Política

Atos pró e contra governo foram elitistas

Segundo perfil de manifestantes levantado em pesquisa coordenada por Cristiano Bodart, maioria do povo alagoano não foi às ruas

Por Tribuna Independente com Carlos Amaral 08/06/2019 09h05
Atos pró e contra governo foram elitistas
Reprodução - Foto: Assessoria
O mês de maio foi recheado de manifestações, duas contra ações do Governo Federal para a educação e outra em defesa do presidente Jair Bolsonaro (PSL). Coordenados pelo professor de Sociologia Cristiano Bodart, Edisangela Santos, Elizandra Cristina Rodrigues da Silva, Fabio dos Santos, Gabriela Vilela Palmeira Ferreira, Grace Martins, Caio dos Santos Tavares e José Luciano Martins da Silva foram às ruas nas manifestações do dia 26 – pró-Bolsonaro – e do dia 30 – contra – e levantaram o perfil dos manifestantes. À Tribuna, o coordenador do grupo destaca que em nenhuma das manifestações o povo alagoano estava nas ruas. Tribuna Independente – Após as pesquisas de perfil dos manifestantes dos dias 26 e 30, o senhor diz que uma das conclusões é de que “o povo alagoano não estava nas manifestações do dia 26 e do dia 30”. Por quê? Cristiano Bodart – Quando olhamos para os dados, falamos que não há uma representação da população alagoana, isso é na questão da composição do perfil dos sujeitos ali. Isso não quer dizer que os grupos não tenham a finalidade de representá-los. São duas coisas diferentes. Um grupo pode ir às ruas para representar, mas outra coisa é o próprio grupo ser representado enquanto perfil. Se nós pegarmos, por exemplo, alguns aspectos desse perfil – dos grupos que estiveram nas ruas –, veremos que eles destoam daquilo que é o perfil da sociedade alagoana. Por exemplo, a renda. A alagoana gira abaixo de um salário mínimo, a familiar per capita, e vimos que a renda na manifestação do ato pró-Bolsonaro predomina de R$ 2 mil a R$ 6 mil. Na manifestação do dia 30 de maio isso também se repete, mas com uma diferença substantiva: o percentual de sujeitos com renda abaixo de R$ 2 mil é mais significativo do que na do dia 26. Com isso, nós concluímos que a manifestação do dia 26 foi mais elitista se comparada com a do dia 30, que foi em prol da educação. Mas, mesmo com a manifestação do dia 30 tendo caráter menos elitista, ela ainda não representa os sujeitos que compõem a sociedade alagoana. A renda é um aspecto bastante explicativo dessa disparidade. E se a gente pega, por exemplo, o critério da escolaridade, isso se replica. No ato pró-Bolsonaro havia percentual elevado de pessoas com curso superior completo; e no em prol da educação, percentual muito elevado de pessoas que estão inseridas nas universidades. A gente sabe que o percentual de sujeitos na sociedade alagoana inserido no curso superior é muito abaixo do que temos representados nos atos. Tribuna Independente – E essa larga maioria da população, que no limite sente mais os efeitos das ações públicas, onde estava? Por que não foi mobilizada? Cristiano Bodart – Na verdade, temos uma fragilidade no regime democrático brasileiro. Grande parte da população ainda não está inserida na vida política. O volume da manifestação, por exemplo, é algo que chama a atenção porque nós não estamos acostumados a esse tipo de ato público, mas se formos ver as pautas presentes hoje no governo – seja para afetar ou beneficiar determinados grupos –, vamos ver que o volume de pessoas, proporcionalmente, que foram às ruas é muito menor que o de afetadas. Isso se dá exatamente por falta de cultura política. A sociedade brasileira ainda não tem cultura política. Ambas as manifestações – e isso começando lá em 2013; depois em 2016 – são pedagógicas. Ou seja, a participação gera participação. E é por isso que vamos ver na manifestação do dia 30, quase todos os sujeitos que ali estavam já tinham participado de outras manifestações; já na pró-Bolsonaro, o percentual de sujeitos que estavam li pela primeira vez era maior. Por isso, a gente pode dizer que o fenômeno Bolsonaro traz outros sujeitos para a arena política. Tribuna Independente – É uma novidade do cenário político? Cristiano Bodart – É uma novidade que começa em 2013, de sujeitos que estavam afastados da política pelo descrédito, sobretudo com os partidos políticos. Isso foi identificados pelas pesquisas, o descrédito com as instituições democráticas. Mas isso continua, só que com novos sujeitos que entram na arena política. O número de sujeitos – por exemplo – na manifestação do dia 26 sem vínculo com algum grupo organizado é bastante elevado. Então, ela trouxe mais sujeitos pela primeira vez às ruas do que o ato do dia 30. Nesta foram sujeitos que já possuem certa experiência participativa, com muitos ligados ao movimento estudantil, ao sindicato e a alguns movimentos sociais daqui a da região. Tanto é que a forma como eles tomam conhecimento dos atos aponta isso também. Foi revelado nos dados, por exemplo, no dia 26, a maior parte disse que soube da manifestação pelas redes sociais, tendo a predominância do WhatsApp; já no dia 30, as redes sociais foram importantes, mas há um elemento diferente que é o boca a boca, o que não está presente no ato pró-Bolsonaro. No dia 30 existe engajamento pessoa maior, com redes já construídas por serem atores que já participam de outros momentos. Se formos pensar em redes interpessoais, a manifestação do dia 30 é mais coesa enquanto coletivo e reconhecimento de grupo; já no dia 26, a manifestação foi muito restrita a ideia de grupo como sendo o familiar. Tanto é que é sintomática a presença de famílias no dia 26, enquanto no dia 30, não. O que tinha eram grupos de amigos, sociais, de mobilização...