Interior

Família luta por justiça após morte de menor

Em novembro, Mislan Odilon, de 15 anos, caiu de ônibus de transporte escolar e foi atropelado pelo veículo em Joaquim Gomes

Por Lucas França com Tribuna Independente 02/02/2022 06h42
Família luta por justiça após morte de menor
Reprodução - Foto: Assessoria
Mislan Odilon Lima dos Santos, 15 anos, estudante do 9° ano da Escola Municipal São José, em Joaquim Gomes. Aluno dedicado, filho exemplar, bom amigo e que sonhava em ser um psicólogo, teve o sonho interrompido no dia 25 de novembro de 2021, quando o adolescente subiu no ônibus escolar da prefeitura da cidade, como fazia diariamente. Mas, nesse dia, um acidente trágico interrompeu seus sonhos e mudou a vida de sua família. O garoto caiu da porta do veículo, que segundo outros alunos, o motorista teria avisado que estava quebrada e não queria ninguém encostada nela, mas como o ônibus estava superlotado, Mislan não tinha outra opção. Ele caiu e o próprio veículo acabou atropelando-o na região do tórax e ele não resistiu aos ferimentos. “Eu não consigo nem falar, ainda não acredito. Estou sem forças e nossas vidas mudaram completamente. Sinto uma dor imensa todos os dias, tudo lembra ele. Eu tento ser forte por conta da irmã dele que me vê chorar e também cai aos prantos. Eles eram apegados, dormiam no mesmo quarto e agora ela não consegue mais, agora está no quarto com a gente. Vejo as outras crianças chegando da escola e meu filho não. Estamos passando por tratamento psicológico. Essa é uma dor que não desejo a ninguém”, disse emocionada a dona de casa Jaciane Rosa de Lima, 37 anos, mãe do estudante. O pai de Mislan Odilon, o aposentado Misael Odilon dos Santos, de 38 anos, afirma que preferia ser agredido todos os dias do que passar pelo que estão passando com a perda do filho. “É uma perda irreparável. Interromperam o sonho do meu filho. Um menino bom, estudioso e que tinha um futuro pela frente. Ninguém nunca viu Mislan entrar em confusão na rua ou na escola, ele preferia estar em casa estudando, ou sentado neste lugar que você sentou com o celular nas mãos. Não é porque é meu filho, não tenho nada a reclamar, queixa sobre ele. Era um garoto ótimo e não saía de casa, apenas de casa para a escola e da escola para casa”. De acordo com a família do adolescente, não apenas o sonho dele foi interrompido, mas de todos eles. “O sonho dele era ser psicólogo, eu como pai e com as dificuldades financeiras falava para Mislan: hoje, não tenho condições de pagar seus estudos, mas, vamos dar um jeito. E ele me dizia: pai, nós vamos juntando aos poucos e colocamos uma banquinha para vender algumas coisas. O Mislan sempre pensava na realização dos seus sonhos. Eu como pai fica orgulhoso disso e inclusive já havia aberto uma poupança para ir juntando o dinheiro”, relembra seu Misael. Dona Jaciane, ainda emocionada conta que a família iria toda viajar para um momento de lazer na praia, no domingo (28) posterior ao acidente. “Infelizmente não chegamos a concretizar este dia em família”. Um dos professores do adolescente, Nivaldo de Souza Soares falou à reportagem que o menino era exemplar em tudo que fazia. “O Mislan era um aluno exemplar, um dos meus melhores alunos, fiquei em choque, não queria acreditar, ele era um aluno atencioso, doce, gostava de poesia, de fazer leitura, era amoroso e atencioso com os colegas e respeitava os professores, e isso foi muito triste, o que aconteceu, não dá para aceitar, era um menino sonhador. Sempre querendo aprender, só saía da sala de aula com o visto e infelizmente houve essa tragédia”. https://www.youtube.com/watch?v=_Nfyeh0egWU&t=2s “Queremos que isso não ocorra com as famílias” “Isso que aconteceu é um crime. Até o momento as autoridades não falaram nada, apenas dei meu depoimento, eu não estava na hora do acidente, mas testemunhas contam que o ônibus estava extremamente lotado. No meu depoimento, não tenho 100% de certeza, porque estava muito recente, mas falei que meu filho foi para escola por volta das 11h50 e umas 12h20 em média, um amigo me ligou para avisar do ocorrido – eu na hora disse: ‘meu amigo deixa de brincar com coisa de morte, ainda mais com filho’. Foi quando ele disse que não era brincadeira, então fui ao local às pressas e vi meu filho no chão já sem vida. Imagine a dor que foi, minha esposa não conseguiu ir, ficou com os vizinhos