Política

Quanto vale cada vice na eleição mais pulverizada desde 1989

Candidatos tiveram dificuldade de ampliar o escopo e ficaram com chapa 'da casa'; só Bolsonaro não tem mulher na composição

Por Afonso Benites com El País Brasil 07/08/2018 10h06
Quanto vale cada vice na eleição mais pulverizada desde 1989
Reprodução - Foto: Assessoria
Na eleição presidencial mais pulverizada desde 1980, os candidatos, em sua maioria e com exceção de Geraldo Alckmin, tiveram dificuldade em fazer amplas alianças. A situação acabou se refletindo na escolha dos vices: eles atraem poucos novos votos ou acabam transitando no mesmo campo ideológico que o cabeça de chapa. Abaixo, uma análise das composições dos principais concorrentes à Presidência da República neste ano feita por dois cientistas políticos entrevistados pelo EL PAÍS: Flávia Biroli e Paulo César Nascimento, ambos professores da Universidade de Brasília. "Digamos que se Bolsonaro tivesse conseguido mobilizar uma mulher conservadora, talvez passasse uma mensagem ao eleitorado feminino de que há alguma abertura”, diz Biroli a respeito da dificuldade do candidato de extrema-direita com o eleitorado feminino. “O vice nem sempre busca agregar em votos, mas em alianças. O povão não está nem aí para o vice", pondera Nascimento. LULA – HADDAD – MANUELA Com seu candidato preso e condenado por corrupção e lavagem de dinheiro em segunda instância, o PT lançou uma chapa tripla, com uma espécie de candidatos virtuais. A primeira formação é com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva encabeçando, tendo como suplente o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. Como a candidatura de Lula provavelmente será vetada pela Justiça por ele ter infringido a Lei da Ficha Limpa, Haddad assumiria a candidatura e a deputada estadual gaúcha Manuela D’Ávila (PCdoB) passaria a ser a vice. A chapa ficou composta pelo PT, PCdoB, PROS e PCO. [caption id="attachment_123876" align="aligncenter" width="650"] O ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (Foto: Rodolfo Buhrer/Reuters)[/caption] Flávia Biroli – “O espaço do possível nessas eleições explica muita coisa. O PT não conseguiu ampliar suas alianças. Embora, pouco conhecida nacionalmente, a Manuela é uma política com grande potencial. Agrega como mulher jovem e dialoga com a base ideológica que é a mais forte do PT. Por outro lado, ela abre menos uma perspectiva desse eleitorado que já vota em Lula”. Paulo César Nascimento – “Lula não quer perder o grande poder que ele tem sobre o PT. Por isso, estica ao máximo a definição do seu candidato real. Com a Manuela sendo plano B para a vice, amplia-se o tempo de TV e segura um partido de esquerda que estava querendo alçar voo próprio. Já o Haddad tem penetração em certos setores muito maior que o Lula. Ele é um intelectual, menos truculento, sem rabo preso. É uma pessoa que melhora a imagem do PT”. BOLSONARO – MOURÃO Jair Bolsonaro (PSL) tentou ter outro vice. Primeiro ouviu um não do senador Magno Malta (PR). Depois, do PRP, do general Augusto Heleno. Foi rejeitado pelo também general Hamilton Mourão (PRTB) e pela advogada Janaína Paschoal (PSL). Sondou o herdeiro da família real Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL), mas não se definiu por ele. E voltou a instituir no general Mourão, um defensor da ditadura militar que já chegou a defender uma intervenção militar no Brasil durante os anos de crise do Governo Dilma Rousseff. Acabou consolidando uma chapa puro sangue militar. A coligação abrange o PSL e o PRTB. [caption id="attachment_123875" align="aligncenter" width="650"] Jair Bolsonaro, no dia 5, em São Paulo (Foto: Sebastião Moreira/EFE)[/caption] Flávia Biroli – “A escolha do general aponta para uma confirmação da identidade principal do candidato até esse momento na relação com o eleitorado. Ele não trouxe para vice alguém que permitisse ampliar o escopo do eleitorado. Pelo contrário. Digamos que ele tivesse conseguido mobilizar uma mulher conservadora, talvez passasse uma mensagem ao eleitorado feminino de que há alguma abertura”. Paulo César Nascimento – “O Bolsonaro é um caso de desespero. A escolha pelo general Mourão tem como objetivo aumentar sua penetração nas Forças Armadas. E só. O fato de ele ter sido só capitão, não garantiria os votos da área militar. Com um general ajuda a fortalecer nesse sentido, mas também o enfraquece por não ter uma ampliação do leque”. MARINA – EDUARDO JORGE Com seu discurso de renovação da política, poucos recursos e uma bancada minúscula, a REDE reduziu a possibilidade de firmar alianças. Na reta final das convenções, a ex-senadora Marina Silva (REDE) conseguiu confirmar um vice, seu antigo colega no parlamento Eduardo Jorge (PV). Ambos já foram filiados ao PT e defendem causas ambientais. Além disso, a fundadora da REDE já concorreu ao Planalto pelo PV, em 2010, o que facilitou a aproximação com a legenda. A aliança envolve apenas REDE e PV. [caption id="attachment_123873" align="aligncenter" width="650"] Marina Silva e Eduardo Jorge, em Brasília (Foto: Joédson