Política

Governo Federal vê 5 dos seus 6 programas para conter o desemprego naufragarem

A sete meses do fim do mandato, Bolsonaro não conseguiu implementar uma política de emprego sólida no país

Por Portal Metrópoles 27/05/2022 07h12
Governo Federal vê 5 dos seus 6 programas para conter o desemprego naufragarem
Governo Federal, em 2019, mas só um deles foi colocado em prática por mais de um ano - Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

O presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), lançou seis programas para combater a escalada do desemprego desde que assumiu o governo federal, em 2019, mas só um deles foi colocado em prática por mais de um ano: o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda.

Na maioria das vezes, os projetos apresentados não foram votados pelo Congresso Nacional ou acabaram sendo revogados pelo próprio Palácio do Planalto. Grande parte dessas propostas flexibilizava leis trabalhistas e diminuía impostos pagos pelas empresas.

Um dos exemplos é a Carteira Verde e Amarela, uma das maiores apostas de Bolsonaro e defendida desde a eleição passada. Em novembro de 2019, o Palácio do Planalto editou uma medida provisória (MP 905/2019) que criava o programa, destinado a reduzir encargos de empresas para estimular a geração de empregos entre os mais jovens por meio da retirada de direitos previstos na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).

A MP recebeu cerca de duas mil emendas no Congresso Nacional e chegou a ter o texto aprovado na Câmara. No entanto, quando o prazo para votação no Senado estava prestes a encerrar, Bolsonaro decidiu revogá-la, cinco meses após a edição da medida e sob fortes críticas da sociedade. Apesar da derrubada, o governo sinalizou que pretende voltar com o projeto.

Há outras quatro medidas lançadas pela gestão bolsonarista que acabaram naufragando ou estão emperradas no Congresso. O Metrópoles fez um resumo sobre a tramitação de todas abaixo.

Veja quando cada proposta foi anunciada e que fim levou:


Novembro de 2019 – Contrato Verde e Amarelo: revogado cinco meses após edição da MP 905/2019.

Abril de 2020 – Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda: vigorou por 1 ano e 4 meses e teve a prorrogação, na forma de nova medida provisória, derrubada pelo Senado.

Agosto de 2021 – Programa Nacional de Prestação de Serviço Civil: proposto em 2021 e barrado no Senado. Foi recriado em janeiro de 2022 e recém-aprovado no Congresso. Aguarda sanção do presidente.

Agosto de 2021 – Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore): barrado no Senado.

Agosto de 2021 – Regime Especial de trabalho, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip): barrado no Senado.

Maio de 2022 – Programa Emprega + Mulheres e Jovens: aguarda análise do Congresso Nacional.

Programa de Emergencial de Manutenção do Emprego

Em abril de 2020, o governo publicou a medida provisória (MP 936/2020) que criava o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, que, por sua vez, previa o pagamento de um benefício financeiro aos trabalhadores que tiveram redução de jornada de trabalho em função da pandemia de Covid-19, o BEm (Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda).

A intenção era evitar demissões em massa por causa da crise causada pela crise sanitária. A MP estabelecia a possibilidade de redução da jornada de trabalho e do salário, proporcionalmente, além da suspensão do contrato de trabalho.

No ano seguinte, a medida foi relançada e vigorou até ser rejeitada em agosto de 2021 pelo Senado Federal, na forma da Medida Provisória 1.045/2021, sob alegação de inconstitucionalidade e por não atender aos critérios de relevância e urgência.

A matéria chegou a ser aprovada pela Câmara, mas teve tantos acréscimos na redação promovidos pelos deputados que no Senado foi apelidada de “minirreforma trabalhista”. Na ocasião, a MP recebeu 47 votos contrários e 27 votos favoráveis. Com isso, a proposta acabou arquivada.

Segundo balanço divulgado pelo Ministério do Trabalho e Previdência, em 2020, o BEm garantiu a manutenção de 11,5 milhões de vínculos empregatícios no país. Em 2021, o número foi de 2,6 milhões. Foi o único programa destinado a combater o desemprego que se manteve por mais de um ano.

Programa de Prestação de Serviço Civil

Outro projeto que o governo federal tentou emplacar foi o Programa Nacional de Prestação de Serviço Civil Voluntário, apresentado em agosto de 2021 e voltado para jovens de 18 a 29 anos e pessoas com mais de 50 anos em busca de emprego.

A proposta estipulava uma jornada de trabalho limitada a 6 horas diárias sem qualquer vínculo trabalhista. Caberia aos municípios a oferta das vagas e o pagamento das bolsas, calculadas com base nas horas de serviço trabalhadas.

Houve uma tentativa dos deputados em emplacarem o programa na redação da MP 1.045/21. Na ocasião, o relator na Câmara, deputado Christino Áureo (PP-RJ), tentou incluir o serviço voluntário na proposta que previa, inicialmente, prorrogar o Programa de Emergencial de Manutenção do Emprego.

Áureo acatou uma série de emendas, que incluíam a criação de três novos programas de geração de emprego e qualificação profissional: o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip) e o Programa Nacional de Prestação de Serviço Social Voluntário. Ele também tentou alterar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o Código de Processo Civil e uma série de outras leis.

O texto não foi bem recebido pelos senadores, que votaram pelo arquivamento de toda a MP 1.045/2021, impactando, consequentemente, na tramitação do programa que previa prestação de serviço voluntário.