sendo consolada, passando mal”, conta Misael. O aposentado disse que nem no dia recebeu apoio por parte da prefeitura ou de autoridades de segurança. “Não tivemos apoio da prefeitura, mas confesso para você que não quero. O que peço é apenas que as autoridades investiguem e punam os verdadeiros responsáveis. E que eles [autoridades] que olhem essas crianças, está uma calamidade a cidade, ônibus lotados. Para não acontecer outra tragédia e outras famílias passem por isso”. LEMBRANÇAS Os pais de Mislan mostraram à reportagem da Tribuna Independente os pertences do filho, Misael, e disseram que ficarão guardados como recordação, já que não há fotos do adolescente, apenas quando era mais novo, porque ele não gostava de fotografar. “Nada sairá daqui. São recordações e vão ficar embaladas com todo cuidado”, falou o pai. Dona Jaciane pegou a flauta que o filho tocava e não conteve a emoção em lembrar das apresentações que ele fazia e premiações que recebia. “Era um menino tão estudioso. Na pandemia contratamos uma professora que dava aula de reforço a ele no horário da noite”, lembrou. CASO O estudante de 15 anos morreu depois de cair do ônibus escolar e ser atropelado na cidade de Joaquim Gomes, interior de Alagoas, no dia 25 de novembro de 2021. Segundo testemunhas, Mislan Odilon Lima dos Santos teria se encostado na porta do ônibus que estava quebrada e se abriu. O motorista teria alertado sobre o defeito no veículo. Ao cair, a vítima foi atropelada pelo próprio ônibus e morreu no local. A irmã mais nova dele também estava no ônibus e presenciou o acidente. O motorista deixou o local e foi direto para a delegacia da cidade, onde foi ouvido e liberado. MP/AL pede a denúncia de mais duas pessoas O Ministério Público Estadual de Alagoas (MP/AL) solicitou que, além do motorista José Anísio da Silva, que foi indiciado pela morte do estudante, fossem denunciados pelo crime também a secretária de educação da cidade, Neide Maria da Silva Lins, e Jadiel Trajano de Oliveira Júnior, responsável pela oficina da prefeitura municipal e pela manutenção em todos os carros da prefeitura, inclusive dos ônibus escolares de Joaquim Gomes. O delegado indiciou e cabe ao promotor decidir quem vai ser denunciado (acusado). O promotor Leonardo Novas Bastos entendeu que deveriam ser denunciadas (acusados) essas três pessoas. Para o MP/AL, houve negligência da secretária de educação, principalmente porque havia sido assinado um TAC onde houve o comprometimento de fazer uma vistoria em todos os ônibus. O que aparentemente não ocorreu, e se ocorreu não foi de forma devida. Durante as investigações, a perícia identificou que a porta foi colocada no modo emergência porque se encontrava com o dispositivo de abertura quebrado. Essa manobra de colocar no modo emergência deixou a porta vulnerável para abrir com qualquer toque. PREFEITURA A Prefeitura Municipal de Joaquim Gomes informou por meio de nota que vai aguardar o curso das investigações e os laudos da perícia para saber qual a real causa do acidente.Veja a nota divulgada no dia do ocorrido. “A Prefeitura Municipal de Joaquim Gomes, através do chefe do poder executivo, lamenta profundamente o falecimento do aluno da rede municipal de educação, Mislan Odilon Lima dos Santos, aluno do 9° ano C, da EMEB São José, vítima de um grave acidente, na manhã de hoje, com um ônibus escolar pertencente à frota municipal. O Prefeito Adriano Barros, neste momento de dor e consternação, manifesta o mais sincero sentimento de pesar, desejando força aos pais, familiares e amigos do jovem; colocando-se à disposição dos mesmos. Em tempo, decreta suspensas as aulas em toda rede municipal, na próxima sexta-feira (26), bem como luto oficial por três dias. A prefeitura entende que é prematuro apontar fatos. E irá aguardar o curso das investigações, laudos da perícia para saber qual a real causa deste triste acidente.” PROTESTO No dia 29 de novembro, um grupo de moradores da cidade realizou um protesto pedindo por justiça pela morte do garoto. Vestidos de branco e com cartazes, alunos da rede pública municipal de ensino caminharam até a prefeitura da cidade com apitos e gritos por justiça. Professores e a família do jovem também participaram do protesto. O ato também foi até a Câmara de Vereadores para chamar a atenção das autoridades para o sucateamento do transporte público na cidade.