Política
“Colocaram raposa para cuidar do galinheiro”
Depoentes pediram à CPI que mapeamento dos danos seja revisto, já que foi feito por empresas da mineradora
A CPI investiga os efeitos da responsabilidade jurídica socioambiental da empresa Braskem, com relação ao afundamento do solo que atinge pelo menos cinco bairros da capital alagoana. Um dos principais objetivos é assegurar a justa reparação aos afetados pelos danos ambientais iniciados em 2018, causados pela exploração predatória do mineral sal-gema pela petroquímica.
A Comissão tem como presidente o senador Omar Aziz (PSD-AM) e como relator o senador Rogério Carvalho (PT-SE). Os dois conduziram os trabalhos da terça-feira, ouvindo primeiro dos representantes das vítimas e depois o ex-procurador-geral do Estado, Francisco Malaquias.
“Iremos a fundo nessa investigação, pois somos todos sensíveis a essa causa. Essa situação não foi fruto de uma ação natural. Está comprovado tecnicamente que houve, sim, influencia na prospecção das minas, no momento da extração das gemas. É algo que abala muito toda a sociedade, e a gente vai fazer o máximo para obter justiça”, declarou Aziz.
SUSPENSÃO
O senador Omar Aziz suspendeu a reunião da CPI por uma hora. Ele explicou que o relator, Rogério Carvalho, teria questionamentos importantes para os depoentes desta terça-feira, mas como precisou se ausentar, para participar da reunião da Comissão Diretora do Senado com o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, pediu para que a sessão fosse suspensa, temporariamente. Com a retomada da sessão, agora sob a presidência do senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL), os integrantes da Comissão voltaram às oitivas das vítimas da Braskem.
Questionados pelo relator Rogério Carvalho se os moradores sabiam que era a Braskem a responsável pelas rachaduras dos prédios e o afundamento do solo da região de Pinheiro, antes de maio de 2019, quando da divulgação do estudo apresentado pelo Serviço Geológico do Brasil (SGB), os representantes das vítimas disseram que não. “Até então, a empresa negava a culpa do crime e as autoridades diziam que não tinham parâmetros para essa afirmação”, destacou Alexandre Sampaio.
Segundo ele, depois da apresentação desse estudo, a Defesa Civil de Maceió apresentou um mapeamento dos bairros afetados pelas atividades da Braskem, com três áreas de risco distintas, deixando de fora imóveis impactados pela mineração sem nenhum critério. Para o empresário, esse mapa precisa ser revisto, já que foi feito com base diagnósticos patrocinados pela própria mineradora. “Além disso, houve uma grande omissão do poder público, em todas as esferas, com relação aos atingidos, que se sentiram totalmente desprotegidos”, acrescentou.
Alexandre Sampaio e Cássio Araújo reclamaram ainda dos acordos de compensação financeira firmados com o aval das autoridades e da indenização que o prefeito JHC (PL) aceitou receber da Braskem, no valor de R$ 1,7 bilhão, dando como quitada toda a dívida ambiental, social e patrimonial provocada pela mineradora, em Maceió. Segundo as vítimas, durante as negociações, a empresa dizia que quem não aceitasse a indenização ofertada, teria que buscar reparação na Justiça, num processo com previsão de até 20 anos de duração.
Para o representante dos empreendedores lesados pela mineração, durante o processo de negociação dos danos causados, as autoridades de Alagoas – Ministérios Públicos Federal e Estadual, Defensoria Pública da União, Prefeitura e Defesa Civil de Maceió – procuraram de todas as formas blindar a Braskem, como se quisessem evitar que a empresa pagasse pelo crime que cometeu.
Alexandre Sampaio revela ameaças de morte e recebe apoio de relator
Por conta de suas posições arrojadas, Alexandre Sampaio disse que estava sofrendo ameaças de morte, mas se reservou o direito de não revelar publicamente de onde partem as ameaças, mas ficou de passar os detalhes de forma confidencial à CPI.
O relator da Comissão se colocou à disposição do empresário alagoano ameaçado e disse que a CPI não ia se dobrar ao processo de “domesticação” patrocinado pela Braskem. “Outros órgãos ou instituições podem até ter cedido às pressões da Braskem e se domesticado, mas a CPI não vai se domesticar. Vamos até o fim, procurando responsabilizar os culpados e acabar com essa pouca vergonha que a autorregulação da mineração no Brasil”, afirmou Rogério Carvalho, acrescentando que não é só a Braskem que se beneficia da autorregulamentação, mas todas as empresas do setor mineral do País.
