Política

CPI da Braskem: senadores atribuem responsabilidade a empresas de engenharia

Comissão ouviu nesta quarta como testemunhas os responsáveis por estudos utilizados pela Braskem durante a lavra de sal-gema e para se defender das incriminações de ter causado afundamentos do solo na capital alagoana

Por Agência Senado 24/04/2024 18h12 - Atualizado em 24/04/2024 19h42
CPI da Braskem: senadores atribuem responsabilidade a empresas de engenharia
Omar preside reunião da CPI da Braskem: 'ou a gente toma decisões para acabar com essa molecagem ou esta CPI não vai servir para nada' - Foto: Pedro França / Agência Senado

Em audiência pública realizada nesta quarta-feira (24) na CPI da Braskem, senadores acusaram empresas de engenharia contratadas pela petroquímica de também terem responsabilidade pelos danos ambientais e sociais causados em Maceió pela extração mineral. A CPI ouviu como testemunhas os responsáveis por estudos utilizados pela Braskem durante a lavra de sal-gema e para se defender das incriminações de ter causado afundamentos do solo na capital alagoana. A reunião atendeu a requerimentos do relator, o senador Rogério Carvalho (PT-SE).

Para o senador Omar Aziz (PSD-AM), que preside o colegiado, a confissão de culpa da Braskem nos danos em Maceió também deve atingir as empresas que fizeram os estudos utilizados pela petroquímica.

— Se a empresa [Braskem] diz que é culpada, vocês têm corresponsabilidade. Ou a gente toma decisões para acabar com essa molecagem que é dar laudo para obter lavra e depois ter acidentes ambientais, ou esta CPI não vai servir para nada.

A resposta da Omar ocorreu em reação ao engenheiro de Controle e Automação Vitor José Campos Bourbon, ex-funcionário da empresa Flodim. Bourbon reconheceu sua responsabilidade técnica pelas operações de sondagens de minas contratadas pela Braskem em 2013, antes dos casos mais sérios de afundamento e rachaduras em 2018 no bairro de Pinheiro. Mas o engenheiro negou ser o responsável pelo laudo contratado, pelo seu uso pela Braskem ou pelos afundamentos.

— O objeto final seria a gente fazer um sonar básico e fazer uma modelagem 3D, [com o] objetivo de você entender como é que está a progressão da lavra do minério (...). A minha responsabilidade técnica era para fazer a empresa [Flodim] funcionar. Não diria nada em relação ao laudo. O laudo era emitido para a empresa [Flodim] na França e outra pessoa também no Brasil, a representante legal no Brasil, que realizou esse laudo. Esses dados são entregues à Braskem, e a Braskem faz bom uso ou mau uso — disse Bourbon.

Segundo o relator, a Flodim foi contratada para aferir a estabilidade das cavidades de mineração. A exploração do mineral sal-gema resulta em cavidades no subsolo. No entanto, as rochas acima das minas caem nas cavidades, ocupando o fundo e aumentando o vazio no topo da mina, fazendo a cavidade “subir”. Em Maceió, a Braskem é responsável por mais de 30 minas e tinha obrigação de monitorar sua progressão.

Dados confiáveis

Os senadores Omar e Rogério criticaram a confiança dos engenheiros no uso de dados fornecidos pela própria Braskem para embasar seus estudos. Também indagaram se a Braskem poderia ter induzido os engenheiros ao erro. Rogério ainda questionou os métodos de dois estudos feitos por um grupo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) encomendado pela Braskem em 2019.

Em resposta, o pesquisador contratado Marcelo Sousa de Assumpção afirmou que o objetivo da empresa era identificar fragilidades de estudo feito pela empresa estatal Serviço Geológico do Brasil (SGB) em 2019 que concluiu pela culpa da Braskem. Mas, tanto para Bourbon quanto para Assumpção, o uso de dados fornecidos pela empresa contratante é comum nos estudos.

—  A gente sempre supôs que todos os dados que a gente precisasse a Braskem estaria fornecendo, e não houve nunca nenhuma desconfiança. Não acredito que tenhamos sido induzidos ao erro — disse Assumpção.

Autorregulação

Para Rogério, o uso de dados fornecidos pela própria Braskem pelas empresas terceirizadas e sua aceitação pela Agência Nacional de Mineração (ANM), órgão do governo que fiscaliza a atividade, transforma a regulação do setor em uma “autorregulação”.

— A gente precisa mudar de vez o nosso sistema de agências (...) Ela é só um cartório que aceita aquilo que é feito por empresas terceirizadas contratadas pelo seu regulado. Aqui se caracteriza o processo de autorregulação (...) Tudo isso precisa ser revisto no Brasil com muita urgência para garantir a segurança, boas práticas no setor mineral e garantir a segurança da população, do meio ambiente e do clima — disse Rogério.

“Estudo superficial”

O senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL) acusou o engenheiro Roberto Fernando dos Santos Faria, sócio da empresa Concrete, de colocar a culpa do desastre nos moradores vítimas do desastre. Faria concluiu, em 2018, que as rachaduras e fissuras nas casas eram provavelmente decorrente de “construções não adequadas e falta de cuidado técnico na execução”. 

— A pior coisa para se ouvir é culpar a vítima. A empresa [Braskem] fez tudo para fugir de suas responsabilidades… — disse Rodrigo.

Faria afirmou que foi contratado pela Braskem em 2018 para emitir um “relatório preliminar” e “análise superficial” para identificar as causas das rachaduras. Segundo ele, o estudo foi um “pontapé inicial” para a criação de junta técnica composta pela defesa civil local e nacional, além da Braskem, para identificar imóveis em risco e para estudos mais aprofundados com uso de ferramentas mais completas. 

— Esse relatório perdeu completamente o efeito quando o Ministério Público implantou a junta técnica (...). Depois que houve todos os estudos necessários, concordo perfeitamente que em boa parte foi sim [culpa da Braskem], mas continuo dizendo que muitas construções não tinham o mínimo cuidado — disse o representante da Concrete.

Mas o relatório continuou a ser usado, segundo o relator, pela Braskem para se defender das acusações.

— Esse estudo embasou a posição da empresa, embasou orientação para órgãos de controle — disse Rogério.

Danos

A extração do sal-gema — que é utilizado, por exemplo, em PVC — ocorre desde os anos 1970 nos arredores da Lagoa Mundaú, em Maceió. A atividade era realizada por outras empresas, como a internacional DuPont, mas passou a ser feita pela Braskem a partir de 2003.

Atualmente, existem 35 minas na região, que somam o tamanho de três estádios do tamanho do Maracanã, segundo ex-diretor do SGB informou à CPI no início de março. Desde 2018, os bairros Pinheiro, Mutange, Bebedouro, entre outros que ficam próximos às operações da Braskem, vêm registrando danos estruturais em ruas e edifícios, com afundamento do solo e crateras. Mais de 14 mil imóveis foram afetados e condenados e cerca de 60 mil pessoas foram evacuadas de suas casas.

Depoimento de Engenheiro

A CPI da Braskem ouviu o engenheiro Vitor José Campos Bourbon. Ele é ex-funcionário da empresa Flodim, contratada pela Braskem para a realização de exames de sonar nas minas de sal-gema em Maceió (AL). Documentos recebidos pela CPI apontam que os exames não foram realizados conforme previsto no plano de lavra e nas recomendações técnicas e que os dados utilizados no estudo foram fornecidos pela própria Braskem. Vitor disse que era trainee e que assinou o estudo porque a engenheira responsável era francesa.

Escute o áudio abaixo:

Audios

CPI ouve engenheiro que assinou avaliação das minas da Braskem em AL.mp3