Política

Presidente do Peru tenta evitar impeachment por caso Odebrecht

'Já me condenaram antecipadamente', afirmou Pedro Pablo Kuczynski em recurso apresentado a tribunal

Por AFP 21/12/2017 02h03
Presidente do Peru tenta evitar impeachment por caso Odebrecht
Reprodução - Foto: Assessoria

O presidente peruano, Pedro Pablo Kuczynski, comparece nesta quinta-feira (21) diante do Congresso para se defender das acusações sobre seus vínculos com a construtora Odebrecht, mas as possibilidades de evitar um impeachment parecem mínimas.

"Já me condenaram antecipadamente", afirmou Kuczynski em um recurso apresentado nesta quarta a um tribunal constitucional de Lima.

"Em nenhum momento foi convocado para prestar depoimento na comissão da Lava Jato no Congresso sobre a informação que o vinculava à Odebrecht", destaca o recurso.

Em entrevista coletiva, Kuczynski destacou que a comissão parlamentar "ignorou sua disposição de esclarecer" o caso e "motivou o Parlamento a debater a vacância presidencial por incapacidade moral permanente sem qualquer prova determinante", proposta que o Congresso "admitiu autoritariamente".

Kuczynski corre o risco de virar o primeiro presidente a perder seu posto por causa da Odebrecht, que admitiu ter pagado milhões de dólares em propinas em vários países latinos-americanos para obter importantes contratos de obras públicas.

"Eu não menti, não sou corrupto", insistiu.

Os analistas alertam que a economia peruana sofrerá um forte impacto com a incerteza política e a Igreja católica apelou para que se evite um aprofundamento da crise.

"A sorte do presidente Kuczynski está lançada", afirmou à AFP o analista político Luis Benavente, que prevê que o presidente de centro-direita será destituído ainda nesta quinta.

A pedido de Kuczynski, a OEA enviará uma missão a Lima para observar o processo de impeachment. O grupo será integrado por Jean Michel Arrighi, secretário de Assuntos Jurídicos da organização, e por Gustavo Cinosi, assessor sênior do secretário-geral, Luis Almagro.

O primeiro-vice-presidente peruano, Martín Vizcarra, que assumiria o governo caso destituam o presidente, chegou ao Peru e afirmou sua lealdade ao presidente.

"O presidente me pediu que retorne hoje e aqui estou, ao lado do presidente. Primeiro para escutá-lo e para que esclareçam todas as dúvidas", disse à imprensa Vizcarra, que também é embaixador peruano no Canadá.

Cinco milhões de dólares?

Kuczynski apresentará suas alegações a partir das 9h locais (12h em Brasília) a um Congresso dominado pela oposição, decidido a destituí-lo, oito dias depois de o escândalo Odebrecht fazer outra vítima proeminente, o vice-presidente equatoriano Jorge Glas, condenado a seis anos de prisão por receber propinas.

Empresário de 79 anos com experiência e amigos em Wall Street, Kuczynski alega que nunca recebeu pagamentos ilegais da empresa brasileira, mas três em cinco peruanos consideram que ele deve deixar o poder, segundo pesquisas de opinião.

Depois de ouvir as alegações do chefe de Estado, o Congresso unicameral manterá um debate antes de iniciar a votação pelo impeachment por ter ocultado que empresas vinculadas a ele prestaram assessoria para a Odebrecht, pelas quais pagou quase US$ 5 milhões.

Para aprovar a vacância por "incapacidade moral permanente" de Kuczynski, com base em que negou insistentemente os vínculos com a empreiteira para depois ser desmentido pela própria empresa, são necessários 87 dos 130 votos do Parlamento.

Os votos parecem certos, visto que o processo de impeachment foi solicitado por 93 legisladores.

Fora todos

O partido fujimorista Força Popular, que mantém contra as cordas Kuczynski desde que começou seu mandato, em julho de 2016, exigiu há alguns dias sua renúncia para evitar o impeachment.

Mas os adversários do presidente tampouco estão isentos de suspeitas: a própria líder do Força Popular, Keiko Fujimori (filha do ex-presidente detido Alberto Fujimori), é investigada por causa da Odebrecht e terá que depor na Procuradoria. Ela deveria fazê-lo nesta quarta-feira, mas pediu para adiar a entrega de seu testemunho.

Em sinal da desconfiança com os políticos peruanos, organizações sociais e sindicais convocaram uma "grande marcha nacional" para esta quarta-feira para exigir "que todos os corruptos vão embora".

A Odebrecht admitiu ter pago US$ 29 milhões em propinas para obter obras no Peru entre 2004 e 2015, período que abarcou os governos de Alejandro Toledo (2001-2006), do qual Kuczynski foi ministro; Alan García (2006-2011); e Ollanta Humala (2011-2016).

Humala permanece em prisão preventiva, acusado de receber US$ 3 milhões para sua campanha eleitoral de 2011, enquanto que contra Toledo pesa uma ordem de extradição dos Estados Unidos, por supostamente receber US$ 20 milhões em propinas para conceder à Odebrecht a construção de uma rodovia.

O crescimento econômico em risco

O caso Odebrecht e o processo de destituição estão provocando prejuízos econômicos.

Embora o Peru registre um crescimento superior ao de seus vizinhos (3,9% em 2016), o país teve que cortar em um ponto percentual suas expectativas para 2017 a 3,8% devido à paralisação de algumas obras.

Kuczynski previu em julho que a economia peruana cresceria mais de 4% em 2018 com a retomada dos grandes projetos de infraestrutura, mas esta meta agora parece distante.

O legislador governista Juan Sheput propôs que se o Congresso destituir Kuczynski, os dois vice-presidentes peruanos renunciem. Isto obrigaria a convocação de novas eleições, o que provocaria maiores turbulências econômicas, segundo analistas.