Para Rogério Carvalho, a autorregulação é um conjunto de procedimentos e normas aprovadas e aplicadas pelas próprias empresas e funciona de forma complementar à regulação tradicional. Para o senador, a Braskem atuou para “domesticar” a sociedade por meio da maquiagem de dados e informações falsas.
“Estou muito indignado neste momento. Este é um setor que se autorregula; é o retrato da autorregulação de uma área econômica. Ou seja, é quando uma empresa manda dados forjados, ou pela metade, para institutos de renome que, obviamente, vão produzir relatório seletivo, parcial, onde a verdade não será demonstrada. Estamos saindo do campo administrativo para o campo criminal. De quem é a responsabilidade? Quem patrocinou? É grave, é gravíssimo”, protestou o relator da CPI.
Carvalho quis saber o número de pessoas atingidas pelo crime ambiental causado pela Braskem. E se todas as associações de bairros da cidade teriam se tornado uma organização unificada em favor das vítimas. O relator perguntou também se os moradores eram conscientes do funcionamento da mineradora antes do afundamento do solo e se havia campanhas promovidas pela Braskem sobre ameaças resultantes da atuação da empresa.
“Teremos oportunidade de estar com a Braskem amanhã [um diretor da empresa será ouvido na CPI], e vamos deixar alguns questionamentos para ela. Mas em que momento os moradores, os donos de imóveis foram informados de que teriam de abandonar o lugar? E por quem? A CPI não tem poder judicial, mas tem o poder de investigação inicial e nós vamos dar luz a tudo isso”, enfatizou.
O senador Rodrigo Cunha elogiou a atuação de Rogério Carvalho. Ele pontuou que a CPI acertou ao ouvir nesta terça-feira os representantes dos moradores de Maceió, “que têm conhecimento de causa para falar por terem sido diretamente atingidos pelo problema”. Por isso, destacou, “estamos de fato nos sentindo numa boa condução dos trabalhos por esta CPI. Trata-se de uma atuação séria, e função nossa: de fiscalização para encontrarmos respostas para muitas perguntas”.
Danos ao Estado e pedido de indenização em ação
A CPI também ouviu o ex-procurador-geral de Alagoas Francisco Malaquias de Almeida Júnior, que ocupou o cargo entre 2015 e 2022. Rogério Carvalho argumentou que a oitiva teve como foco buscar informações sobre eventual pagamento de indenização pela Braskem junto ao governo daquele estado e eventual compensação de perda de patrimônio causada pela atuação da petroquímica.
Participante da CPI na condição de convidado, Francisco Malaquias disse que a procuradoria atuou no caso da Braskem em 2019, mas observou que o órgão não tem autonomia de atuação. Francisco frisou que em agosto de 2019 chegou a criar uma comissão da procuradoria para acompanhar as ações judiciais envolvendo a Braskem. Segundo o depoente, um levantamento dos danos realizado pelo Estado confirmou a necessidade de pedido de indenização junto à mineradora. O resultado dessa ação, conforme os ex-procurador-geral, somente saiu no final de 2023, depois que ele já estava fora da função.
Rogério Carvalho quis saber por que somente em 2023 houve desdobramentos da ação judicial e ponderou se não se tratou de uma possível omissão do governo de Alagoas. O relator considerou curioso o fato de os estudos conclusivos sobre as perdas de arrecadação por aquele estado em virtude da atuação da mineradora terem surgido num tempo aproximado da instalação da CPI da Braskem pelo Senado.
“É preciso que a gente avalie as condições e as formas como foram feitos esses pagamentos, a natureza deles, e a ‘marotice advocatícia’ para se encontrar o jeito de fazer sem abrir espaço para a imputação de responsabilidades sobre os danos ambientais, sociais, econômicos e de saúde sobre a população de Maceió”, destacou o relator.
Ao declarar que essas questões não foram levantadas antes de 2023, o ex-procurador-geral de Alagoas justificou que todo o processo se deu a passos lentos, onde o Estado não tinha muito o que fazer. “São objetos de ações do Ministério Público Federal. Posteriormente, associações devem ter ido se rebelando contra essas decisões [judiciais] e deve ter sido isso que levou a um desdobramento somente em 2023, mas não tenho os elementos necessários para me aprofundar no assunto”, argumentou Francisco Malaquias.
Após a sessão dessa terça-feira, os senadores integrantes da Comissão aprovaram dois requerimentos com pedidos de informações, propostos pelo senador Omar Aziz (PSD-AM). O parlamentar solicitou, ao prefeito João Henrique Caldas (PL) e o governador Paulo Dantas (MDB), que prestem esclarecimentos à CPI da Braskem sobre royalties e outras receitas provenientes da exploração do sal-gema, recebidos pela Prefeitura de Maceió e pelo Governo de Alagoas, de 1976 para cá.
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