Política

MP 881 precariza relações de trabalho

Considerada politicamente como a MP da “Liberdade Econômica”, a medida foi aprovada na Câmara e Senado e aguarda sanção presidencial

Por Texto: Jairo Silva – Colaborador com Tribuna Independente 24/08/2019 10h45
MP 881 precariza relações de trabalho
Reprodução - Foto: Assessoria
Apontada pelo governo federal como uma das medidas essenciais para reaquecer a economia do país, gerando mais empregos e mais renda, a Medida Provisória 881, mais conhecida como “MP da Liberdade Econômica” possui em seu conteúdo vários artigos que vão de encontro à legislação trabalhista em vigor. De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho, em Alagoas são 50 mil trabalhadores registrados na categoria de comerciários que podem ser afetados pela nova legislação. Já entre as Empresas de Pequeno Porte (EPP) e Micro Empresas (ME) somam 53.599 empreendimentos de acordo com a Junta Comercial de Alagoas – Juceal –, chegando ao percentual de mais de 90% das empresas em funcionamento no Estado. À reportagem da Tribuna, tanto representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT) quanto da Central Única dos Trabalhadores em Alagoas (CUT/AL), acreditam que a MP 881 tende a precarizar ainda mais as relações de trabalho. No último dia 22, a medida provisória foi aprovada pelo Senado com retirada de artigos. Nesta etapa, foi o artigo que permitia o trabalho aos domingos sem o pagamento de horas extras. Com a medida aprovada pelo Senado e pela Câmara federal, agora ela segue para a sanção presidencial, que pode sancionar ou vetar. Apesar da retirada deste ponto polêmico, outros pontos causam preocupação, tanto as entidades de classe quanto aos órgãos fiscalizadores do trabalho. “Em relação a não obrigatoriedade do registro da jornada de trabalho na carteira de trabalho, essa ausência de registro pode prejudicar a fiscalização do ministério e também o trabalhador, já que ele é que terá que provar através de testemunhas qualquer jornada extra”, enfatizou o procurador do trabalho Cássio de Araújo, da Procuradoria Regional do Trabalho em Alagoas. Outro ponto destacado pelo procurador e que foi aprovado na MP foi a não obrigatoriedade do controle da jornada para estabelecimentos com mais de 20 funcionários. Nestes casos, fica obrigado registrar apenas as horas extras dos trabalhadores, quando houver. “Pelo que está aqui deixa de ser obrigatório o livro de ponto, o relógio e ou o que seja: só passa a ser obrigatório se o trabalhador fizer hora extra. Isso dificulta a fiscalização.” Para o procurador do Trabalho, tanto a reforma trabalhista quanto a MP da Liberdade Econômica foram enquadradas e defendidas como medidas que gerariam mais empregos, com metas de gerar até quatro milhões de empregos no Brasil. “No ano de aprovação da reforma trabalhista, em 2017, tínhamos 13 milhões de desempregados e hoje, temos 13 milhões de desempregados. Se foram criados empregos com a reforma trabalhista foram empregos precários, trabalho intermitente e trabalho parcial que pagam menos de um salário mínimo”, argumenta. Ampliação da desigualdade social no Brasil não é descartada De acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) há uma redução na participação do salário na renda geral do país, e um aumento na desigualdade no Brasil nos últimos quatro anos. Para o procurador do Ministério Público do Trabalho, Cássio Araújo, as medidas tomadas pelos governos em relação à reforma trabalhista e “MP da Liberdade Econômica” estão indo no sentido de ampliar a desigualdade social do Brasil, onde os ricos brasileiros detêm a maior parcela da riqueza do país. FUTURO INCERTO Medidas como a MP 881, que facilitam a abertura e o funcionamento de pequenas e micro empresas, podem causar um verdadeiro imbróglio jurídico, com sobreposições de legislações e entendimentos jurídicos diversos. Para o dirigente