Esportes

Colombianos lotam estádio e se unem à Chapecoense para sempre

A ambição, as rivalidades, as indiferenças, as paixões futebolísticas foram deixadas de lado pelo povo de Medellín

Por Gazeta Esportiva 30/11/2016 22h59
Colombianos lotam estádio e se unem à Chapecoense para sempre
Reprodução - Foto: Assessoria

A queda do avião que levava a equipe da Chapecoense para disputa do primeiro jogo da final da Copa Sul-americana acabou com o sonho não só de um time como de uma cidade inteira e, por fim, chocou o mundo em uma das maiores tragédias da história do esporte. Nem por isso o estádio Atanasio Girardot não acendeu seus refletores e teve suas arquibancadas tomadas por quem pôde se fazer presente, já que muitos, sem espaço, tomaram as ruas em massa nos arredores do local. Às 18h45 (horário de Medellín, 21h45 de Brasília), porém, ao invés da bola rolar, deu-se início a uma celebração de homenagem aos 71 mortos no acidente que ocorrera tão perto dali. A Colômbia mais uma vez parou para celebrar o futebol que tanto venera, mas, na noite desta quarta, não por causa de um gol ou para ter uma taça, e sim por solidariedade, respeito e compreensão.

A ambição, as rivalidades, as indiferenças, as paixões futebolísticas foram deixadas de lado pelo povo de Medellín. O semblante de todos era de tristeza. As pessoas, uniformemente de branco, faziam suas homenagens individuais ou de forma coletiva. Não foram poucas as faixas e cartazes em referência à Chapecoense e seus torcedores: “Uma nova família nasce”; “Futebol não tem fronteiras. Força a família, torcida e ao povo Chapecoense”; “Estamos contigo, Chape”; “Todos somos Chape”; “Equipe imortal. Campeões para sempre”; “Se foram como lendas”, diziam algumas delas.

Velas foram acesas por muitos torcedores e deixaram o cenário mais bonito e reflexivo. Nesse momento, o exército colombiano rondou o gramado com as bandeiras de todas as nacionalidades que perderam pessoas no acidente. Em seguida, os atletas do Atlético Nacional apareceram no gramado sem chuteiras, mas com flores nas mãos. E após os soldados executarem os hinos da Colômbia e do Brasil, o estádio ganhou novamente ares de uma partida de futebol com os gritos inflamados de “Vamos vamos, Chape”.

A homenagem seguiu com discursos inflamados e emocionantes de autoridades locais, além de pessoas que puderam representar a dor e o sentimento que aflige a tantos. José Serra, ministro de relações exteriores do Brasil, foi às lágrimas e tocou o público com sua manifestação ao microfone para um estádio quieto e atento.

“De coração, muito obrigado. Nesse momento de grande tristeza para as famílias, para todos nós, as expressões de solidariedade que aqui encontramos, como a solidariedade que trás cada um de vocês, colombianos e torcedores do Atlético, ao estadio é um consolo imenso, uma luz quando todos estamos tentando entender o incompreensível. Os brasileiros jamais esquecerão a forma como os colombianos sentiram algo como esse terrível desastre, que interrompeu o sonho desse heróico time da Chapecoense, em uma espécie de condo de fadas com final trágico, assim como não esqueceremos a atitude do Atlético Nacional e de todos os torcedores que pediram que o título de campão da Copa Sul-americana fosse concedido à Chapecoense. Um gesto de honra ao esporte, um esporte de qualquer lugar, que honra a cidade de Medellín e que faz ainda maior as glórias do Atlético de Medellín”, falou Serra, ovacionado e com os olhos repletos de lágrimas.

“Depois do ocorrido na fatídica noite de terça, o Brasil acordou para uma realidade de uma festa que não existiu, de um jogo que não pôde ser realizado. Que as cores da Chapecoense, assim como do Atlético, sejam verde e branco, de esperança e paz”, continuou o ex-governador do Estado de São Paulo. “Mas além da tragédia que vitimou os jornalistas e membros da tripulação, as inúmeras manifestações são testemunhos da nobreza do esporte como canalizador dos melhores sentimentos humanos e como ferramente de tolerância para construir um mundo melhor. Muito obrigado, Colômbia, muito obrigado Medellín, muito obrigado Atlético, e a todos que aqui estão. A todos vocês, um abraço pessoal muito apertado. E dizer sobre a emoção de ouvir o hino que vocês fizeram questão de tocar aqui, quero dizer que em toda minha vida nunca tive uma emoção semelhante”, concluiu José Serra.

Já na parte final da homenagem que durou cerca de 1h45, crianças entraram em campo uniformizadas com as vestimentas de Atlético Nacional e Chapecoense e soltaram 71 balões em homenagem a cada pessoa morta depois da queda do avião contratado pelo clube catarinense. E quando o casal que coordenou a cerimônia desta quarta cantou nome por nome de todos os vitimados, o público atirou ao gramado todas as flores que tinham em mãos. Mais flores caíram dos céus com a ajuda de um helicóptero em meio a leitura de uma carta enviada pelo Papa Francisco e, de novo, o público deu o tom com aplausos efusivos, que se estenderam quando um dirigente da Chape subiu ao palco para receber uma placa dedicatória.

Os instrumentos da orquestra filarmônica de Medellín só não finalizaram a histórica homenagem no estádio Atanasio Girardot porque os tradicionais tambores da torcida do Atlético Nacional entraram em ação e convocaram o cântico de “Vamos vamos, Chape”, entoados ainda mais alto pela última vez, pelo menos nesta quarta, pois fica claro que a ligação entre a instituição colombiana, uma das maiores do continente e fundada em 1947, estará para sempre vinculada ao modesto time de Chapecó, criado em 1973, mas que jamais será esquecido e foi simbolizado em uma frase estampada em uma das camisas criadas pelo Nacional: “Nada nos separa mais”.