além disso, está conseguindo participar de editais de projetos voltados para o turismo de base comunitária. “Essa parceria foi além do projeto; ela trouxe outros complementos que fortalecem ainda mais a nossa comunidade”, disse Pageú.
Sabores, Saberes e Governança Turística
A programação contou ainda com a palestra Conexões entre Sabores, Saberes e os Territórios, proferida por Isabela Barbosa, professora da Uninassau. Turismo em Paisagens Alimentares foi o tema da apresentação de Richard Alves, da empresa Lab Turismo, que atuou no projeto. Governança e a Rede Territórios dos Saberes e Sabores foram abordados pelo professor Carlos Costa, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), instituição parceira do projeto, e por Lydayanne Nobre, bolsista da Fundação de Apoio à Pesquisa e ao Desenvolvimento (Faped).
Durante o workshop, Aluísio Goulart também expôs os pilares de um modelo de Governança Sustentável em Paisagens Alimentares. A superintendente de Infraestrutura Logística para o Turismo da Setur de Alagoas, Sandra Villanova, apresentou as ações de Governança Turística em Alagoas. Os princípios para a construção de um Plano de Conservação Dinâmica das Paisagens Alimentares foram abordados pelo pesquisador da Embrapa João Roberto Correia. E os desafios para a Governança Turística foram tema da palestra do pesquisador Renato Manzini, atualmente na Embrapa Agroindústria Tropical, que desenvolveu uma abordagem metodológica sobre o assunto.
Na visão de Ricardo Elesbão, chefe de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação da Embrapa Alimentos e Territórios, os resultados obtidos são fruto de uma construção coletiva, principalmente com a agregação das comunidades e das empresas e instituições parceiras. Ele reforçou a importância da continuidade dessas ações, lembrando que o desenvolvimento territorial também depende de políticas públicas e de uma atuação conjunta dos estados, municípios e das comunidades envolvidas.
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