Economia

Cesta básica já representa mais da metade do salário mínimo

Saída encontrada por consumidor alagoano tem sido diminuir outros custos ou optar por produtos de menor qualidade

Por Tribuna Independente 13/08/2022 09h23
Cesta básica já representa mais da metade do salário mínimo
Alimentos têm sido uma das maiores despesas e comprometem metade da renda do consumidor alagoano - Foto: Edilson Omena

Com uma inflação de 15%, os alimentos têm sido uma das maiores despesas e responsável por comprometer mais da metade da renda do alagoano. Os consumidores têm recorrido a alternativas como mudar marcas e até deixar de comprar alguns itens para garantir comida na mesa. Segundo o economista Cícero Péricles, em Alagoas, o valor médio da cesta básica fica entre 600 e 700 reais e influencia em outros aspectos da vida das famílias.

“Temos duas boas e confiáveis fontes para saber quanto estão custando os alimentos. A primeira e mais conhecida é a pesquisa mensal do Dieese, o Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos, que, desde 1959, calcula o valor da cesta básica. No levantamento mais recente, agora em julho, o preço da cesta básica, nas capitais nordestinas, alcançava, em média, 630 reais, ou seja, mais da metade de um salário mínimo. Esse valor representa uma variação de 12% nos sete primários meses do ano e, aproximadamente 20% acumulado nos últimos 12 meses. O outro indicador é a cesta básica calculada pela Abras, Associação Brasileira de Supermercados. Para o mês de julho, no Nordeste, o valor ficou em R$ 692, um valor médio pouco mais alto que o do Dieese. Esses dois levantamentos coincidem com os dados do IBGE que revelam um aumento de 15% na inflação de alimentos no acumulado de 12 meses, ou seja, o dobro da inflação geral”, detalha o economista.

A professora Telma Oliveira explica que a cada mês os preços dos itens básicos tem comprometido mais a renda da família. Ela tem buscado opções mais baratas e até de menor qualidade para garantir a quantidade necessária no mês. “Fui hoje ao supermercado, saí com seis itens básicos e paguei mais de R$ 30 isso porque escolhi as marcas mais baratas. Quando é mistura, chega a ser absurdo o quanto o preço tem aumentado. Realmente tem sido muito difícil, a gente tem que fazer uma verdadeira ginástica para comprar o que precisamos, mas sempre deixamos itens de fora da lista. Não dá para comprar tudo”.

Os alimentos são itens indispensáveis, por isso, a saída encontrada muitas vezes é reduzir o consumo de outros gastos. Mesmo assim, o endividamento tem sido recorde: 78% dos brasileiros estão na situação.

“Existem muitos estudos sobre a relação entre preço e consumo. Os alimentos são itens obrigatórios no consumo geral. No primeiro momento da redução de renda familiar, os consumidores trocam os produtos de marcas melhores e mais caras por outras populares, buscando preços menores; no segundo momento substituem alguns produtos mais caros por similares, a exemplo de carne de boi por frango, manteiga por margarina, etc., mudando, também o lugar de compra. No terceiro momento, restringem gastos com outras despesas da família e diminuem os volumes adquiridos. Os gastos básicos com alimentos, assim como a energia, remédios, transporte, explicam parte do endividamento que alcançou, agora no mês de julho, 78% dos consumidores brasileiros, um número recorde, segundo a Confederação Nacional do Comércio. No caso alagoano, é mais grave porque nossa renda é menor que a média nacional, na medida em que 82% das famílias recebem até dois salários mínimos e o peso da alimentação leva parte substancial dessa renda”, diz o economista.

O efeito da alta dos combustíveis, principalmente o Diesel, era até então um dos principais fatores para a elevação dos preços dos alimentos. Com as reduções observadas desde julho, entretanto, o cenário não se alterou. Segundo Cícero Péricles, o comportamento da economia demonstra que não haverá influência nos preços.

“A queda nos preços combustíveis, principalmente o da gasolina e diesel, é o principal responsável pela deflação, a queda dos preços, no mês de julho, e deve segurar a inflação em patamares menores nos próximos meses; mas, não se pode afirmar até quando. Na expectativa de que os preços dos alimentos acompanhem automaticamente a redução dos combustíveis, seguramente não. Como estamos vendo, os preços dos alimentos continuaram a subir, mesmo no mês de julho e agosto. A lógica da redução da gasolina, etanol e diesel é uma; a redução de alimentos, naturais ou industrializados, é outra”, pontua.

Na prática, diversos fatores estão relacionados ao aumento do preço dos alimentos, desde os fatores climáticos, produtivos até importações.

“Os alimentos sobem porque existe sazonalidade, com períodos de colheita e plantio, de safra e entressafra, com preços subindo na entressafra; existem os fatores climáticos, como geada, chuva e seca, que atrapalham a produção nas regiões e estados brasileiros; existem os custos mais altos com insumos importados, máquinas, equipamentos e matérias primas; e existem as exportações nacionais dos produtos agrícolas em larga escala, que transmitem os preços altos em dólar para o mercado interno. Os combustíveis são diferentes. Eles dependem do preço do barril do petróleo e do valor do dólar. Se estes dois sobem, os importadores de petróleo e derivados aumentam seus preços; as refinarias também têm suas margens de lucros, as distribuidoras ganham a sua parte, assim como os postos de gasolina; e existe outro elo dessa cadeia, a tributação, os impostos federais e estaduais. A queda atual de preços, que assistimos agora, é resultado de uma combinação – temporária – da redução na cobrança de impostos, tanto da alíquota estadual, ou seja, o percentual a ser cobrado de ICMS, como de impostos federais, o Cofins e o Cide, como da redução nas refinarias, pela Petrobras. Esse mecanismo não pode ser utilizado para reduzir os preços dos produtos alimentares”, descreve.

Perda do poder de compra intensifica desigualdades


Na avaliação do economista Lucas de Barros, a perda do poder de compra influencia diretamente na qualidade de vida das famílias. Ele explica que apesar das tentativas de economizar na hora das compras do supermercado, por exemplo, alguns itens são indispensáveis e vão ser consumidos mesmo com o preço mais alto. É o caso da energia elétrica, gás de cozinha e alimentos.

“O aumento da inflação prejudica o orçamento familiar pois os preços dos bens de consumo são atualizados com uma frequência bem mais rápida que os salários, que é o preço da mão de obra do trabalhador. As famílias passam a sentir isso especialmente quando vão fazer às compras e voltam para casa a cada mês com o carrinho mais vazio. Porém, não é apenas o aumento dos alimentos que fazem isso, o orçamento familiar é limitado pela renda da família e alguns itens as famílias por muitas vezes não conseguem fazer grandes economias e precisam continuar pagando, como é o caso do transporte, do gás de cozinha, da energia elétrica, da água, do aluguel e da alimentação. Quando esses itens aumentam de preço e o salário não muda, a qualidade de vida diminuiu. E já vivemos em um país extremamente desigual, a inflação aprofunda essa desigualdade”, detalha.