Política

Deputado Antonio Albuquerque nega existência de racismo

Sociólogo Carlos Martins cita falácia e falta de conhecimento do parlamentar sobre o assunto

Por Carlos Victor Costa com Tribuna Independente 25/11/2020 07h59
Deputado Antonio Albuquerque nega existência de racismo
Reprodução - Foto: Assessoria
Branco, privilegiado e sem lugar de fala, o deputado Antonio Albuquerque (PTB) usou um aparte durante a sessão desta terça-feira (24) da Assembleia Legislativa do Estado (ALE) para dizer que no Brasil não existe racismo, igualando seu pronunciamento ao do vice-presidente da República, Hamilton Mourão (PRTB), que recentemente fez esta mesma afirmação para rebater as manifestações que ocorreram em alguns estados contra a morte de João Alberto, homem negro, assassinado por seguranças de um supermercado no Rio Grande do Sul. Apesar de dizer ser contrário a todo e qualquer tipo de desrespeito e discriminação, o deputado afirmou que “estão querendo fazer aflorar um sentimento de separação entre as cores das peles dos seres humanos neste País, com atitude e sentimentos inescrupulosos. Não podemos permitir que nos imponham a pecha de um País onde há discriminação”. Em outro momento, o deputado diz, novamente, que não há discriminação no país e por isso é contra as cotas porque, segundo ele, é uma forma de oficializar na legislação a discriminação e a separação dos povos. “Ora, a cor da pele nunca traduziu o caráter de quem quer que seja. Eu digo com independência que não há em meu país, não há em meu estado, qualquer tipo de disputa de cor”. A discussão levantada durante uma sessão na Assembleia Legislativa, claro, foi repercutida pela reportagem da Tribuna. Para o sociólogo Carlos Martins, Antonio Albuquerque nunca leu sobre o assunto e comete um gravíssimo erro porque reproduz uma falácia para pegar carona numa outra falácia do vice-presidente da República. [caption id="attachment_413177" align="alignleft" width="300"] Carlos Martins questiona competência intelectual do parlamentar para ele falar sobre racismo (Foto: Sandro Lima/arquivo)[/caption] “Existem várias publicações sobre o racismo no Brasil, vários livros, vários artigos científicos sobre esse tema. A pergunta para o deputado é a seguinte: quantos livros ele já leu sobre o assunto para poder fazer uma afirmação da inexistência de um fenômeno social que todas as produções acadêmicas mostram que existe. Então, o grande desafio hoje que é lançado é provar que o racismo não existe. Porque provar que ele existe já foi feito desde Florestan Fernandes. Aqui em Alagoas você tem pesquisadores como professor Zezito Araújo, por exemplo. Eu que pesquiso sobre essa área e tantos outros. Sérgio Santos, Jeferson Santos que são pesquisadores da área de antropologia, da sociologia. Pessoas que dedicam sua vida acadêmica para o estudo sobre o racismo. E o deputado quantos segundos de existência ele já se dedicou a ler uma linha de um livro? Qual é a competência que ele tem intelectual para poder afirmar aquilo que pesquisadores constatam. Então, é falácia”, contextualiza. Para o sociólogo, as afirmações do deputado estadual são vazias e se sustentam no nada. “É simplesmente para ganhar holofote. É um jogo de marketing que produzem as pautas bombas, as chamadas da teoria da distração. Faz parte da teoria da distração. Porque são pessoas que não conseguem de outra forma se projetar”. “Opinião tem falta de sensibilidade com a população”   Para Geysson Santos, integrante do Instituto do Negro de Alagoas (Ineg), não é novidade que a elite alagoana nega o racismo presente em nosso cotidiano, afinal o racismo continua sendo a base de sustentação dos mesmos nomes no poder. “A fala do deputado [Antonio Albuquerque] é ainda mais problemática por ele ocupar uma cadeira na Assembleia Legislativa de Alagoas, lugar que gostaríamos que fosse ocupado por pessoas com sensibilidade e preocupação em amenizar os danos históricos que a população alagoana negra e pobre sofreu e segue sofrendo”. Ele acrescenta ainda que não falta apenas sensibilidade na fala do deputado, mas também falta informação e comprometimento com a população alagoana. “Basta olhar para os números apresentados no Atlas da Violência para ver que Alagoas lidera o ranking entre os estados do Brasil em relação à taxa de homicídios da população negra. O Estado é responsável direto por esses dados alarmantes, há um descaso e descompromisso em pautar políticas específicas para a população negra. E negar o racismo significa se isentar da responsabilidade em legislar para fim de promoção da população negra”. CASO EM ALAGOAS Em sua fala, o deputado estadual Antonio Albuquerque acabou não citando o caso ocorrido em Maceió no último sábado (21), quando um jovem negro de 19 anos foi vítima de tortura em um supermercado G Barbosa, localizado no bairro do Tabuleiro do Martins, na parte alta da capital. Este jovem, cuja identidade está sendo preservada, denunciou ter sido vítima de um homem que se apresentou como policial, na segurança do estabelecimento. O jovem contou em depoimento que foi levado para uma sala e acusado de ter roubado um celular. E que teria sido agredido para confessar o roubo. O caso foi registrado na Polícia Civil e denunciado pelo seu advogado ao Ministério Público Estadual (MPE). A OAB, seccional Alagoas, também acompanha o caso.