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Ídolo do Real, atacante Raúl torcia para o Atlético de Madrid

Ex-camisa 7 era jogador colchonero até que o presidente Jesús Gil decidiu encerrar as categorias de base do clube

Por Globo Esporte 10/05/2017 10h35
Ídolo do Real, atacante Raúl torcia para o Atlético de Madrid
Reprodução - Foto: Assessoria

Cristiano Ronaldo ou Raúl González? A discussão - ou mesmo a dúvida - de quem seria o maior jogador do Real Madrid na história ainda está longe de ser resolvida. No entanto, se ela existe, é graças ao Atlético de Madrid, adversário da semifinal da Liga dos Campeões nesta quarta-feira (a partida, às 15h45, terá transmissão ao vivo da TV Globo, GloboEsporte.com e Globo Play). Isso mesmo. Antes de dar seus primeiros passos e brilhar no clube merengue, Raúl era a estrela na base do maior rival, uma máquina de fazer gols e, ainda por cima, era torcedor do Atleti, assim como toda sua família. Porém, durante uma grave crise econômica, os Colchoneros encerraram as atividades de parte das suas categorias inferiores e, precisando de um lugar para jogar, o ex-camisa 7 foi parar no Real Madrid, em 1992, logo após completar 15 anos.

Segundo conta o jornalista Alfredo Relaño, em artigo no jornal "As", da Espanha, o presidente do Atlético de Madrid na época, Jesús Gil, chegou a ir ao programa de televisão "Tan Contentos" em 1991 para falar dos feitos de seus jogadores nas categorias de base. Na ocasião, lá estava Raúl, apontado pelo mandatário como estrela do sub-15, sendo capitão da equipe e artilheiro, com 55 gols na temporada.

- Lembrem deste nome, ele será um fenômeno - disse Jesús Gil à apresentadora Consuelo Berlanga.

Raul González (à direita) durante programa de TV na Espanha: atacante era apontado como estrela do Atlético (Foto: Reprodução)

O término de algumas categorias da base do Atlético de Madrid é algo que, até hoje, não foi bem explicado e engolido pelos jogadores da época. Os custos para manter a estrutura não seriam tão altos como os salários e a contratação de um bom jogador e o retorno que um jovem talento poderia dar, certamente seria recompensador. Porém, com a decisão do presidente Jesús Gil, sobraram apenas os times juvenis e a equipe B do elenco profissional. Tote, que foi escolhido junto com Raúl para seguir ao Real Madrid, não trilhou o mesmo sucesso na carreira, atuando por Benfica, Valladolid, entre outros times, mas até hoje não se conformo com o fim da base colchonera.

- Não sei porque ele (Jesús Gil) fez isso. Era um gasto mínimo comparado com a contratação de um jogador. Acabaram com tudo da categoria Cadete (sub-16) para baixo. Deixou os três juvenis (sub-17, sub-18 e sub-19) e o Atlético de Madrid B. Uma pena muito grande, eu não queria sair de lá. Nos disseram que foi por pressuposto, mas tinha que ser mentira porque a base não custava muito. Me entristeceu bastante. Logo, me chamou uma pessoa, Paco de Gracia, e me disse que o Real Madrid me queria. Eu fui com Rául, o irmão de Alfredo Santaelena, Baena, um lateral esquerdo e Javier Rey, que era um dos melhores amigos de Raúl. Creio que éramos cinco os escolhidos - lembrou o ex-atacanteem entrevista à revista "Jot Down", em 2013.

No entanto, a história de glórias de Raúl no Real Madrid ainda assim esteve perto de ser diferente, novamente com o Atlético no caminho. Dois anos após chegar aos merengues e, atuando pelos juvenis, o atacante ficou fora de uma decisão da Copa da categoria e procurou o antigo clube com a intenção de assinar contrato. Porém, antes de formalizar o acordo, o técnico argentino Jorge Valdano, da equipe principal do Real, chamou Raúl para conversar e o convenceu a ficar, com a promessa de que ganharia chances entre os profissionais. Aos poucos, atuou em amistosos até que estreou contra o Zaragoza no dia 29 de outubro de 1994, na derrota por 3 a 2, fora de casa.

