Saúde

Cremes dentais não resolvem sozinhos erosão dental e hipersensibilidade

Cremes dentais voltados para esses problemas ganharam o mercado

Por Texto: Maria Fernanda Ziegler com Fapesp e Jornal do Brasil 12/02/2018 17h48
Cremes dentais não resolvem sozinhos erosão dental e hipersensibilidade
Reprodução - Foto: Assessoria
Por conta do aumento da prevalência de problemas como erosão dental e hipersensibilidade dentinária, cremes dentais voltados para esses problemas ganharam o mercado. Se há 20 anos eles nem existiam, hoje há uma grande variedade de marcas, com diferentes atributos. No entanto, em estudo feito na Universidade de Berna, na Suíça – do qual participou uma bolsista da FAPESP –, nenhuma das nove pastas analisadas se mostrou capaz de diminuir um problema elementar à erosão e à hipersensibilidade dentinária: a perda de estrutura do esmalte. De acordo com artigo publicado na Scientific Reports, todas as pastas testadas causaram, inclusive, diferentes graus de perda de superfície do dente. Nenhuma delas foi capaz de proteger o esmalte da erosão e da abrasão dental. Os autores do estudo ressaltam que esses tipos de pasta têm a sua função. Porém, devem ser usadas como um complemento e não como o tratamento em si. Este deve ser orientado por um cirurgião-dentista, que pode diagnosticar e analisar a melhor estratégia para cada paciente. “Não é a pasta de dente que vai conseguir resolver o problema totalmente. A erosão dental é multifatorial, tem relação com a escovação e, principalmente, com a alimentação, que está se tornando cada vez mais ácida em virtude, por exemplo, dos alimentos industrializados”, disse Samira Helena João-Souza, doutoranda na Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo e primeira autora do artigo. João-Souza afirma que é preciso haver a associação de, pelo menos, três fatores: o tratamento acompanhado por um dentista, o uso de pastas indicadas e a mudança no estilo de vida do paciente, principalmente nos hábitos alimentares. A erosão dental é a perda de tecidos duros dentários causados por ácidos não bacterianos. Quando associada a ações mecânicas, como a da escovação, resulta no desgaste erosivo. “Estudamos as chamadas lesões cervicais não cariosas, quando ocorre a perda de estrutura dental não relacionada a bactérias (como é o caso da cárie). Nas clínicas, vemos pacientes com esse problema na região cervical do dente, entre a gengiva e o dente. O esmalte nessa área é mais fino e mais suscetível ao problema”, disse a professora Ana Cecília Corrêa Aranha, orientadora de João-Souza e também autora do artigo. Nessas situações, é comum o paciente sentir incômodo ao beber ou comer algo gelado, quente ou doce. “Ele ou ela chegam ao consultório achando que é cárie, mas se trata de uma exposição da dentina causada por escovação errada, com uma pasta de dente muito abrasiva, por exemplo, combinada a um alto e frequente consumo de bebida e alimentos ácidos”, disse Aranha. Existe uma forte relação entre a erosão dental e a hipersensibilidade dentinária. A primeira pode ser um dos fatores que provocam e mantêm a segunda. “Estudos mostram que, para haver hipersensibilidade, é preciso que o paciente tenha a dentina exposta (túbulos abertos). E um dos fatores para a exposição da dentina é a erosão. Foi por isso que no nosso estudo analisamos pastas de dente que apresentam esses dois atributos (antierosivo e dessensibilizante) como diferencial”, disse João-Souza. No total, foram testadas oito pastas dessensibilizantes e/ou antierosivas e uma pasta controle, todas encontradas em farmácias do Brasil ou da Europa. O estudo também analisou como a interação dos fatores químicos e físicos influencia o desgaste erosivo dos dentes. Para tanto, foi feita uma simulação do efeito de uma escovação (uma vez ao dia) e da exposição de uma solução ácida no esmalte do dente durante ciclos de cinco dias consecutivos. O estudo usou dentes pré-molares humanos doados para testes científicos, saliva artificial e a escovação com as pastas analisadas. “Utilizamos o teste de microdureza, para calcular a perda da estrutura do esmalte decorrente da escovação com as pastas testadas. Na análise química, foram medidos o pH e a concentração de cálcio, fosfato e flúor em cada uma das pastas”, disse João-Souza. Na análise física, os pesquisadores pesaram e mediram o tamanho das partículas abrasivas contidas nas pastas. Também foi feito teste de “wetability”, ou quanto o preparado de pasta de dente misturado com saliva artificial consegue se espalhar na superfície do dente. “Durante as escovações com as misturas das pastas com a saliva artificial notamos que as propriedades das pastas eram diferentes. Por isso, decidimos ampliar as análises, avaliando os fatores químicos e físicos das pastas e deixar o trabalho mais completo”, disse João-Souza. Estatisticamente sem vencedores De acordo com o estudo, o uso de todas as pastas analisadas apresentou perda de superfície progressiva do dente após os cinco ciclos de escovação. “Não há uma melhor e a indicação vai depender de cada caso. O teste mostrou que algumas tiveram menos perda de superfície do que outras, mas também não foi muito diferente da pasta controle. Estatisticamente, elas não diferiram, embora numericamente exista diferença”, disse Aranha. “Agora, estamos fazendo outros trabalhos com dentina para pensar em possibilidades, pois o resultado mostrou algo preocupante: nenhuma das pastas foi capaz de prevenir erosão dental ou hipersensibilidade dentinária”, disse Aranha. O grupo pretende iniciar um outro estudo, mais específico e in vivo, o que possibilitará também fazer a avaliação de dor. O artigo Chemical and physical factors of desensitizing and/or anti-erosive toothpastes associated with lower erosive tooth wear(doi: 10.1038/s41598-017-18154-8), de Samira Helena João-Souza, Adrian Lussi, Tommy Baumann, Taís Scaramucci, Ana Cecília Corrêa Aranha e Thiago Saads Carvalho, pode ser lido na Scientific Reports em www.nature.com/articles/s41598-017-18154-8.