Política

“Crimes da Gangue Sádica não devem ser esquecidos”

Coaracy Fonseca lembra que integrantes seguem soltos e que a impunidade é uma condenação dupla às vítimas

Por Tribuna Independente 14/11/2020 08h57 - Atualizado em 23/09/2022 07h41
“Crimes da Gangue Sádica não devem ser esquecidos”
Reprodução - Foto: Assessoria

O procurador de Justiça Coaracy da Mata Fonseca se pronunciou publicamente sobre o caso da chamada Gangue Sádica, como ficou conhecido um grupo de jovens de famílias abastadas que estuprava garotas em Maceió. A história hedionda é de 1983. Como a Tribuna Independente informou na última quinta (12), o tema retornou, 37 anos depois, via campanha eleitoral, após um vídeo da comunicadora Maria Aparecida. Coaracy diz que “o caso chocou a sociedade alagoana na década de 1980”.

O agente do Ministério Público falou sobre os episódios num artigo que escreveu para o site de notícias Repórter Nordeste. Ele demonstra indignação diante dos detalhes da violência que era empregada contra as vítimas. As jovens tinham os mamilos arrancados com alicate. Rapazes, homossexuais ou não, também foram violentados.

“O resgate desse triste episódio da história alagoana é fundamental para compreendermos a gênese dos nossos grandes erros estruturais”, afirma o procurador.

FORMAÇÃO

A gangue era formada por 12 homens, segundo a imprensa publicou à época, num ambiente contaminado pela forte repercussão dos crimes. Houve pressão de lideranças políticas e de defesa da mulher pela punição aos criminosos, mas todos ficaram impunes. Entre os estupradores estavam supostamente José Arthur Jucá, o comerciante José Berê, o estudante Francisco Augusto Severian, conhecido como Diabo Louro, e Davi Cabral Davino.

Davi Davino, na época com 26 anos, viria se tornar um político profissional a partir da década seguinte. Ele está, nos dias atuais, no sétimo mandato de vereador na Câmara Municipal de Maceió. Seu herdeiro, Davi Filho, deputado estadual, é um dos candidatos a prefeito da capital. O filho costuma mostrar o pai como “exemplo de ser humano”. Na época, o acusado disse ao jornal Gazeta, em tom de piada, que seu “crime” tinha sido participar de “uma farra num motel”.

Ao menos 26 jovens e adolescentes foram vítimas da Gangue Sádica. O próprio secretário de Segurança da época, Ardel Jucá (tio de um dos acusados), confirmava as informações em conversas com a imprensa, mas não levou investigação adiante. Não houve sequer tomada de depoimento. Ainda que os jornais estampassem o caso todos os dias, não houve abertura de inquérito. O secretário dizia coisas como esta: “Se trata de fatos no campo particular das pessoas”.

COMISSÃO INVESTIGATIVA

Por força da mobilização de lideranças feministas de Alagoas, uma Comissão Especial de Investigação foi instalada na Câmara de Vereadores. A iniciativa, porém, não foi adiante, por desinteresse da maioria dos vereadores homens. Ente as mulheres que atuavam na vida pública e se empenharam para evitar a impunidade estavam a deputada Selma Bandeira e as vereadoras Jarede Viana e Kátia Born.

Acusações prescreveram, mas seria preciso punição

Em seu artigo na internet, o procurador do Ministério Público Estadual, Coaracy Fonseca anuncia que estará num projeto de resgate dos acontecimentos que fazem deste um caso clássico de atavismo numa comunidade.

O projeto de pesquisa, ele explica, será em parceria com o historiador Geraldo de Majella. Agir agora, mesmo tanto tempo depois, segundo ele, “é uma forma de expiação do sofrimento de tantas vítimas anônimas”.

Ainda segundo o procurador do Ministério Público Estadual, a “assustadora e temida gangue sádica” teria de ser punida, o que não chegou nem perto de ocorrer.

“Os crimes já prescreveram e os marginais andam soltos a espraiarem a sua genética maligna”, lamenta Coaracy.

“Mas a história não deve ser esquecida, para que não se repita. A história não prescreve. O direito ao esquecimento seria uma dupla punição às vítimas”, defende o procurador.