Esportes

SAF no futebol: medida foi amplamente buscada pelos clubes em paralelo a adoção da recuperação judicial

Lei que regula o modelo é recente e tem tendência de crescimento no país

Por Assessoria 14/06/2024 10h37
SAF no futebol: medida foi amplamente buscada pelos clubes em paralelo a adoção da recuperação judicial
Victor Lages - advogado especialista em recuperação judicial - Foto: Divulgação

Dentro do futebol brasileiro está se criando um movimento de adesão às famosas SAFs, Sociedade Anônima de Futebol, que existe em forma de lei no Brasil desde 2021. Entre os clubes que aderiram ao modelo estão Botafogo, Cruzeiro e Vasco. No entanto, a adoção da SAF é mais do que uma mudança no nome da estrutura e gestão, que passa de associação civil sem fins lucrativos para uma gestão empresarial. Assim, há grandes alterações na forma de tributação, bem como normas de governança, controle e meios de financiamento para a atividade do futebol.

Segundo o advogado especialista em recuperação judicial, Victor Lages, em 2019, a Confederação Brasileira de Futebol concluiu que o segmento econômico ligado ao futebol era de 59,2 bilhões de reais, ou seja, representava 0,72% do PIB nacional. Por isso o setor tem relevância não só esportiva e de entretenimento, mas também social. “Mesmo com essa circulação de riquezas, historicamente vemos diversos clubes em situações de dificuldades financeiras, a exemplo do Cruzeiro, que por muito pouco não fechou as portas e foi o primeiro grande clube a constituir uma SAF e que teve ela revendida recentemente. Mas é importante deixar claro que SAF não é solução pra tudo”, ressalta.
Ainda segundo Victor Lages, a lei da SAF de 2021 foi um projeto abrasileirado onde foram adequados alguns pontos como a circulação de riquezas. Para o advogado, uma das particularidades mais importantes é a parte social, já que quando um clube cria uma SAF há responsabilidades sociais que são previstas pelo Programa de Desenvolvimento Esportivo dentro da legislação da SAF. Por exemplo, escolas municipais podem ter programas subsidiados pela SAF que irá exercer um papel social, incentivando a prática esportiva fomentada por ex-jogadores, oferecendo uma continuidade para uma carreira após a aposentadoria dos gramados.

Um dos principais pontos que fizeram os clubes procurarem sobre esse modelo diz respeito sobre as dívidas dos clubes, já que essa seria uma forma de tentar sair do vermelho. No entanto, as dívidas seguem com a associação civil, ou seja, não ficam sob a responsabilidade da empresa criada, sendo considerado um dos principais aspectos da mudança. A SAF terá de contribuir com o pagamento dessas obrigações e isso também ajuda nos desbloqueios judiciais dos ativos financeiros do clube, que poderiam estar travados por uma dívida.

“Hoje temos o Botafogo, Cruzeiro e Vasco na primeira divisão do campeonato brasileiro que aderiram à SAF. No entanto, todas elas foram utilizadas para pagar dívidas. Ainda não tivemos um caso de um clube saudável financeiramente que constituiu uma SAF no futebol brasileiro. Quando o clube tem recursos é mais fácil ter aporte para o objetivo final que é investir no esporte e não pagar dívida. Além disso, é importante salientar que a SAF pode ser uma solução para um clube e não ser para outro”, destaca o advogado.

Para tratar de endividamento, o clube-empresa pode buscar pela recuperação judicial, normalmente usada por empresas em situação financeira crítica e que tenham relevância econômica à sociedade, o que permitirá aos clubes-empresa renegociar dívidas com a mediação do poder público, para que os créditos sejam abatidos por descontos e pagos em novo prazo. A legislação possibilita também que o clube transfira contratos bilaterais e com jogadores da associação civil para o clube-empresa, sem que sejam envolvidos no acordo a ser negociado no decorrer da recuperação judicial.

De acordo com Victor Lages, existe uma discussão jurídica sobre a necessidade para um clube social pedir recuperação judicial de ter que constituir uma SAF. Para ele, essa seria uma necessidade para que não se crie um sistema híbrido, principalmente pela diferença de tributações de um clube-empresa para uma associação civil.

“Hoje já há um entendimento que se pode, sem a criação de SAF, fazer o pedido de recuperação judicial pelo clube social, como o próprio CSA fez. Também existe o Regime Centralizado de Execução, muito utilizado na Justiça do Trabalho, no qual se pega todas as dívidas trabalhistas do clube e se cria uma conta corrente com uma série de pagamentos, ou seja, não ficam credores individuais fazendo penhoras na conta do clube. Os contratos são bilaterais, onde na SAF irá mudar o contratante, já que não será mais com o clube social. Inclusive a SAF só terá responsabilidades trabalhistas nos contratos que ela firmar, algo que veio garantir uma segurança para o investidor”, explica.

Importante destacar que mesmo com uma SAF ativa o clube continua a existir, já que será criada uma pessoa jurídica nos moldes de Sociedade Anônima, mas que em sua estrutura societária o clube social precisa deter de pelo menos 1% do capital para que ele tenha uma ação de poder de controle para mudança de cor, de cidade e alguns poderes de veto. A diferença é que, dependendo da quantidade de ações que o investidor comprar, o clube passará a ter um dono.

Por fim, o advogado especialista aponta que a SAF é uma tendência que está amadurecendo, já que é uma atividade amplamente subsidiada e que movimenta muitos recursos. “Nós vemos que algumas deram certo e que outras passaram por problemas, como a do Vasco recentemente. É um instituto recente que vai ter a sua brasilidade e que terá seus riscos precificados pelo mercado. Como investidor, nem sempre o objetivo da SAF será título, mas sim ganhar dinheiro e atrair outros investidores. Por isso é preciso separar um pouco a paixão nesses casos”, finaliza.