Saúde

Quase 90% da população alagoana não tem plano de saúde e depende do SUS

Dos R$ 42 milhões por mês disponíveis para Alagoas, R$ 12 milhões vêm do MS

Por Tribuna Independente 07/01/2017 16h52
Quase 90% da população alagoana não tem plano de saúde e depende do SUS
Reprodução - Foto: Assessoria

O Estado de Alagoas possui 3.358.963 milhões de habitantes segundo os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). Deste total, 88% dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS), de acordo com levantamento da Secretaria Estadual de Saúde (Sesau).

Mas a Sesau acredita que a quantidade de pessoas que dependem do SUS tenha aumentado nos últimos meses ultrapassando os 90% devido a atual situação econômica do país.

No ranking nacional, Alagoas ocupa a sétima posição com maior número de pessoas que dependem do SUS. O estado do Acre fica na primeira colocação com 94,19%, seguido de Roraima (92,62%), Maranhão (90,83%), Tocantins (90,55%), Bahia (89,47%) e Piauí (88,67%).

O estado que apresenta o menor percentual de pessoas que dependem do SUS é São Paulo com 43,1%. Rio de Janeiro com 49%, Paraná (65%), Minas Gerais (66,64%), Distrito Federal (70,05%), Rio Grande do Sul (70,44%) e Santa Catarina (72%) também estão na base do ranking.

Para se chegar aos dados foi levado em consideração o número de habitantes de cada estado e a quantidade de pessoas com vínculos em planos de saúde.

Entre os estados da região Nordeste, o Maranhão ocupa o primeiro lugar no número de usuários. Dos 6.904.241 habitantes, 6.270.941 dependem do SUS, uma porcentagem de 90,83%. Em seguida vem Bahia, Piauí (88,67%) e Alagoas.

Até novembro de 2016, apenas 403.482 pessoas possuíam vínculo com planos de saúde segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). O número de beneficiários é uma estimativa variante, segundo a ANS a cada mês tem gente entrando e saindo de planos. A mudança na quantidade de usuários ocorre com a movimentação do mercado de trabalho.

Para garantir o atendimento à população, o Governo do Estado recebe por mês do Ministério da Saúde (MS) em torno de R$ 12 milhões. E do Tesouro Estadual, que depende da arrecadação, baseada no cálculo de 12% dos recursos do Tesouro, como diz a constituição, o estado recebe em média R$ 30 milhões por mês. Ao todo, o valor para garantir à assistência a saúde em Alagoas chega a pouco mais de R$ 42 milhões.

De acordo com a Sesau, esses recursos são utilizados para manter as unidades, serviços e programas funcionando e para realizar os investimentos necessários visando cumprir as atribuições que competem ao Estado, uma vez que o SUS é tripartite e cada ente possui as suas atribuições (Governo Federal, Estadual e Municipal). Por exemplo, a atenção básica é atribuição dos municípios.

A secretária de Saúde do Estado, Rosângela Wyszomirska, disse que esse valor é pouco para garantir uma saúde de qualidade à população, mas que o estado vem trabalhando para fazer o atendimento ao cidadão.

“O SUS é subfinanciado há muito tempo. Inclusive o orçamento federal da saúde é irreal, ou seja é abaixo da necessidade. O subfinanciamento federal da saúde leva a um déficit que gira em torno de R$ 40 milhões por mês, para Alagoas. O estado usa os 12% obrigatórios pela constituição para cobrir o déficit do financiamento da saúde. E com isso, ficamos sempre atrás, com financiamento prejudicado. Para garantir que a população não fique sem atendimento, adotamos medidas como a contenção de gastos administrativos, reorganização de serviços, planejamento e programação financeira, controle rigoroso de pagamentos e vamos iniciar a qualificação de organizações sociais (OS), que acreditamos que trará profissionalização da gestão e consequentemente redução de custos, com melhor qualidade do atendimento. Além disso, mantemos constante negociação com o MS, o que fez com que conseguíssemos recurso para a implantação do plano de oncologia”, ressaltou.

Usuários não estão satisfeitos com serviço oferecido

A equipe de reportagem do jornal Tribuna Independente esteve entre o mês de novembro e dezembro no Hospital Universitário Professor Alberto Antunes (HUPAA) e no Posto de Saúde João Paulo II, no bairro do Jacintinho, e constatou que os usuários do SUS não estão satisfeitos com o serviço que é oferecido em Alagoas. A dona Maria do Carmo, 62 anos, disse que há 15 anos depende do SUS e a realidade não é fácil e que o serviço precisa melhorar muito. “Não é fácil conseguir ser atendido, várias vezes precisei, vim até o hospital e voltei sem atendimento. Tem especialidade que a gente vem procurar e é pior ainda. Desde o início de 2016 que eu preciso fazer uma tomografia, já estamos em dezembro e eu não consegui fazer a marcação. Deve ser a demanda”, criticou.

(Foto: Evellyn Pimentel)

Dona Maria do Carmo diz que tenta há quase um ano fazer uma tomografia

Seu Antônio de Oliveira, também está indignado com os serviços oferecidos e o jeito que a saúde é tratada no estado. Ele classifica como uma mercadoria e enfatiza afirmando que é de péssima categoria, a pior que possa existir.

