Política

MPs se organizam contra projeto da 'lei da mordaça'

Proposta avançou com aprovação no Senado e segue para análise dos deputados federais; promotores contestam

Por Carlos Victor Costa com Tribuna Independente 09/07/2019 08h43
MPs se organizam contra projeto da 'lei da mordaça'
Reprodução - Foto: Assessoria
O Senado Federal aprovou no final de junho o projeto de lei que pune abuso de autoridade praticado por magistrados e integrantes do Ministério Público. A votação foi simbólica e a proposta volta à Câmara dos Deputados.  Magistrados, promotores e procuradores de todo o país dizem que a proposta trata-se de mordaça contra as instituições jurídicas. Senadores que votaram a favor do projeto defenderam que a lei trata de medidas de combate à corrupção, e não de abuso de autoridade.  A proposta de iniciativa popular chegou à Câmara dos Deputados sob o título de 10 medidas de combate à corrupção, mas foi bastante modificada durante a tramitação. A reportagem da Tribuna Independente entrevistou, sobre o assunto, o presidente da Associação do Ministério Público de Alagoas (Ampal), promotor de justiça Flávio Costa. Ele destacou que promotores e procuradores estão num movimento nacional de combate à corrupção e contra a lei da mordaça. Flávio pontuou ainda como foi feita a tramitação do projeto. “Na verdade, o que existia eram as 10 medidas de combate à corrupção feitas por ideia do MPF [Ministério Público Federal]. Foram conclamadas pessoas para que colhessem assinaturas. Essas pessoas fizeram suas assinaturas e fizeram um número suficiente para uma iniciativa de lei popular. Este projeto foi votado e aprovado, entre as 10 medidas têm umas coisas que na verdade atinge o Ministério Público, como também o Judiciário, mas especificamente o MP que é a lei da mordaça”, disse o promotor que explicou ainda como se dará o trabalho dos promotores caso esse projeto seja aprovado. “Imagine num júri você vai falar e no calor da emoção fala algo que passou despercebido. Aquilo ali pode ser interpretado errado e usado contra você. No outro lado você vai ter uma defesa que vai poder falar o que quiser, porque não vai ter punição. O abuso de autoridade seria apenas para o MP. No momento que a gente sabe que existe isso, esse ataque vai ser feito por grandes advogados, grandes bancas e vai ser feito por outras pessoas que podem usar não só testa de ferro, laranjas. Porque isso pode ser usado por laranjas para atacar o MP, o promotor para dizer que ele excedeu, que ele extrapolou os limites. Uma situação desagradável e incômoda. Você está ali defendendo o direito da sociedade, combatendo a corrupção e você mais a frente corre o risco de receber processos de réus, processo sem cabimento, por conta de uma fala”. Para barrar a aprovação na Câmara dos Deputados, o promotor disse que há uma petição feita pelas associações dos MPs colhendo assinaturas para tentar fazer com que os parlamentares não aprovem o projeto. “Recebi a informação que temos mais de oito mil assinaturas para pedir a Câmara Federal que ela pare no sentido de que o projeto não vá dessa forma.  Com a aprovação não só perde o MP, perde a sociedade, porque vai ficar sem a voz do promotor de justiça, a voz do membro do MP. Membros do MP e que fazem parte de associações estão indo sempre ao Congresso para mostrar que esta lei é um grande retrocesso e a gente pede e preza que ela seja modificada na Câmara. A gente acredita que isso não vai passar. Os parlamentares vão entender que essa lei sendo aprovada será um prejuízo para a sociedade”. De acordo com Flávio Costa, o projeto do jeito que está favorece interesses de pessoas que querem calar a voz do Ministério Público. O promotor ressalta ainda que as Corregedorias já pune excessos cometidos por promotores e que não é preciso uma lei para isso. “Isso tem que ser dado um basta. Quando as instituições são intimidadas quem só perde é a sociedade, quem só perde é o país. O MP não existe para acusar, existe para fazer justiça. Para se fazer o trabalho não se tem que ter intimidação. Excessos? Não precisa ter lei. Excessos já são punidos pelas nossas corregedorias”. ENTENDA O plenário do Senado Federal aprovou, em 26 de junho deste ano, o projeto de lei que define como crime o abuso de autoridades por magistrados e integrantes do Ministério Público. A medida terá que passar novamente pelo plenário da Câmara dos Deputados porque foi modificada pelos senadores. o projeto de lei que define como crime o abuso de autoridades por magistrados e integrantes do Ministério Público. A medida terá que passar novamente pelo plenário da Câmara dos Deputados porque foi modificada pelos senadores. O projeto de iniciativa popular é conhecido como “Dez Medidas Contra a Corrupção” e ganhou destaque após a divulgação pelo site The Intercept Brasil de supostas mensagens do ministro da Justiça, Sergio Moro – quando atuava como juiz federal – com procuradores da operação Lava Jato. A proposta (PLC 27/2017) é de 2017, mas estava parada na Câmara desde então. Depois da reportagem do site, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), pediu à presidente da CCJ, Simone Tebet (MDB-MS), que colocasse a proposta em votação. Alcolumbre criticou publicamente o conteúdo do suposto diálogo de Moro com Dallagnol. A medida também passou nesta quarta pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. O projeto define como abuso de autoridade para juízes “expressar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças de órgãos judiciais”. O entendimento não vale, porém, para promotores e procuradores, para os quais fica determinado como crime “expressar, por qualquer meio de comunicação, juízo de valor indevido sobre procedimento ou processo pendente de atuação do Ministério Público ou sobre manifestações funcionais extrapolando o dever de informação e publicidade”. Além disso, a medida também define que o abuso de autoridade só é assim entendido quando ocorrer com a finalidade específica de prejudicar alguém ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação pessoal.