Economia

Consumidores têm decisões favoráveis contra 123 Milhas

Agência de viagens on-line anunciou suspensão de passagens da sua linha promocional já compradas e pagas à empresa

Por Valdete Calheiros - colaboradora com Tribuna Independente 24/08/2023 15h43
Consumidores têm decisões favoráveis contra 123 Milhas
Decisões judiciais já estão sendo deferidas em favor dos passageiros lesados com a suspensão das passagens - Foto: Imagem ilustrativa

A quantidade de ações judiciais impetradas pelos consumidores contra a empresa 123 Milhas cresce na mesma proporção que a quantidade de viagens aéreas canceladas pela mesma em todo o país. Decisões judiciais, em caráter liminar, já estão sendo deferidas em favor dos milhares de passageiros lesados com o anúncio, repentino, da empresa sobre a suspensão de pacotes e emissão de passagens da sua linha promocional.

Um dos passageiros que ganhou na Justiça o direito de ter suas passagens emitidas é o programador Pedro Ivo Rocha Euzébio. A 123 Milhas tem até a próxima quarta-feira (30) para garantir que as passagens compradas sejam concretizadas. O investimento do programador foi de quase R$ 7 mil. Ele comprou as passagens dos filhos menores de idade com bastante antecedência para que a família se reencontrasse. Desde o ano passado, Pedro Ivo está morando em Portugal. A viagem seria em novembro.

“Claro que o prejuízo financeiro conta. Mas não é esse o maior problema. Era um reencontro familiar. E a empresa adiou um abraço entre um pai e seus filhos menores de idade. Adiou sem data nenhuma prevista. No mínimo, precisam arcar com a responsabilidade”, reclamou.

Essa não foi a única decisão proferida em benefício de consumidores alagoanos. Houve uma outra decisão a favor de um casal com viagem comprada para a Argentina.

Na decisão, o juiz Maurício Breda, da 13ª Vara Cível de Maceió, explicou que a empresa deve arcar com o ônus do risco da atividade. Ainda de acordo com o juiz, a 123 Milhas deveria deixar claro aos seus contratantes sobre os riscos das compras.

“É necessário salientar que os artigos 30 e 31 do Código de Defesa do Consumidor enunciam que toda informação ou publicidade, veiculada por qualquer meio de comunicação, deverá apresentar informações claras e precisas e integrar o contrato que vier a ser celebrado, obrigando o fornecedor a cumprir a oferta”, reforçou o magistrado.

Em ambas as decisões, a 123 Milhas está sujeita a multa de R$ 500 por dia, até o limite de R$ 30 mil, caso não emita os bilhetes aéreos.

Advogada: cláusula em contrato é abusiva e fere direito do cliente

advogada Gabriela Soares chamou a atenção para o fato de que a 123 Milhas apresentou em sua justificativa que havia previsão no contrato para que o mesmo fosse rescindido unilateralmente, ou seja, independente da concordância do consumidor.

“Essa cláusula é considerada uma cláusula abusiva e fere expressamente o artigo 51, inciso XIII do Código de Defesa do Consumidor. É uma cláusula considerada nula, sem aplicação prática dentro de um processo judicial”, explicou a advogada.

Ainda segundo Gabriela Soares, a legislação prevê que, em caso de descumprimento de oferta do fornecedor, é o consumidor quem deve escolher a melhor opção que o atenda. Por isso, a proposta apresentada pela empresa, a emissão de voucher ou crédito na plataforma, fere o que determina o Código de Defesa do Consumidor.

As pessoas que viajam não têm apenas, destacou a advogada, a despesa propriamente dita da passagem aérea. “Há todo um planejamento, com custos pertinentes a uma viagem como hotéis, ingressos de shows. Cabe, então, o consumidor juntar essas notas para incorporar ao seu processo. Além dos gastos materiais, há também os danos morais causados pelo dissabor gerado a partir do descumprimento da 123 Milhas”, esclareceu Gabriela Sorares.
Além de estar na mira da Justiça, o Ministério do Turismo e o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) irão investigar os cancelamentos de pacotes turísticos da agência de viagens 123 Milhas.

A estudante de Medicina Marina Mendonça, 18 anos, está prestes a reclamar seus direitos também na Justiça. Acreditando em um posicionamento, no mínimo respeitoso por parte da empresa, a universitária esperou até então. De viagem marcada para o final do ano com o namorado e toda sua família paterna, Marina fez outros investimentos financeiros ao comprar, entre outros itens, roupas para a viagem. “Difícil a gente lidar com a quebra das nossas expectativas devido a uma empresa que agiu de forma irresponsável. Estava tudo programado e com bastante antecedência”.

Caso acende alerta para outros problemas do serviço de turismo, diz Abav

O presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav/AL), Samuel Silva destacou que o caso da empresa 123 Milhas, na verdade, acende o alerta para outros problemas que envolvem os serviços de turismo. “Às vezes, alguns consumidores estão preocupados apenas com o preço. Sem se preocupar com a qualidade. Um dos primeiros passos é checar se a empresa tem credenciamento no Ministério do Turismo, no Cadastur. A 123 Milhas tinha. No entanto, diante de toda essa situação o Ministério do Turismo já anunciou o descredenciamento da empresa”, alertou.

RECLAME AQUI

Nos últimos seis meses, a 123 Milhas recebeu 20.135 reclamações apenas no site Reclame Aqui. Do total de reclamações, quase mil aconteceram nos últimos dias. Os consumidores deram nota 7.7 à empresa.

A demanda dos consumidores é tanta que o Procon Maceió divulgou uma série de orientações aos consumidores que tiveram suas passagens canceladas.
Segundo o órgão, o primeiro passo para o consumidor que teve sua passagem ou pacote de viagens suspenso é acionar o Procon Maceió, em um dos seus polos de atendimento ou por meio do WhatsApp (82) 98882-8326, com os documentos pessoais e os comprovantes da compra (e-mails, prints, protocolos, comprovantes de pagamento).

Inicialmente, o registro é feito para busca da solução, dentro de um prazo de 10 dias, escolhida pelo próprio consumidor, podendo ser reembolso do valor, crédito na plataforma, estorno em cartão de crédito, remarcação da viagem e passagem.

De acordo com o Procon, caso não haja solução no período de 10 dias, é agendada uma audiência de conciliação para até 30 dias, buscando atender ao pedido escolhido pelo consumidor.

Por fim, caso não seja promovido acordo entre o consumidor e a empresa, o reclamante terá todo o registro da tentativa administrativa de solução do conflito documentado, sendo orientado a buscar a justiça para obter a reparação de danos materiais e morais, pela frustração de expectativa e prática abusiva. Além disso, o processo administrativo segue no Procon Maceió, considerando a aplicação de multa e a suspensão de serviços.

123 MILHAS

Em suas redes sociais, a 123 milhas afirmou que “devido a circunstâncias à nossa vontade, a linha promo está suspensa para comercialização e as passagens com embarque previsto para setembro a dezembro de 2023 não serão emitidas. Lamentamos profundamente esta situação e traçamos um plano para minimizar o impacto desta ação”.