“A saúde pública aqui é tratada como uma mercadoria e para quem não pode comprar a melhor, essa é vendida estragada. Esses governantes não sabem planejar, ou sabem, mas só pensam neles. O povo tem que colocar gente honesta para gerir um estado, uma cidade e o país. Eles roubam, não vem dinheiro para a saúde e a gente que paga o ‘pato’. As pessoas têm medo de falar por conta das represálias. Tudo que acontece aqui é um absurdo. Como um paciente que precisa de atendimento ou de exames passa três meses para marcar? Eu mesmo só consegui o exame porque fui ate a Defensoria Pública”, comentou seu Antônio.

E as reclamações parecem ser comuns nos corredores de hospitais e postos de saúde. Lúcia Maria Vieira, também acha que o serviço oferecido é de péssima qualidade e não atende a demanda da população. “O serviço é demorado, quando a gente procura um hospital, uma unidade de saúde é porque estamos necessitando de atendimento, ninguém vem a um lugar desses por vir. Eu preciso de um exame de Espirometria para minha mãe, uma senhora de 80 anos que já tem uma saúde frágil, e ele foi marcado para o dia 21 de janeiro [a entrevista foi realizada em 21 de dezembro]. O bom é que, ao menos foi marcado. Tem gente que nem isso consegue. O serviço do SUS é zero, mas infelizmente a gente tem que correr atrás porque é o que tem para o pobre”.

Paulo Sérgio Pereira, que reside na cidade de Paulo Jacinto, também é paciente do SUS. Ele disse que quando não tem a especialidade na cidade é transferido para a capital e falou que para consulta não é demorado porque já vem com ela marcada, a demora é pouca. Mas para exames existe uma demora maior. Ele acredita que é devido à demanda de pacientes. Ele disse que já chegou a esperar de cinco a seis meses para conseguir marcar um exame.

A socióloga Danúbia Barbosa, diz que o programa do SUS é um dos mais completos e funcionais do mundo, sua proposta teoricamente não deixa nada a desejar. Segundo ele, são os vários problemas, como corrupção, sucateamento do sistema e de trabalho público, além da burocratização, que impedem o bom funcionamento do sistema.

O SUS conta com uma cobertura preventiva como o Programa Saúde da Família (PSF), mas que não funcionam em sua totalidade para a prevenção. Por isso, de acordo com Danúbia Barbosa, as unidades de emergência e de saúde para o tratamento profilático ficam sobrecarregadas. “A saída mais viável para desafogar a demanda existente é a criação de sistemas alternativos, que atendam na total prevenção das doenças de forma em geral.”

HUPAA recebe do Ministério da Saúde cerca de R$ 2 milhões por mês

O Fundo Nacional de Saúde do Ministério da Saúde (MS) repassa para o HU, em média, dois milhões e meio de reais por mês para atendimentos ambulatoriais de várias especialidades, como nefrologia, clínica geral, clínica especializada, pediatria, entre outras. No total, até outubro, o hospital recebeu aproximadamente 26 milhões de reais em 2016.

Naquele ano, até o dia 14 de dezembro, foram realizados no HU 147.436 atendimentos ambulatoriais (consultas) e 4.462 cirurgias. Destas, 1.833 foram ambulatoriais, que são aquelas cirurgias que não exigem internação, e 2.629 em centros cirúrgicos com necessidade de internação.

Segundo informações da direção do HU, os recursos recebidos dependem da demanda e dos procedimentos que serão realizados na unidade, mas que tudo é em base de contratos.

A assistente social do HU, Maria Helena, disse que o hospital tem uma demanda muito grande. Ela acredita que seja a unidade que mais realiza atendimentos no estado. E que a maioria são de pessoas que vêm do interior do estado, cerca de 60%.

(Foto: Evellyn Pimentel)

Segundo assistente social Maria Helena, 60% da demanda do HU é do interior

“A gente recebe aqui no hospital pacientes de várias cidades. Muitos vêm com problemas que se fosse diagnosticado no início seria tratado nas unidades básicas de saúde, têm pacientes que chegam com uma demanda e voltam para a rede. Se o planejamento fosse melhor com uma assistência básica de qualidade que atendesse a população, muito paciente que veio até o hospital não chegaria à alta complexidade e assim, evitaria gastos maiores’’, comentou a assistente social.

Maria Helena disse que o objetivo do trabalho na saúde é a assistência integral, trabalhando com a linha de cuidado e com parcerias com os órgãos responsáveis, para que os recursos sejam empregados devidamente e que as pessoas que dependem do SUS realmente possam ser atendidas. “Estamos com projeto de renegociar o serviço e mostrar os aspectos para que de fato essa linha de assistência integral possa acontecer.”

A assistente social também se mostra preocupada com as propostas de Governo. Ela disse que se já é difícil trabalhar com os recursos atuais com a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 55) poderá ser pior. Mas torce para que a população não fique sem assistência.