Diante da derrubada da matéria, o governo federal decidiu pela desvinculação do programa da MP rejeitada pelos senadores, lançando separadamente uma outra medida provisória destinada a regulamentar exclusivamente a prestação de serviço voluntário: trata-se da MP 1.099/2022. Esta redação, por sua vez, foi aprovada na Câmara em 13 de maio e avalizada pelos senadores na última quarta-feira (25/5).

A proposta, contudo, ainda aguarda a sanção de Bolsonaro para começar a valer. Ela prevê que os selecionados serão convocados pelos governos locais de cada estado por meio de processo seletivo público, que irá definir o tempo de duração do voluntariado.

Regime Especial de Trabalho e Programa Primeira Oportunidade

Também caíram durante a tramitação da MP 1.045/2021: o Regime Especial de Trabalho, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip) e o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), semelhante à Carteira Verde e Amarela e voltado para o mesmo público.

O primeiro projeto previa a contratação sem vínculo formal e o pagamento de uma bolsa de R$ 550 para uma jornada de trabalho de até 22 horas semanais.

No segundo, o relator Christino Aureo (PP) propôs a redução na alíquota do FGTS e um bônus de R$ 275 no salário (o chamado Bônus de Inclusão Produtiva), como forma de incentivo ao primeiro emprego. Os dois programas foram incluídos a partir de emenda no PL que instituía o BEm.

Falta de diálogo entre Poderes

O advogado especialista em direito do trabalho Rafael Viana avalia que a principal razão para essa dificuldade em emplacar um grande projeto de combate ao desemprego é o descompasso entre a base aliada do governo no Congresso e a oposição. Segundo ele, o desalinhamento ocorre entre os Poderes Executivo e Legislativo, que preferem não validar propostas que possam fazer propaganda em benefício da popularidade um do outro.

Viana explica que o melhor cenário para reduzir índices de desemprego, por meio de programas governamentais, seria lançá-los apenas após diálogo entre os Poderes.

Sobre a efetividade das flexibilizações propostas, o especialista pontua que o sucesso desses projetos dependerá de qual lei trabalhista será alterada e para que grupo. “O Brasil é um país continental, de modo que regras trabalhistas extremamente benéficas em determinadas regiões podem não ser tão benéficas em outras”, afirma ele.

Por outro lado, Viana considera a flexibilização de encargos trabalhistas para reduzir a carga tributária uma medida eficaz no estímulo à criação de postos de trabalho.

“Como o prejudicado nessa hipótese seria o fisco ou o órgão previdenciário, o prejuízo gerado por essa flexibilização seria muito inferior ao benefício do cidadão que obtivesse um emprego em razão dessa medida”, conclui.

A advogada trabalhista Sheila Lopes ressalta que a geração de empregos não depende de um único fator. “Capacitações para inclusão no mercado de trabalho, suporte do governo, oferecimento de creches, promoção de parcerias com o setor privado e incentivo às empresas são alguns exemplos de ação que podem ajudar a gerar empregos sem mexer nas regras atuais do Estado”, conclui.

Em janeiro deste ano, Bolsonaro lançou uma nova MP (MP 1.099/2022) para recriar o programa de capacitação, agora intitulado de Programa Nacional de Serviço Civil Voluntário. Com os mesmos moldes da antiga proposta, o projeto passou na Câmara e aguarda votação no Senado, onde enfrenta resistência por parte de oposicionistas, que classificam a medida como eleitoreira e precarizadora das relações de trabalho.

Neste mês, o Ministério do Trabalho anunciou o Programa Emprega + Mulheres e Jovens, que propõe a qualificação para inserir mulheres e jovens no mercado de trabalho. Entre os pontos da proposta, estão a liberação do FGTS para pagamento de despesas com creche, a suspensão de contrato de trabalho para cuidar dos filhos e o incentivo à capacitação. Também foram feitas alterações na lei do jovem aprendiz. A iniciativa, no entanto, já foi criticada por analistas, que acham que as medidas podem mais prejudicar que ajudar o público-alvo.

Problema não vem de agora

O economista e professor de finanças do Ibmec Brasília William Baghdassarian explica que o problema do desemprego assombra o país pelo menos desde 2015, quando políticas econômicas do governo Dilma Rousseff (PT) resultaram em uma queda do Produto Interno Bruto (PIB) de 7%. Em seguida, ocorreu o impeachment da petista, que trouxe mais instabilidade ao cenário político e econômico.

“Acabou que a gente teve um crescimento ridículo entre 2017 e 2019. Então, desde 2015, a gente tem uma economia que patina.”

O economista avalia que, diante da pandemia, o governo adotou uma postura de agir em resposta às situações emergenciais. No entanto, faltou consolidar uma política trabalhista.

“O governo foi tateando ali entre 2020 e 2021 para tentar desesperadamente segurar o emprego, e, de fato, algumas políticas foram para a frente, outras não”, afirma Baghdassarian.

Para o professor, uma política efetiva tem de ser feita pensando no incentivo às empresas, sobretudo as pequenas e médias, que geram um grande número de oportunidades. “Tem muita gente desempregada que pode oferecer serviços e tem pessoas que querem comprar. A empresa entra exatamente nisso. É o conduíte que faz a ligação entre as duas coisas”, diz.