Política

Sem rádio e tevê, partidos apostam nas redes sociais

Legendas que não cumpriram cláusula de barreira ficarão de fora do horário eleitoral nas próximas eleições

Por Carlos Amaral 19/08/2020 08h01
Sem rádio e tevê, partidos apostam nas redes sociais
Reprodução - Foto: Assessoria
Com a aprovação da PEC 97/2017, conhecida como reforma política, 11 partidos ficarão sem tempo no rádio e na tevê por não terem cumprido as metas da cláusula de barreiras. Estas legendas não obtiveram 1,5% dos votos nacionais em pelo menos um terço das unidades da Federação, com um mínimo de 1% dos votos válidos em cada uma delas ou eleger 9 deputados federais em 9 estados diferentes. A alternativa, ao menos para os partidos que falaram à Tribuna, será o uso das redes sociais. Lindinaldo Freitas, presidente do PCdoB em Alagoas, que tem candidatura própria à Prefeitura de Maceió, ressalta que o partido já busca as redes sociais como alternativa para apresentar suas candidaturas. “Estamos fazendo isso [redes sociais]. O PCdoB tem buscado um projeto mais ousado em Alagoas, está lançando uma candidatura própria para Prefeitura de Maceió, o Cícero Filho, bem como uma chapa completa de vereadores. Temos procurado intensificar o trabalho por meio das redes sociais, especialmente nessa época de pandemia que limita o contato presencial”, diz Lindinaldo Freitas. Para o dirigente comunista, a cláusula de barreira tem o objetivo de extinguir partidos no país. “A cláusula de barreira tem por objetivo reduzir o número de partidos, por isso ela mira no financiamento e no tempo de TV e rádio. Essa foi uma opção equivocada de reforma política porque ela parte do pressuposto que o problema do sistema político é o grande número de partidos. Em nossa opinião, o problema não está na quantidade de partidos, até porque somos um país continental com diferentes formas de pensar e visões de mundo, o problema reside na ausência de substância política de boa parte desses partidos, na redução dos partidos a meros mecanismos para disputa eleitoral”, afirma Lindinaldo Freitas. Mesmo sendo o partido do vice-presidente da República Hamilton Mourão, o PRTB também ficará sem tempo no rádio e na tevê. Mas, para Adeílson Bezerra, presidente estadual da legenda em Alagoas, ao menos para a disputa a uma cadeira na Câmara Municipal, a perda dessas mídias não é determinante. “Nós vamos nos utilizar das redes sociais e o guia eleitoral nunca foi definidor para eleições proporcionais. Esta será uma eleição completamente atípica pelo fado da pandemia, onde o corpo a corpo fica um pouco prejudicado. Estamos orientando os nossos pré-candidatos a se utilizarem das redes sociais para se tornarem conhecidos”, diz o líder do PRTB alagoano. Os partidos que não cumpriram a cláusula de barreira em 2018, além do PCdoB e do PRTB, foram: PCO, PSTU, PCB, PMB, DC, Rede, PTC, PMN, PRP e PPL, que se fundiu ao PCdoB em 2019. ATUALIZAÇÃO A incorporação do PPL ao PCdoB garantiu ao partido a superação da cláusula de barreira. Portanto, ao contrário do que aponta a reportagem, os comunistas terão direito ao tempo de rádio e tevê nestas eleições. Para advogados, PEC buscou melhorar sistema político   Tanto para Marcelo Brabo quanto Gustavo Ferreira, advogados especialistas em Direito Eleitoral, as últimas mudanças na legislação visam aperfeiçoar o sistema político. “A finalidade maior da PEC 97/2017 foi fortalecer os partidos políticos, criando condicionantes para que eles possam participar do fundo eleitoral, como da propaganda no rádio e na TV. Como sabido por todos, vivemos o multipartidarismo, e, muitas das legendas, se tornam legendas de aluguel, sem programa e ideário. Com as referidas exigências e condicionantes, se permite a criação de uma linha nacional que expresse à construção programática e bem definida”, diz Marcelo Brabo. “A cláusula de desempenho foi defendida com a justificativa de se garantir um maior controle político-partidário baseado na legitimidade e na representatividade popular, buscando fortalecer cada vez mais a democracia, coibindo a criação de profissionais das eleições, que acabam deturpando a finalidade de uso dos recursos públicos”, completa. Já Gustavo Ferreira, pondera que o problema não é, necessariamente, a quantidade de partidos, mas quantos deles conseguem eleger parlamentares no Congresso Nacional. “Na verdade, [a PEC] tentou tornar o sistema partidário, mais racional. O problema no Brasil não é de número de partidos, que é similar à Alemanha, por exemplo, mas o número de legendas com representação no parlamento nacional, uma vez que temos mais que o dobro do 2° colocado, o que dificulta a organização política do país”, argumenta Gustavo Ferreira. [caption id="attachment_72432" align="aligncenter" width="640"] Marcelo Brabo e Gustavo Ferreira (Fotos: Sandro Lima/arquivo)[/caption] Uma cláusula de barreira já existiu no Brasil e foi derrubada no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2006 sob a alegação de inconstitucionalidade por ferir o princípio da isonomia. Marcelo Brabo ressalta que medidas legais como esta não são novidade, nem no Brasil nem em outros países. Segundo ele, Alemanha, Grécia, França, Espanha, Itália e Suécia também possuem cláusulas de barreira. E, mesmo não acreditando que a lei atual é inconstitucional, ele pondera que o STF pode vir a ter o mesmo entendimento de 2006, apesar de não acreditar nisso. “Hoje os tempos são outros, inclusive sendo os conceitos de moralidade e probidade muito mais fortes e preponderantes do que no passado; porque é imprescindível tentar fortalecer os partidos políticos, se criar linhas idearias e programáticas bem definidas, além de se tratar sobre o uso do tempo nos programas eleitorais na TV e Rádio e dos recursos destinados a isso; porque os atuais membros do STF, pelo que se deduz de pronunciamentos isolados, pensam de maneira diferente que no passado; e por último porque a cláusula de desempenho foi feita de maneira escalonada no tempo, para se adaptassem”, afirma Marcelo Brabo. Já Gustavo Ferreira, assim como o colega, não enxerga inconstitucionalidade na atual cláusula de barreira. “A isonomia está no acesso em poder disputar o processo eletivo, a quantidade maior de voto garante acesso a mais recursos públicos. Alemanha tem um critério mais rigoroso que o nosso e ninguém considera inconstitucional”, comenta. “A atual cláusula de barreira foi fixada constitucionalmente, tendo sido este um dos motivos da declaração de inconstitucionalidade da prevista na Lei dos Partidos políticos (Lei 9.096/1995)”, completa Gustavo Ferreira. ADI Há no STF uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), número 6063, impetrada pelo PRTB, que questiona a atual cláusula de barreira, cuja relatoria está com o minsitro Celso de Mello. Segundo o site do STF, o PRTB questiona o fato de a lei considerar os congressistas de forma desigual, uma vez que se considera apenas os votos para a Câmara dos Deputados e não os para o Senado. “Ainda que esses parlamentares participem de eleições majoritárias, ressalta a legenda, eles também são beneficiados dentro dos partidos políticos pelo fundo partidário, verba oriunda do orçamento público da União. Para o PRTB, a emenda ofende cláusula pétrea referente ao voto direto, secreto, universal e periódico, além de desrespeitar os princípios constitucionais da isonomia e do direito adquirido”, diz o site do STF.