Interior

MPF atua para garantir acesso de pescadores e marisqueiras à praia de São Bento, em Maragogi

Ações buscam equilibrar turismo e preservação dos direitos das comunidades tradicionais no município

Por Tribuna Hoje com Ascom MPF/AL 26/10/2024 01h14 - Atualizado em 26/10/2024 02h07
MPF atua para garantir acesso de pescadores e marisqueiras à praia de São Bento, em Maragogi
Inquérito civil instaurado pela procuradora da República Juliana Câmara investiga denúncias de bloqueio de acessos à praia, inclusive de vias essenciais para o exercício da pesca - Foto: Ascom MPF/AL

Na quinta-feira (24), o Ministério Público Federal (MPF) realizou uma visita técnica em Maragogi, no litoral norte de Alagoas, para investigar o impacto da expansão imobiliária na Praia de São Bento. A visita focou especialmente no fechamento dos acessos tradicionais que os pescadores utilizam para o transporte de jangadas e equipamentos de trabalho.

Essa ação faz parte de um inquérito civil conduzido pela procuradora da República Juliana Câmara, que visa apurar as denúncias de bloqueio dos acessos à praia, que são essenciais para a pesca, atividade fundamental para a subsistência da comunidade local.

A procuradora liderou uma reunião com marisqueiras e pescadores na sede da Associação de Pescadores, Marisqueiras e Aquicultores de São Bento (Apemasbe). O encontro contou com a presença de membros da associação, representantes do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), da Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e da Comissão Pastoral da Pesca (CPP).

As discussões do encontro centraram-se nas necessidades e nos desafios enfrentados pela comunidade, destacando a ausência de locais adequados para o armazenamento e a manutenção dos equipamentos, bem como a deficiência da infraestrutura disponível.

(Foto: Ascom MPF/AL)

"Eu me sinto vomitado da praia onde eu nasci, onde eu aprendi a pescar", desabafou o pescador Josias Ferreira Teixeira, ao comentar sobre o impacto das construções voltadas ao turismo na região. Ele relatou a redução do espaço para guardar equipamentos e a perda gradual de acessos ao litoral, que seriam essenciais para a continuidade das atividades pesqueiras.

Após a reunião, o grupo inspecionou os pontos de acesso mais críticos, conforme indicado pelos pescadores. A visita envolveu a verificação de bloqueios e a confirmação da eliminação de alguns acessos, baseada em levantamentos fotográficos realizados pelo MPF no ano anterior. Na parte da tarde, o MPF promoveu um segundo encontro com representantes das entidades mencionadas e da prefeitura de Maragogi para debater o projeto de urbanização da orla de São Bento e as iniciativas planejadas pelo município.

A procuradora da República Juliana Câmara destacou a importância do equilíbrio entre o desenvolvimento turístico e a preservação dos direitos das comunidades tradicionais. "O turismo é necessário, mas o desenvolvimento não pode massacrar essa população. Até mesmo porque muito do potencial turístico é desperdiçado quando se ignora a cultura e as singularidades do território, que são o grande atrativo para o turismo de alto nível, que busca justamente a rusticidade e as peculiaridades locais, respeitando o aspecto socioambiental", afirmou.

Tais garantias estão previstas no Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (Lei nº 7.661/1988), que estabelece que toda propriedade privada deve cumprir sua função socioambiental. De acordo com a procuradora da República, a chegada de empreendimentos imobiliários e turísticos certamente traz oportunidades econômicas para a região; no entanto, “expulsar moradores, pescadores e marisqueiras de suas atividades tradicionais não é compatível com essa função social”, destacou Juliana Câmara, durante a reunião com representantes da prefeitura, incluindo o prefeito de Maragogi, Fernando Sérgio Lyra.

Encaminhamentos

Como medida inicial, o MPF recomendou que a prefeitura de Maragogi organize uma oficina com a comunidade local para criar um consenso sobre o plano de urbanização da orla da Praia de São Bento. O propósito é alinhar as necessidades dos pescadores com o desenvolvimento planejado, garantindo que as decisões de urbanização sejam tomadas em conjunto com a comunidade. A procuradora pediu que os resultados da oficina sejam enviados ao MPF até o final de novembro.

(Foto: Ascom MPF/AL)

Além disso, discutiu-se a implementação de instrumentos jurídicos, como o Sistema de Gestão de Imóveis da União (Sisrei) e os Termos de Autorização de Uso Sustentável (Taus), para assegurar a continuidade das atividades pesqueiras. O Sisrei autoriza a cessão de uso de áreas da União, e o Taus permite o uso sustentável de terras públicas por comunidades tradicionais, proporcionando a segurança jurídica essencial para a manutenção das atividades locais.

O segundo procedimento trata da fiscalização dos acessos à praia por parte da prefeitura de Maragogi. Em inspeção, o MPF verificou a eliminação de alguns acessos, confirmando as queixas da comunidade.

Estas medidas têm como objetivo assegurar que o desenvolvimento imobiliário e turístico não afete os direitos e a subsistência das comunidades tradicionais de São Bento, mantendo os valores culturais e sociais distintivos do litoral de Maragogi.

(Foto: Ascom MPF/AL)

Segundo a procuradora da República Juliana Câmara, o papel do MPF é articular as demandas dos pescadores com as ações da prefeitura, garantindo que a comunidade tenha seu direito de ser ouvida respeitado e que as decisões públicas estejam alinhadas com a legislação sobre gerenciamento costeiro. "Nosso objetivo é assegurar que a coletividade tenha voz ativa e que o desenvolvimento da região ocorra sem atropelar os direitos das comunidades tradicionais, fundamentais para a identidade e o equilíbrio social do local", concluiu.