Economia

Plantando inovação, colhendo sucesso

Empresários andam na contramão da crise ao apostar em diferenciais para alavancar negócios e como resultado ganharam reconhecimento nacional

Por Evellyn Pimentel e Lucas França com Tribuna Independente 27/05/2018 13h55
Plantando inovação, colhendo sucesso
Reprodução - Foto: Assessoria
Com a aplicação de ideias inovadoras, empresas alagoanas têm feito o dito popular “a gosto do freguês” ir além quando o assunto é estratégia de mercado. Usando soluções criativas e muito esforço eles andam na contramão da crise e alçam voos altos. Uma pesquisa feita pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo (Sebrae-SP), aponta que o uso da inovação é uma realidade para 75% das empresas de pequeno porte de todo o país. A assessora técnica da diretoria do Sebrae Alagoas, Sandra Vilela, explica que as empresas que têm se destacado no mercado atualmente são aquelas que conseguem atender o cliente bem e ir além: “elas surpreendem”. “O mercado está esperando ser surpreendido. Não é apenas atender a necessidade do cliente. À medida que a empresa vai amadurecendo ela vai se diferenciando no mercado”, explica Vilela. E se estamos falando de inovação em terras alagoanas, não há como deixar de fora o conhecido Sanduba do Careca. Os conterrâneos podem até nunca ter comido um sanduíche, ou algum produto da empresa, mas com certeza já ouviram falar da irreverente marca. O fundador e garoto propaganda é Thiago Casado Lima França Careca, que de tanto sucesso e amor pelo que faz incorporou o apelido no registro civil em 2016. A empresa existe desde 2003, mas no início as coisas eram bem difíceis. Quem observa o sucesso da marca, que já tem 11 franquias espalhadas pelo Nordeste, chegando até em Orlando, nos Estados Unidos, não imagina a quantidade de apertos e dificuldades enfrentadas nos 15 anos de existência do empreendimento. “No início eu ficava na chapa, ela [esposa] ficava no balcão e nas mesas atendendo e tinha um colaborador. Não tinha moto, fazia entrega de bicicleta. Um ano depois eu comprei uma Biz e começamos a atingir outros bairros e devargazinho a gente foi conquistando o mercado. A gente montou uma filial no Aldebaran, mas não deu certo, tivemos que fechar, ficamos devendo... E passamos três anos no sufoco, porque não tínhamos capital para investir. As pessoas pediam refrigerante, aí não tinha, eu corria no posto e comprava. Pediam um sanduíche de carne, aí a pessoa pagava e eu pegava o dinheiro e ia no supermercado comprar a carne e voltava para preparar. E passamos três anos e meio assim, numa situação danada, aí foi quando a gente aprendeu a dar valor ao dinheiro”, relata. Com tantas dificuldades, eles resolveram analisar no que estavam errando. Então três anos depois, ele e a esposa, Isabela, resolveram incrementar a proposta da empresa incorporando uma estratégia diferenciada para lanchonetes até então. “Isabela disse que deveríamos alugar outro ponto. Hoje eu penso assim, que quando a gente monta um negócio e não deu certo, é preciso dar uma cara nova. Aí pegamos esse ponto [atual] que não era do tamanho que é hoje. Vendi a moto, de novo, peguei um empréstimo pessoa física porque na época não tinha empresa aberta, era tudo clandestino. Passamos seis anos com a empresa aberta tudo clandestino. Aí pegamos o empréstimo no nome da Isabela e passamos a visar o cliente. Aí a gente contratou um arquiteto. Hoje eu falo sempre que o seu negócio tem que ter um ambiente diferente, qualidade e um bom atendimento. A margem diminui, mas com o tempo você percebe que passa a ganhar mais do que ganhava antes”, explica o empreendedor que não esconde a satisfação de ter o trabalho e o apoio da mulher. Inovação é a marca registrada do empreendimento. Ele afirma que as pessoas precisam ampliar a visão para os negócios. “Eu comecei a investir no produto, atendimento, no cliente, no colaborador, que é importante também. Comecei com um colaborador, hoje tem 144. Também temos a maionese, que não é ideia nossa, mas criamos nosso sabor e agora ela vai ser produzida industrialmente em Arapiraca e comercializada nos supermercados”. Outro método considerado inovador é o tratamento com os funcionários. “Todos os meus colaboradores têm participação no faturamento, o que nenhuma lanchonete em Maceió tem. Então ele tem uma preocupação maior com o cliente, vem trabalhar com mais satisfação”. Além de destaque nas redes sociais, onde há uma interação forte com o público. Careca também faz palestras voltadas ao empreendedorismo. São quase 150 até agora. Ele também recebeu prêmio estadual e uma comenda da Câmara Municipal de Maceió. A receita do sucesso, segundo ele,  além de muita maionese, são punhados de paciência, boas doses de sensibilidade com os clientes e amor a gosto. “Primeiro é paciência, todo mundo deve ouvir isso, paciência, persistência. Se eu tivesse desistido estava lascado, pensei, mas só não desisti por causa da minha esposa. Hoje você monta um negócio e quer logo ver o dinheiro. Passa pouco tempo e já quer mudar o patamar