Política

Secretários têm cautela sobre congelar salários

Governo federal defende que estados e municípios não reajustem salários para poder liberar ajudas financeiras

Por Texto: Carlos Amaral com Tribuna Independente 01/05/2020 10h31
Secretários têm cautela sobre congelar salários
Reprodução - Foto: Assessoria
Diante da crise gerada pela pandemia de coronavírus, causador da Covid-19, a Câmara dos Deputados aprovou regras de ajuda financeira a estados e municípios devido às perdas de arrecadação de ICMS e ISS. Contudo, no Senado, a proposta ganhou mais um item: para receber a ajuda, estados e municípios devem congelar os salários dos servidores por 18 meses. O desfecho desta “novidade” deve ocorrer após esta edição da Tribuna chegar às bancas, mas, antes disso, secretários de Estado e sindicalistas comentaram a iniciativa, originada no Ministério da Economia, de Paulo Guedes. Segundo Davi Alcolumbre (DEM), presidente do Senado, a ajuda financeira a estados e municípios deve ser votada, em sessão virtual, neste sábado (2). Caso o texto seja aprovado com a contrapartida, ele volta à Câmara, cuja aprovação se deu sem exigência de congelamento de salários. Fabrício Marques, secretário de Estado do Planejamento, Gestão e Patrimônio, diz que o congelamento de salário dos servidores pode vir a ser adotada, mas ainda é preciso esperar o comportamento econômico do Estado diante da crise gerada pela pandemia. “Estamos avaliando a extensão da crise e, nesse momento, ainda não conseguimos estimar os efeitos estruturais dela sobre a capacidade financeira do Estado. A máquina pública alagoana tem sido um exemplo em solidez fiscal nos últimos anos e certamente tomará as medidas necessárias para manter o equilíbrio fiscal alcançado após um difícil ajuste nas contas públicas implementado a partir de 2015”, diz. “O congelamento do reajuste de salários por um período é uma medida possível, mas é importante aguardar mais um pouco antes de fazer uma definição”, completa Fabrício Marques. Ainda de acordo com ele, o momento é de pensar formas de atuar diante das condições existentes. “A pandemia de coronavírus foi algo que pegou a todos muito de surpresa e, por agora, os esforços do Governo do Estado, assim como vem acontecendo nas demais unidades federativas do Brasil, têm sido, principalmente, em criar, com o que já temos em mãos, condições para que a população alagoana consiga enfrentar esse momento de cabeça erguida”, afirma Fabrício Marques. George Santoro, titular da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz), prefere não opinar sobre a proposta, uma vez que “não há nada concreto”. “O Governo Federal está colocando essa hipótese como medida fiscal compensatória. Ainda não há nada concreto, então fica difícil analisar se será esse caminho de congelar salários ou outra medida de mitigação de risco fiscal. Por isso, prefiro aguardar a proposta formal do governo federal para emitir opinião sobre o tema”, comenta o titular da Sefaz. Para sindicalistas, pandemia é usada para retirar direitos missão Mista de Acompanhamento das Medidas Relacionadas ao Coronavírus, realizada na última quinta-feira (30), o ministro Paulo Guedes externou a sua desconfiança com governadores e prefeitos para pedir a aprovação das contrapartidas para o auxílio a estados e municípios. Segundo o ministro, elas são necessárias para evitar que o dinheiro destinado à saúde e ao enfrentamento da pandemia seja usado para “fazer política”. “Nós estamos conscientes: não pode faltar recurso para a saúde. Por isso, não pode ter aumento de salário, nenhum outro uso do recurso que não seja relacionado ao coronavírus. Senão, seria uma covardia contra o povo brasileiro se aproveitar do momento que a população brasileira está sendo abatida para fazer política, em vez de cuidar de saúde. Seria uma traição ao povo brasileiro inaceitável”, afirma Paulo Guedes. Retirar direitos A proposta do Governo Federal levada ao Senado desagrada os sindicatos que acusam o uso da pandemia de coronavírus para retirar direitos. Para Dafne Orion, presidenta do Sindicato dos Urbanitários, todas as medidas vindas do Planalto parecem ter como alvo os trabalhadores. “Ao que parece, todas as propostas de enfrentamento das consequências da pandemia na economia miram exclusivamente os trabalhadores, sejam eles do setor público, privado ou mesmo o trabalhador informal. Lamentavelmente, a pandemia revelou ainda mais as desigualdades existentes. E não é só o contexto da pandemia que serve de argumento para retirar direitos da classe trabalhadora. Em 2016 foi aprovada a PEC do teto dos gastos públicos, que cortou principalmente, gastos com saúde e educação, prometendo gerar empregos, o que não ocorreu”, diz a presidenta dos Urbanitários. Ainda segundo ela, são os trabalhadores os mais expostos à pandemia, especialmente os dos serviços essenciais e os informais. “Estes se veem pressionados a trabalhar para poder ter o que colocar na mesa. Os trabalhadores dos serviços essenciais são, em sua maioria, do setor público, profissionais da saúde, setores de água e energia, gás, transportes, segurança, entre outros. E, além de se verem na condição da linha de frente do enfrentamento ao vírus, todos os dias expondo suas vidas e das suas famílias, recebem a conta de um governo que não tem dado conta de dar respostas para o povo. A vida não tem preço. A vida não se contabiliza. É preciso olhar agora prioritariamente para a vida”, afirma Dafne Orion. Já Consuelo Correia, presidenta do Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Alagoas (Sinteal), o Brasil segue na contramão do restante do planeta ao ainda seguir as políticas neoliberais. “Em outros países essa política de austeridade fiscal, neoliberal, já está sendo abandonada porque perceberam que isso não dá certo. O Brasil está entrando nisso agora com muita força e retirando direito dos trabalhadores”, afirma. “Essa proposta é mais um ataque aos servidores públicos; mais uma vez o Governo Federal se relaciona com os entes federados dando com uma mão e retirando com a outra. Para garantir auxílio, só se não houver recomposição salarial. Pela primeira vez na história do país, o Brasil entrou na lista dos dez piores para os trabalhadores, segundo o Índice Global de Direitos. Este governo só visa tirar direitos dos trabalhadores. Sabemos que 80% dos servidores recebem em torno de dois salários mínimos, não é esse dinheiro todo”, completa a presidenta do Sinteal. O Índice Global de Direitos é produzido pelo Observatório Digital de Saúde e Segurança do Trabalho, vinculado ao Ministério Público do Trabalho em cooperação com a Organização Internacional do Trabalho (OIT).