Política
O jogo duplo de Maia para chegar à Presidência da República
Aos 47 anos, presidente da Câmara dos Deputados já dizia estar fora de novas disputas de cargos para o poder Executivo
O deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ) já era um homem resignado depois da conquista da presidência da Câmara dos Deputados em 2017. Aos 47 anos, dizia a interlocutores que não voltaria a disputar cargos para o Poder Executivo, depois que eleitores só lhe deram 2,9% dos votos válidos na briga pela Prefeitura do Rio de Janeiro em 2012. Espreitado pela Operação Lava Jato, estava mais preocupado em se preservar do que em arriscar. Mas se prepara, agora, para assumir interinamente a presidência da República em caso de afastamento do presidente Michel Temer (PMDB). Enquanto Temer luta pela sobrevivência e pelo apoio minguante do Congresso, Maia faz um jogo duplo: posa de fiel aliado do presidente sem mover um dedo para salvá-lo.
O presidente da Câmara dos Deputados evita despontar nos holofotes como interessado na cadeira de Temer. Mas deixou Temer à própria sorte. Nos bastidores, influenciou na escolha do deputado federal Sérgio Zveiter (PMDB-RJ) como relator da proposta de ação penal contra Temer na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A posição seria um cheque em branco para qualquer parlamentar, mas Zveiter, um neófito no PMDB, é considerado um deputado motivado por agenda própria e é esperado que seu relatório seja favorável à abertura de um processo contra Temer. O andamento de uma ação penal contra o presidente no Supremo Tribunal Federal depende da aprovação por dois terços dos votos no plenário da Câmara, mas o relatório e o resultado da votação na CCJ, que pode acontecer já na semana que vem, são âncoras importantes para o comportamento do plenário, onde ainda não se sabe até quando o apoio ao presidente resiste. Se aprovado o processo na Câmara, Temer será afastado da presidência por 180 dias e Maia assumirá interinamente até o resultado do julgamento no Supremo Tribunal Federal. Se Temer acabar condenado pelo Supremo Tribunal Federal, Maia terá de convocar eleições indiretas pelo Congresso e também aí, em tese, se dá bem: é um dos nomes cotados para a escolha dos parlamentares.
Os gestos de indiferença para com o Planalto se acumulam. Depois do primeiro processo por corrupção, Temer deve virar alvo de mais duas ações penais. Para atenuar o desgaste e facilitar a barganha com parlamentares, o presidente queria que todas ações fossem analisadas de uma só vez pelo Congresso. Maia nem tentou algum movimento legal para socorrer o presidente. Decidiu tramitar separadamente as ações penais contra Temer na Câmara. Enquanto o peemedebista tenta transmitir “quase certeza absoluta” de rejeição da denúncia no plenário do Congresso, Maia admite publicamente que é “grave” a acusação de que o presidente era o destinatário da mala de R$ 500 mil entregue pela JBS ao deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). A passagem de homem de confiança do Planalto para uma interessada neutralidade institucional acontece ao mesmo tempo em que os dirigentes do PSDB, o mais importante aliado de Temer, dão mostras de que o desembarque pode se impor nos próximos dias. À elite político-empresarial fiadora do impeachment de Dilma Rousseff, ele já envia sinais de que manterá a equipe econômica e sugere que pode revigorar a coalizão a ponto de aprovar uma reforma mínima da Previdência, por exemplo. Para que não ficasse qualquer dúvida de suas intenções, já havia declarado em maio: "A Câmara vai manter a defesa da agenda do mercado”.
Só que Maia se equilibra entre sinalizações opostas. Já segurou a tramitação de mais de 18 pedidos de impeachment contra Temer. Ex-prefeito do Rio por três mandatos, o vereador Cesar Maia (DEM-RJ), pai de Rodrigo, se empenha em disfarçar qualquer esforço do filho para assumir a presidência da República. “Ele nem pensa nessa possibilidade”, afirmou Cesar Maia ao EL PAÍS por e-mail.
