Política

Procurador-chefe do MPT/AL critica proposta de fim da Justiça do Trabalho

Rafael Gazzaneo afirma que ideia fere separação dos poderes

Por Carlos Amaral com Tribuna Independente 09/01/2019 08h40
Procurador-chefe do MPT/AL critica proposta de fim da Justiça do Trabalho
Reprodução - Foto: Assessoria
No último dia 3, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou em entrevista ao SBT a possibilidade de extinguir a Justiça do Trabalho. A declaração gerou uma série de contestações de juízes, procuradores e advogados. Para o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho (MPT) em Alagoas, Rafael Gazzaneo, caso o presidente decida seguir com a ideia, ele estará interferindo na separação dos poderes da República. “Nenhum chefe do Poder Executivo pode propor ou ser autor de projeto de emenda constitucional para extingui-la. Imagine se ameaça fosse direcionada ao Supremo Tribunal Federal, por exemplo, que risco não seria para a tripartição de poderes do nosso regime democrático? Qualquer iniciativa nesse sentido deve partir do próprio Poder Judiciário, sob pena de ficar comprometido o princípio da separação de poderes”, diz o chefe do MPT em Alagoas. Além do viés de Estado, o procurador ressalta o caráter social que a Justiça do Trabalho desempenha no país. “No que se refere ao compromisso social, a Justiça do Trabalho é imprescindível, visto que, ao longo dos anos, especializou-se em julgar questões trabalhistas. Com a extinção dela, as demandas não acabarão, logo será necessário um ramo do Judiciário com capacidade de apreciar e julgar tais demandas. Não dá para deixá-las com a Justiça Comum, seja estadual ou federal, porque ela possui tradição em questões de natureza cível e criminal, mas não nas causas trabalhistas, que demandam preocupação maior com os aspectos protecionista e tutelar da Justiça especializada nas relações de trabalho”, comenta Rafael Gazzaneo. Na entrevista, o presidente Jair Bolsonaro disse que o assunto está em estudo por sua equipe e ressaltou a necessidade de ambiente político para encaminhar a proposta ao Congresso Nacional. “Poderia fazer, está sendo estudado. Em havendo clima, poderíamos discutir e até fazer uma proposta”, diz o presidente da República que, na mesma entrevista, afirmou haver “excesso de proteção” aos trabalhadores no país. Quem também defendeu a extinção da Justiça do Trabalho, ainda em março de 2017, foi o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM). “Não deveria nem existir”. O PSL fechou apoio à sua reeleição para a presidência da Casa, em fevereiro. Para OAB-AL, Justiça do Trabalho contribui com o desenvolvimento   Quem também se manifestou contra a ideia do presidente Jair Bolsonaro de extinguir a Justiça do Trabalho foi Nivaldo Barbosa Júnior, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Alagoas, que convocou uma reunião com advogados trabalhistas na sede da autarquia, no bairro de Jacarecica, em Maceió. [caption id="attachment_271742" align="alignleft" width="267"] Nivaldo Barbosa se preocupa com as consequências da extinção da Justiça trabalhista no país (Foto: Edilson Omena)[/caption] “É importante apresentar à sociedade o quanto a Justiça do Trabalho contribui com o desenvolvimento. Vamos ainda trazer à discussão outras instituições, a exemplo da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho de Alagoas [AMATRA] e do Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região”, diz o presidente da OAB em Alagoas. Ele ressalta a importância de acompnhar “vigilante” as discussões sobre o tema. “É preciso que todos entendam tudo o que está acontecendo e as possíveis consequências”, completa Nivaldo Barbosa Júnior. ANAMATRA A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) divulgou nota, na última sexta-feira (4), para criticar as declarações de Jair Bolsonaro. “O raciocínio demonstra como a proposta ventilada oculta gravíssimo abalo no sistema de freios e contrapesos sobre o qual se assentam as fundações republicanas. Qualquer iniciativa tendente a alterar a estrutura constitucional do Poder Judiciário brasileiro compete originária e privativamente ao Supremo Tribunal Federal, excluídos os demais poderes da República”, diz a nota. “Presidente desconhece realidade de outros países”   O Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário Federal em Alagoas (Sindjus) emitiu nota, na noite de terça-feira (8), em repúdio às declarações de Jair Bolsonaro sobre a extinção da Justiça do Trabalho. Para a entidade, o presidente desconhece a realidade de outros países quando questionou, na entrevista dada ao SBT, a existência de espaços semelhantes. “O presidente demonstrou desconhecer que outros países possuem a Justiça do Trabalho. Dados da Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público [Frentas] mostram que a Justiça do Trabalho existe com autonomia estrutural e corpos judiciais próprios, em países como Alemanha, Reino Unido, Suécia, Austrália e França. Na maioria dos países, há jurisdição trabalhista, com autonomia orgânica, autonomia procedimental ou com ambas, como a Inglaterra, Alemanha, França e Nova Zelândia”, diz a nota do Sindjus. O sindicato ressalta o papel desempenhado pela Justiça do Trabalho na conciliação de conflitos entre patrões e empregados. “Soluciona conflitos, trata de temas como demissão, acidentes de trabalho, erradicação dos trabalhos em condição analógica ao escravo e trabalho infantil”, relata. “Segundo dados do Relatório Geral da Justiça do Trabalho em 2017, foram julgados 4.287.952 processos. A maior parte se refere à falta de pagamento de ações rescisórias, o não repasse de valores em um eventual desligamento, tais como aviso prévio, multa do FGTS, férias proporcionais, verbas de natureza alimentar, entre outras”, completa.