Alves/EFE)[/caption] Flávia Biroli – “O Eduardo Jorge é um ambientalista que, em alguns aspectos, tem uma trajetória diferente da de Marina Silva. Ele teve um papel importante na Câmara quando havia possibilidade de se avançar na descriminalização do aborto no Brasil. Hoje o PV é um partido conservador. E Eduardo não é. Ao mesmo tempo, ele também traz a mesma marca com perspectiva ambiental. É uma soma que mais reforça um pensamento do que amplia”. Paulo César Nascimento – “Foi uma escolha razoável dado a falta de opção. Se ela ampliasse para alguém do Centrão, por exemplo, ela se desmoralizaria completamente. Ela tem essa coisa messiânica, pureza de ética, que teria essa dificuldade grande em ampliar. O PV consegue ampliar seu tempo de TV e reforça a ideia do ambientalismo”. CIRO – KÁTIA ABREU O ex-governador do Ceará e ex-ministro Ciro Gomes (PDT) paquerou um grupo de cinco partidos do centrão e dois da esquerda, PSB e PCdoB. Viu ao menos três balões de ensaio serem lançados como seus possíveis vices: Manuela D’ávila (PCdoB), Márcio Lacerda (PSB) e Benjamin Steinbruch (PP). Acabou caindo em uma armadilha feita pelo centrão, que decidiu apoiar Geraldo Alckmin (PSDB). E em outra arapuca armada pelo PT, mas que envolvia o PCdoB e o PSB. O primeiro se coligou com os petistas. O outro, fez um acordo de não agressão com Lula e decidiu não apoiar ninguém. Ciro ficou isolado e recorreu a uma solução caseira. Sua vice é a senadora tocantinense Kátia Abreu (PDT), que já recebeu o "prêmio de motosserra de ouro" da ONG Greenpeace por agir contra a ampliação de unidades de conservação ambiental e de terras indígenas pelo país. Ela é membro da bancada ruralista e já foi ministra da Agricultura de Dilma Rousseff (PT). A coligação tem PDT e AVANTE (antigo PTdoB). [caption id="attachment_123872" align="aligncenter" width="650"] Ciro Gomes e Kátia Abreu (Foto: Evaristo Sa/AFP)[/caption] Flávia Biroli – “A centro esquerda que vê o Ciro como alguém capaz de trazer um projeto de caráter social fica em dúvida sobre o significado de se ter Katia Abreu como vice por causa de sua relação com o ruralismo. Ela é uma política complexa. Tenho dúvidas de que ela seja um aceno para direita que não votaria em Ciro e acho que não é uma figura simpática para a centro-esquerda”. Paulo César Nascimento – “A Kátia Abreu não tem a retórica tão radical como a de Ciro. É ligada ao ruralismo e, ao mesmo tempo, se aproximou muito do PT. Talvez o favoreça para penetrar nesse eleitorado do agronegócio assim como para pescar nas águas do petismo”. ALCKMIN – ANA AMÉLIA Ao patinar nas pesquisas eleitorais e enfrentar resistências internas – alguns de seus correligionários queriam trocar sua candidatura pela de João Doria – o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) conseguiu se firmar como o concorrente com a maior coligação nacional possível. São nove partidos juntos. Sua dificuldade nas últimas semanas foi a de escolher o seu vice. Ouviu um não do empresário Josué Alencar (PR) e tentou encontrar algum nome de peso na região Nordeste. Não conseguiu e optou pela senadora gaúcha Ana Amélia Lemos (PP). Ter uma postura conservadora, ser mulher e ligada ao agronegócio pesou na escolha. A coligação ficou assim: PSDB, PP, PR, PRB, DEM, SD, PPS, PSD e PTB. [caption id="attachment_123871" align="aligncenter" width="650"] Ana Amélia e Geraldo Alckmin (Foto: Evaristo Sa/AFP)[/caption] Flávia Biroli – “O Alckmin apontou para o Rio Grande do Sul que é um Estado que tem se mostrado bastante conservador em suas intenções de voto recentemente. A disputa dele é sobretudo com Bolsonaro. Por isso escolheu uma mulher conservadora para tentar virar os votos do Bolsonaro. Podem dizer que ele não está preocupado com Norte e Nordeste, mas vários políticos de sua coligação são de lá. E isso pode ajudá-lo, desde que se empenhem na campanha”. Paulo César Nascimento – “O vice nem sempre busca agregar em votos, mas em alianças. O povão não está nem aí para o vice. O candidato também se importa mais em ganhar tempo de TV e recursos. É esse o movimento feito pelo PSDB, pela escolha da Ana Amélia. Acredito que poderia deter o avanço do Álvaro Dias (PODEMOS) na região Sul e agregar também do lado do agronegócio e por ser mulher”. Disputa registra o maior número de candidatos desde 1989 [caption id="attachment_123877" align="aligncenter" width="650"] O candidato do Podemos, Álvaro Dias (Foto: Adriano Machado/Reuters)[/caption] Ao todo, há 13 candidaturas ao Palácio do Planalto. É o maior número de concorrentes desde 1989, quando houve 22 candidatos à Presidência da República. Além dessas cinco principais, ainda disputam o pleito as seguintes coligações: - Álvaro Dias (PODEMOS) e Paulo Rabello de Castro (PSC); - Guilherme Boulos (PSOL) e Sonia Guajajara (PSOL); - Henrique Meirelles (MDB) e Germano Rigotto (MDB); - João Amoêdo (NOVO) e Christian Lohbauer (NOVO); - Cabo Daciolo (PATRIOTA) e Sulene Nascimento (PATRIOTA); - José Maria Eymael (DC) e Helvio Costa (DC); - João Vicente Goulart (PPL) e Léo Alves (PPL); - Vera Lúcia (PSTU) e Hertz Dias (PSTU).