sindical da Central Única dos Trabalhadores em Alagoas (CUT/AL), Izac Jackson, diante de tantas modificações e medidas provisórias, o acordo coletivo da categoria ganha forma de legislação. “Lá na aprovação da reforma trabalhista, nós fomos contra o princípio do acordado sobre o legislado. Hoje isso termina nos favorecendo, pois o que fica valendo como lei é a convenção coletiva da categoria, ou seja, o acordado sobre o legislado prevalece nas relações de trabalho”. Mesmo com a incorporação de serviços de consulta online através de aplicativos, como a carteira de trabalho que pode ser baixada por qualquer trabalhador, através da internet direto no seu smartphone, a proteção legal para o exercício do trabalho vem diminuindo. Se por um lado, cresceu em 10% a riqueza da parcela mais rica do país, que representa 1% da população, a pobreza e a desigualdade vem aumentando sua escalada ano a ano.  Um estudo divulgado pela Fundação Getúlio Vargas aponta um aumento da pobreza e da desigualdade até o segundo trimestre de 2018. Segundo o estudo, hoje, há 23,3 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza, com rendimentos abaixo de R$ 232 por mês; cerca de 11,2% da população. A miséria subiu 33% nos últimos quatro anos. São 6,3 milhões de novos pobres — mais do que a população do Paraguai – adicionada ao estoque de pobreza. MOBILIZAÇÃO Independentemente da aprovação ou da retirada do artigo sobre o trabalho aos domingos e nos feriados, o Sindicato dos Empregados do Comercio de Alagoas – Secea – irá fazer campanha de mobilização conscientização sobre os direitos dos trabalhadores na segunda-feira, dia 26. Situação dos pequenos empresários pode melhorar Para a Secretaria de Desenvolvimento e Turismo (Sedetur) a Medida Provisória 881, que tem sido usada politicamente como tratativa para a “liberdade econômica”, pode melhorar a situação de micro e pequenos empresários, segundo Rafael Brito, que é o titular da Pasta. Somente em Alagoas, os pequenos e micro empresários geram 65% dos empregos, correspondendo a 28% do Produto Interno Bruto (PIB) estadual. “Esta MP é positiva, pois toda medida que o governo federal puder tomar para desburocratizar, principalmente os pequenos negócios, é importante. Hoje tem muito investimento de empresas concentrado em área meio, por causa da legislação tributária confusa, por causa da legislação para tirar licenças que também é confusa, então, toda medida que vier para desburocratizar é bem-vinda”, argumenta o secretário em contato com a reportagem da Tribuna. O Serviço Brasileiro de Apoio a Pequena Empresa (Sebrae) posiciona-se favorável à sanção da medida, pois segundo a entidade “a MP 881 busca reduzir a burocracia para os negócios da iniciativa privada, ao estabelecer garantias para o livre mercado e prever isenção de alvarás e licenças para startups, entre outras medidas’. Em reportagem da Agência Sebrae, o presidente nacional da instituição, Carlos Melles, cita que a MP 881 representa uma verdadeira revolução no ambiente de negócios no País. “Estamos otimistas com a votação nesta Casa, que valoriza e atua historicamente em prol os pequenos negócios. A MP da Liberdade Econômica simplifica sensivelmente a vida dos donos de pequenos negócios, que representam cerca de 99% de todas as empresas brasileiras”, afirma. AMEAÇA Com as modificações aprovadas pela reforma trabalhista em 2017 e as mudanças advindas da aprovação desta MP 881, todos os direitos dos trabalhadores conquistados através da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT – podem estar ameaçados. “Tudo o que a Constituição garante oriundo do que já existia na CLT, em menos de dois anos com o governo [Michel, MDB] Temer, e nos últimos dois meses do governo Bolsonaro está de uma certa maneira, jogado na lata do lixo”, considera o diretor da Central Única dos Trabalhadores em Alagoas (CUT/AL), Izac Jackson.