Política

Emancipação de Alagoas foi conservadora, diz historiador

Cláudio Jorge ressalta que cultura política de 200 anos atrás ainda seguem em voga

Por Colaborador com Jairo Silva 14/09/2019 08h29
Emancipação de Alagoas foi conservadora, diz historiador
Reprodução - Foto: Assessoria
Na comemoração dos 202 anos de emancipação política de Alagoas, na próxima segunda-feira (16), um fato chama a atenção de quem analisa a política alagoana: mesmas famílias se perpetuam no poder. Para aprofundar esta temática, a Tribuna conversou com três especialistas para entender as razões deste fenômeno. Eles apresentaram seus pontos de vista e detalharam os motivos desta concentração de poder que está na própria formação política de Alagoas e sua sociedade. Para o historiador Cláudio Jorge, quando se fala em emancipação, é preciso entender que este momento não foi um momento de avanço para toda a sociedade. Passados estes 202 anos, ainda há uma divisão social muito forte. “No quesito social não houve emancipação, ou seja, politicamente, em 1817, Melo de Póvoas se torna o primeiro governador para uma nova configuração politica e a emancipação do estado”, diz Cláudio Jorge. Em relação aos fatos históricos que marcaram a emancipação política e que formaram a sociedade e a classe política alagoana, Cláudio Jorge destaca que naquele momento ocorria “revolução pernambucana” e, no mundo, as revoluções Francesa e Industrial. Este ‘caldo’ político e social, em sua avaliação, termina chegando ao Brasil, com a elite pernambucana se revoltando contra o arrocho tributário imperial. A revolução pernambucana, que coloca as elites de Pernambuco contra o Império brasileiro é um movimento que não visava a melhoria do conjunto de toda a população e sim, a defesa de privilégios de classe, independente da sociedade. Segundo Cláudio Jorge, “essa elite pernambucana, descontente com a opressão tributária vai romper os laços com D. João. Basicamente, foi uma revolução das elites, sem ter no seu cerne a concepção social. Essa revolução não vai dialogar com as mazelas e os mais precarizados, que são os escravos. E dai há uma crise, uma a punição a Pernambuco: a emancipação de Alagoas, que vem de um conflito das elites e não da sociedade como um todo”, destaca o historiador. Para Cláudio Jorge, os valores do iluminismo influenciaram os revolucionários pernambucanos, que defendiam a ruptura total com o Império e defendiam valores republicanos. “A emancipação de Alagoas se dá dentro da premissa de ruptura com os revolucionários de Pernambuco”. “Algumas famílias detêm poder no Estado” Para o sociólogo Cícero Albuquerque, é impossível pensar em Alagoas sem pensar em três lógicas distintas: latifúndio, monocultura e patriarcado, que patriarcado determina o domínio da região Nordeste e também de Alagoas por algumas famílias poderosas e, ainda hoje, detém o controle politico dos municípios através do latifúndio e da monocultura, com domínio da propriedade da terra nos municípios. Para ele, desde a formação do estado e na emancipação dos municípios, se sobrepõe o poder do latifúndio, representado e mantido por famílias tradicionais desde o século XVII. “Isto tem sido perverso para Alagoas e para o povo porque tira o espirito público da coisa pública. Aliás, alguns de nossos municípios, antes de ter a categoria de municípios, foram engenhos e, consequentemente, nasceram com o crivo da propriedade privada”.   Segundo Cícero Albuquerque, são poucas as famílias que dominam a política alagoana e procuram manter entre eles, a concentração de poder através de alianças, seja através do latifúndio, seja através do mandato político. “O público e o privado se misturam e é impossível entender isso sem perceber que 5 ou 6 famílias poderosas, entrelaçadas entre eles expandindo seus domínios isso é fatal para pensar uma sociedade mais justa e democrática. Você não conhece praticamente lideranças com maior expressão que não tenha vínculos com alguns sobrenomes poderosos em Alagoas”, destaca Cícero Albuquerque. Famílias faziam de tudo para manter patrimônio Ainda sobre a formação da sociedade alagoana e o poder emanado da força da economia, o jornalista Edberto Ticianeli, autor do portal “História de Alagoas”, destaca que as famílias mais tradicionais e mais poderosas mantinham o patrimônio entre elas, através de negócios e associações, e até mesmo casamentos. Ele cita o caso das famílias Dubeux e Leão que, além da sociedade financeira, também realizavam casamentos entre si para manter o patrimônio econômico. “Fazia parte da cultura do poder econômico dominante o casamento entre parentes para exatamente não distribuir bens com outras famílias. Era comum casar primos com primas. Aí surgiu a família Dubeux Leão em Alagoas”, destaca. Ticianeli ressalta que o poder político sempre esteve ligado ao poder econômico. Assim como os outros especialistas consultados, ele afirma que ao longo do tempo as atividades econômicas foram mudando e as famílias foram se atualizando para continuar no poder. “Quem tem domínio político é quem tem poder econômico. Durante certo tempo foram os engenhos, depois o algodão, depois o gado, depois o açúcar”, afirma o jornalista. Ainda segundo ele, no início da formação do estado, havia poucas pessoas com poder econômico e isso resultava em concentração de poder extremo. Porém, isso mudou um pouco porque Alagoas possui mais de 1 milhão de eleitores. “O poder continua na mão de quem tem a capacidade para campanha mais robusta”, avalia Ticianeli.