- O que Valdano fez foi algo que pouquíssmos se atreveriam a fazer: apostar em Raúl de verdade. Apostou porque confiava nele, porque via nele um jogador extraordinário. Isso é muito complicado. Muitos jogadores da base ficaram pelo caminho porque ninguém apostou neles. Muitas vezes quando um jogador chega ao time principal, ele diz que havia outros melhores do que ele na base. Isso aconteceu com o Xavi e Iniesta no Barcelona. O Raúl dizia que o melhor dessa geração era Álvaro Benito, mas as lesões o impediram de triunfar. Para que a história tivesse sido outra com o Raúl no Atlético, algum treinador deveria ter apostado firmemente nele naquele momento - afirma Miguel Angel Toribio, repórter da "Rádio Marca".

Daí para frente, a própria história conta o tamanho de Raúl para o Real Madrid: desde 1994, foram 15 temporadas na equipe profissional, com 741 partidas disputadas, 323 gols marcados e 16 títulos conquistados, sendo três Ligas dos Campeões, dois Mundiais e seis Campeonatos Espanhóis. Em 2010, deixou o clube e atuou ainda por Schalke 04, Al-Sadd e New York Cosmos.

O primeiro gol: justamente contra o Atlético de Madrid

A relação de Raúl com o Atlético de Madrid revela mais uma coincidência. O primeiro gol pelos profissionais do Real aconteceu justamente contra seu ex-clube. Uma semana depois de sua estreia contra o Zaragoza, no dia 5 de novembro de 1994, o atacante jogou pela primeira vez no Santiago Bernabéu. Foi titular, sofreu um pênalti, deu assistência para Zamorano e marcou o terceiro gol da equipe na vitória por 4 a 2, saindo de campo ovacionado aos 15 minutos do segundo tempo. Por isso, talvez, o próprio considere este gol o mais especial de sua carreira.

- Eu escolheria o primeiro no Bernabéu, que é com o que sempre sonhei. Embora sempre tenha dito que os gols importantes são os que a equipe marca e todas as alegrias que levam a atingir todos os objetivos de uma temporada - disse Raúl em uma entrevista com seguidores em sua conta no Facebook, em 2016.

E, apesar da forte identificação com o Real Madrid, parece que ainda há um pouco de torcida de Raúl pelo Atlético de Madrid. Ainda no ano passado, o ex-jogador lembrou que assistiu a decisão de 2015 no San Siro e admitiu que gostaria de ver os colchoneros conquistarem a Liga dos Campeões. No entanto, ele só não devia imaginar novamente os merengues no caminho, como na semifinal desta temporada.

- Estive em Milão e me alegrou muito pelo décimo-primeiro (título do Real Madrid), mas também desejo que o Atlético possa voltar a outra final e que possam conquistar (a Liga dos Campeões).

Ídolo no Real, mas apenas "importante" para a Espanha

É claro que a história de Raúl no Atlético de Madrid poderia ter sido tão grandiosa como foi no Real Madrid, afinal, Raúl foi um jogador de exceção. Porém, na visão do jornalista Fernando Kallás, editor do jornal "As", da Espanha, as coisas deram certo pelo encaixe dos fatos. Para ele, o ex-camisa 7 precisava do Real. E os "galácticos" tinham que ter um Raúl no time.

- Pode me chamar de romântico ou idealista, mas acho que há coisas que não acontecem por acaso. Acho que o Raúl nasceu para jogar no Real Madrid. Não acredito em casualidade. Acho que estava escrito, esse cara nasceu para jogar no Real Madrid, e a carreira dele diz isso. Ele foi o equilíbrio espanhol, a identidade espanhola, no meio daquele vestiário galáctico. Para a torcida era importante ter uma referência espanhola no time, que tinha vários brasileiros e outros gringos. O líder ali sempre foi o Raúl. Sinceramente, não consigo imaginar o que teria acontecido se o Raúl tivesse ficado no Atlético de Madrid, porque ele nasceu para brilhar no Real Madrid.

Além disso, Raúl jamais conquistou os torcedores espanhóis como os do Real Madrid, especificamente. Pela seleção da Espanha, ele disputou 113 partidas, marcando 47 gols, porém, sem conquistar títulos. Assim, ficou uma lacuna em sua carreira que não o tornou uma unanimidade.

- A importância do Raúl no futebol espanhol é mais ligada à importância dele no Real Madrid. Ele é uma espécie de Zico no Brasil. Muita gente o questiona por não ter ganhado nada na seleção. E a geração que veio logo depois dele é a maior geração da história do futebol espanhol. Tenho certeza que a imagem do Raúl sempre será ligada muito mais ao Real Madrid - afirmou Kallás.