A queda de Temer serviria de refúgio legal para Maia, ainda que não o livre de turbulências provocadas pela Lava Jato. Se assumir a presidência da República, o deputado fica protegido no Olimpo presidencial da artilharia de ações penais do Ministério Público. Quem sobe a rampa do Palácio do Planalto se beneficia do entendimento jurídico do atual procurador-geral, Rodrigo Janot, de que crimes anteriores ao exercício da presidência da República não podem ser investigados ou denunciados enquanto durar o mandato presidencial. Assim, o presidente da Câmara ganha tempo para driblar os inquéritos em que é apontado como beneficiário de pelo menos R$ 2 milhões em propinas e caixa dois, pagos pela OAS e pela Odebrecht. Na última empreiteira, era apelidado de "Botafogo" nas planilhas do departamento de propinas.
Também por razões afetivas Maia se beneficia de um eventual mandato presidencial. Pai de quatro filhos (Maria Beatriz, Ana Luiza, Maria Antônia e Rodrigo), o deputado é casado com a enteada de Moreira Franco, atual ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República. Se acabar o Governo Temer, Maia é a última esperança de salvação do sogro com foro privilegiado. Sem um ministério, Moreira Franco passaria a investigado na Justiça Federal pelo recebimento de mais de R$ 4 milhões em propinas. E aí sentenças correm bem mais rápido do que no Supremo Tribunal Federal.
Embora diga que não pretende mais concorrer a cargos no Executivo, na presidência da Câmara Maia não desperdiçou a chance de conquistar a adesão de máquinas de prefeituras para voos mais altos – para si mesmo ou para o pai. Começou em junho uma série de reuniões com prefeitos onde prometeu abrir a bica de emendas orçamentárias e ajudar na solução de problemas administrativos. O pai diz que, apesar disso, ele não disputará o Governo do Rio no ano que vem em nenhum cenário. “Nada mudou. Ele não concorrerá a governador”, afirmou.
De qualquer jeito, Maia precisa recuperar votos até para sobreviver na Câmara dos Deputados nas próximas eleições. De acordo com a cientista política Carolina de Paula, pesquisadora do Núcleo de Estudos sobre o Congresso da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), ele foi um caso raro de parlamentar com votação decrescente após disputa por prefeitura. Caiu de 86.162 votos em 2010 para 53.167 votos em 2014.
O Núcleo de Estudos sobre o Congresso da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) conduziu em maio uma pesquisa qualitativa com grupos focais sobre as percepções dos eleitores fluminenses em relação aos deputados federais do estado. As conclusões foram desfavoráveis para o sucesso eleitoral no ano que vem do presidente da Câmara. “Rodrigo Maia é aquilo que as pessoas identificam como político clássico: o pai é político, o sogro também. Para 2018, ele é o que as pessoas não querem. Na pesquisa, as pessoas querem renovação. O melhor negócio para ele é ficar na sombra. Mas talvez assumir a presidência da República possa ajudá-lo a concorrer a algum cargo mais competitivo, se conseguir realizar uma transição razoável”, afirmou a pesquisadora.
Cesar Maia minimiza a votação decrescente do filho. Diz que o desempenho acompanhou o declínio do DEM e do PSDB em 2014. “A votação decrescente correspondeu à mesma tendência (declinante) do DEM e do PSDB e crescente do PT. O quadro agora é o contrário, com debacle do PT”, afirmou. Mas Cesar não fala do caso do parceiro de coligação de Rodrigo, Otávio Leite (PSDB-RJ), que também teve votação pífia para a prefeitura do Rio em 2012 e ganhou cerca de 20 mil votos entre 2010 e 2014, somando 106 mil votos.
Desde que conquistou a presidência da Câmara em julho do ano passado pela primeira vez, Maia exibiu uma faceta desconhecida ao eleitor: chorou emocionado. Voltou a chorar publicamente quando conquistou novo mandato, desta vez de dois anos, em fevereiro. Mas amigos destacam que ele possui sangue frio. Maia sabe esperar pacientemente até um atalho aparecer. Como quando entrou na política contra a vontade do pai. Rodrigo ficou fora da primeira gestão de Cesar na Prefeitura do Rio (1993-1996) e só conseguiu o primeiro cargo político como secretário municipal de governo de Luiz Paulo Conde (1997-2000), apoiado pelo clã na eleição de 1996. Naquele momento, Maia sabia esperar e queria arriscar – o cargo foi o trampolim para a conquista do primeiro mandato de deputado federal em 2000. O desempenho nas urnas só piorou de lá para cá, mas hoje ele não precisa se arriscar enquanto Temer se atola na Justiça. Esperar o erro dos outros pode render um mandato presidencial.
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