Os dados enviados pelo Congresso Nacional ao Supremo Tribunal Federal (STF) com detalhamento parcial das emendas de relator incluídas nos orçamentos de 2021 e 2022 estão incompletos, mas dão uma dimensão da distribuição nos partidos e nos estados.

As emendas de relator cresceram em volume nos últimos anos e ficaram conhecidas como “orçamento secreto” devido à falta de transparência. Porém, na semana passada, o Congresso Nacional cumpriu uma determinação do STF e deu transparência às emendas do relator.

Somente em Alagoas R$ 484 milhões foram utilizados por cinco deputados federais que apresentaram as documentações necessárias ao Supremo. Em todo o país, as indicações de deputados e senadores foram de R$ 36 bilhões.

De acordo com ofício encaminhado pelo presidente do senado, Rodrigo Pacheco, apenas 340 deputados federais e 64 senadores, de um total de 513 e 81 parlamentares, respectivamente, encaminharam a documentação contendo o detalhamento das indicações.

Apenas cinco dos nove deputados federais de Alagoas forneceram informações ao STF. Não há documentos de nenhum dos três senadores do estado. Isto pode significar que eles não utilizaram do orçamento ou, simplesmente, não apresentaram as documentações.

DESTINO DA VERBA

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP), informou que destinou R$ 357.5 milhões em recursos via emendas do relator. O valor é mais que o dobro do que foi destinado pelos outros quatro parlamentares somados. Foram 79 prefeituras e instituições beneficiadas, sendo que 16% das indicações do deputado foram destinadas somente à cidade de Arapiraca, que recebeu R$ 60 milhões de Lira.

Através de sua assessoria, o deputado informou que não falaria sobre o assunto.

Marx Beltrão (PP) teve o segundo maior orçamento das emendas de relator. Foram R$ 54,5 milhões destinados a 18 municípios alagoanos, com destaque para a cidade de Limoeiro de Anadia, que foi beneficiada com R$ 10,3 milhões, o que representa 18% do total de emendas encaminhadas pelo parlamentar.

O deputado não destinou nenhum recurso para cidades localizadas em seu reduto político, o litoral sul do estado.

Marx Beltrão disse que defende a publicidade no detalhamento de gastos. “É a transparência que mostra o trabalho do político e faço questão de divulgar todos os recursos que trago para Alagoas, está tudo no meu site”, afirmou.

Sobre a destinação de recursos para o Litoral Sul, o parlamentar afirmou que, com exceção da prefeitura de Piaçabuçu, não possui relação com as prefeituras e não recebeu projetos dos gestores. Beltrão disse que, ainda assim, envia recursos para a região via emendas de bancada, emendas individuais e por meio de articulação com o executivo.

O deputado federal Severino Pessoa (MDB) não informou o detalhamento completo da destinação dos R$ 28,4 milhões em emendas indicadas por ele. Na documentação do parlamentar constam apenas os ministérios aos quais a destinação dos recursos está atrelada, sem informar para quais municípios.

Nivaldo Albuquerque (Republicanos) destinou R$ 27.5 milhões para 21 prefeituras de Alagoas. Além dos recursos, o parlamentar destinou máquinas agrícolas para 11 municípios, mas não informou o valor do maquinário.

A deputada federal Tereza Nelma (PSD) indicou R$ 16.8 milhões em emendas do relator para 20 municípios, sendo 35% do total tendo sido destinado somente para a cidade de Arapiraca.

Em nota, a parlamentar informou que os recursos foram utilizados para auxiliar os municípios alagoanos no combate à Covid-19 e para melhorar a qualidade de vida das pessoas. “Todo recurso foi aplicado em áreas onde venho atuando desde o início do meu mandato dentro da política humanizada que sempre me propus a fazer. Acredito nos municípios e trabalho buscando atender a todos os alagoanos e alagoanas”, informou a parlamentar.

REQUER TRANSPARÊNCIA

Para a cientista política Luciana Santana, o orçamento secreto apresenta vários problemas, especialmente no que diz respeito à transparência.

“É importante a gente saber para onde está sendo destinado o recurso, quem está recebendo e quem efetivamente está apresentando essa solicitação de recursos. É um problema que já está amplamente conhecido e precisa ser resolvido”, opinou.

Para Luciana, Alagoas acabou sendo muito beneficiada com a situação, porque o presidente da Câmara é um deputado do estado.

“Nós temos o presidente da Câmara dos Deputados, o Arthur Lira, e ele, como qualquer outro parlamentar alagoano, tem interesse na sobrevivência política, reforçar os vínculos com os eleitores e ampliar a força política de alguma maneira”, continuou.

Para a cientista polícia, Lira está em um cenário favorável para utilizar esse instrumento, que é o orçamento secreto, e da própria proposição de emendas.

“Se não fosse a questão da falta de transparência eu poderia dizer que não há problema nenhum. O problema que há ainda, independentemente de ser Arthur Lira ou qualquer outro parlamentar, ou que seja de Alagoas ou de outro estado, é justamente a ausência de transparência, que é importante para a qualidade da democracia, da competição e resultados políticos, para o acompanhamento dos mandatos legislativos. Importante para que tenhamos clareza sobre qual foi o papel do deputado com relação à apresentação de propostas, execução e para o empenho dessas emendas”, concluiu.

Desde 2020 o relator da Lei Orçamentária Anual pode encaminhar emendas que precisam ser priorizadas pelo executivo. Na prática, os parlamentares fazem articulações para definir quanto cada deputado ou senador pode destinar para suas bases eleitorais e, até a última semana, não estavam públicos os detalhamentos destas destinações.

Todas as informações estão disponíveis na página do processo no STF, mas cada parlamentar enviou sua prestação de contas de um modo diferente, sem qualquer sistematização, exigindo um extenso trabalho manual para a realização das análises.