Economia

Aversão a risco global empurra dólar para perto de R$5,60

Dólar à vista saltou 2,18%, a 5,5876 reais na venda

Por Reuters 23/09/2020 19h34
Aversão a risco global empurra dólar para perto de R$5,60
Reprodução - Foto: Assessoria
O dólar disparou nesta quarta-feira, não apenas rompendo a resistência técnica de 5,50 reais como passando a flertar com 5,60 reais, num dia de fortalecimento generalizado do dólar em meio a temores sobre a economia global. O movimento no câmbio doméstico teve como pano de fundo preocupações com o cenário para o fluxo cambial, a despeito de números positivos das contas externas, e recorrentes receios sobre a trajetória fiscal do país --ambos num contexto de juro não atrativo. O dólar à vista saltou 2,18%, a 5,5876 reais na venda, quarta alta consecutiva e maior patamar de fechamento desde 26 de agosto (5,6124 reais). Na máxima, a cotação bateu 5,595 reais, alta de 2,32%. O Banco Central não interveio no mercado com venda de dólares. A última vez que o BC atuou de maneira mais incisiva no câmbio foi na segunda quinzena de agosto, quando o dólar oscilava perto dos atuais patamares. “O que tenho dificuldade de entender é a torcida do Banco Central para o câmbio se estabilizar ao invés de subir uma barreira em algum preço, uma vez que ele já está contaminando a inflação e isso pode tirar o carro dos trilhos”, comentou Luiz Fernando Alves, sócio do Fundo Versa. A quarta-feira foi marcada por ampla aversão a risco no mundo, depois de dados nos EUA e na Europa denunciarem desaceleração expressiva no crescimento da atividade empresarial, que vem num momento em que o salto em casos de Covid-19 em algumas importantes economias e a percepção de escassez de opções de ajuda por parte de bancos centrais nublam o cenário para a economia global. O índice do dólar frente a uma cesta de moedas saltava 0,4% no fim da tarde, batendo máximas em dois meses, com ampla liquidação de divisas emergentes. O real teve o segundo pior desempenho mundial nesta sessão, com a lista de perdas encabeçada por peso mexicano, que sofria um tombo de 3%. A onda de risco no exterior afeta o câmbio doméstico num momento de fragilidade no campo fiscal, e o cenário para o próximo trimestre deverá seguir sendo de alta volatilidade, avalia o Barclays, que vê o câmbio com desempenho inferior a seus pares até dezembro. Mesmo depois de alguma trégua no começo de 2021, analistas do banco projetam que o real voltará a sofrer com as incertezas locais. “Esperamos que o otimismo do mercado então se esvaia até o fim do ano (de 2021), à medida que a agenda política se tornar mais influenciada pelas eleições de 2022 (no Brasil) e preocupações com sustentabilidade da dívida, limite de gastos, etc provavelmente ressurjam”, disseram os analistas. Alguns profissionais do mercado destacam ainda que o câmbio será pressionado até o fim deste ano também por compras de bilhões de dólares por parte de bancos para ajustes relacionados ao “overhedge”, que passou a ser tributado pelo governo. A disparada do dólar nesta sessão ocorreu a despeito de dados melhores das contas externas. O Brasil registrou superávit em transações correntes pelo quinto mês seguido em agosto, levando o déficit em 12 meses ao menor patamar desde junho de 2018. Números melhores nas contas externas em tese significam fundamentos mais robustos e menor pressão do lado de oferta de moeda, mas o câmbio contratado segue exibindo fortes saídas de recursos, especialmente na conta financeira --por onde passam fluxos para portfólio, empréstimos, remessas, entre outros. Apenas na semana passada, o país perdeu na conta financeira 2,880 bilhões de dólares, elevando o déficit em setembro para 3,066 bilhões de dólares. No ano, o rombo chega a impressionantes 50,714 bilhões de dólares. “Uma performance melhor do real depende bastante da diminuição de saídas pelo segmento financeiro”, disse Sergio Goldenstein, consultor independente e estrategista na Omninvest Independent Insights e ex-chefe do Departamento de Operações de Mercado Aberto do Banco Central. Outros mercados brasileiros sentiram o baque da fuga de risco. As taxas de juros de longo prazo negociadas na B3 tiveram um rali de mais de 10 pontos-base, e o principal índice das ações brasileiras caiu 1,5%, indo abaixo de 96 mil pontos, segundo dados preliminares.