de vida, se empolga. Mas o cara tem que fazer com calma. Vendi as 11 franquias, mas não tirei um real para comprar algo, está tudo investido. Outra coisa é que não adianta você fazer o que não gosta. Muita gente abre uma pastelaria porque alguém abriu e tá ganhando dinheiro, mas a pessoa não gosta de fazer pastel. Aí é onde está o problema”, diz. [caption id="attachment_103600" align="aligncenter" width="400"] Empresa de Thiago Pereira recebeu prêmios pelas ideias inovadoras (Foto: Sandro Lima)[/caption]  Foco no cliente é arma para se manter Pode soar como clichê, mas inovar é preciso. A inovação é uma das armas para enfrentar as épocas de desaceleração e crise econômica. Seja em um negócio já consolidado no mercado ou em um novo empreendimento. E foi assim que Thiago Pereira construiu sua carreira e marca no mercado alagoano. De acordo com ele, boas estratégias de inovação aumentam as vendas e fidelizam clientes. “Não encare a crise como algo ruim e sim como uma oportunidade de se reinventar ou criar algo novo”, fala o empresário. Thiago Pereira é dono da Central das Impressoras - empresa especializada em manutenção e locação de impressoras, recarga de toner, tinta. Para Thiago, uma marca só conquista relevância no mercado quando é capaz de oferecer algo que leve os consumidores a buscarem o produto ao invés da concorrência. No entanto, o empreendedor afirma que inovar não é apenas lançar um novo produto ou serviço e sim melhorar seus processos de criação e adotar medidas que atraiam os consumidores. “Uma receita de cada empreendedor”, conta. O empresário afirma que desde o início precisou empreender esforço no projeto. “Completamos 10 anos de existência em agosto de 2017. Desde o início foi muito trabalho, comecei a empresa apenas com um colaborador, em um local super pequeno, sem estrutura alguma para funcionar, mas não me importei com isso e fui em frente com a ajuda desse colaborador\amigo. Fui além porque sabia que o mercado alagoano era carente de uma empresa nesse setor que oferecesse produtos e serviços com alto grau de qualidade e agilidade e por isso foquei no trabalho, no início era eu para fazer tudo, visitas a clientes, coleta e entrega de equipamentos, ligações para os clientes, faturamento de vendas, cobranças e muito mais. Mas, do meu lado tinha um jovem colaborador incansável, muito tímido no início, mas incansável, muito preparado tecnicamente, essa pessoa trabalha comigo até hoje. Estou falando de Antônio Pontes,  ou simplesmente Tonho, que em nenhum momento desistiu e acreditou nesse sonho junto comigo. Gente, o cara é bom no que faz e isso fez com que meu trabalho abrilhantasse cada vez mais e que meus clientes ficassem cada vez mais satisfeitos com a forma de atendimento”, explica Thiago. Com o crescimento da empresa ele conta que precisou contratar outras pessoas rapidamente e com três meses precisou mudar de endereço. Em 2009, o empresário iniciou um processo de Gestão de Excelência. [caption id="attachment_103602" align="aligncenter" width="267"] Atendimento personalizado ao cliente foi uma das apostas (Foto: Sandro Lima)[/caption] Cinco prêmios em dez anos A empresa de Thiago deu tão certo após as mudanças que, segundo ele, é uma receita particular que é modelo para o país inteiro. “Como empresário e empreendedor fico muito orgulhoso em saber que meu trabalho está no caminho certo, são anos de muita dedicação e muito empenho para fazer com que meu empreendimento e meu trabalho sejam reconhecidos. Mas, não posso deixar de citar toda a minha equipe que deixa sua casa todos os dias e vem dedicar-se ao trabalho junto comigo, tenho muito orgulho em ter construído ao longo desses 10 anos de empresa uma equipe de gente boa e apta para o mercado profissional”, ressalta o empresário. A Central das Impressoras, empresa administrada por Thiago Pereira, é destaque nacional em inovação com excelência, carrega cinco prêmios em sua trajetória. Além do Prêmio Nacional de Inovação recebido em 2015, o empreendedor ressalta outras conquistas importantes até chegar nesse prêmio. “Em 2010 fomos um sucesso no evento Alagoas Digital, ainda neste ano fomos finalistas no Prêmio MPE Brasil [Prêmio de Competitividade para Micro e Pequenas Empresas] etapa local, em 2011 fomos reconhecidos no mesmo prêmio que havíamos sido finalistas no ano anterior. E em 2012 fomos agraciados em termos um material no programa Pequenas Empresas e Grandes Negócios. Ainda no mesmo ano, recebemos uma homenagem em Brasília pelo Prêmio MPE Brasil, quando na oportunidade de comemoração aos 40 anos do Sebrae Alagoas fui convidado para gravar um vídeo contando minha história com o Sebrae. Em 2013,  tivemos a oportunidade de ser exemplo no setor para o Brasil inteiro e alguns países da América do Sul através da revista Reciclamais, além de ter sido exemplo para criação de um projeto chamado Cartucho Inteligente, o qual  teve como responsável o Sebrae São Paulo. Isso encheu de orgulho toda a minha equipe”, ressalta o empresário. E os prêmios conquistados por Thiago e sua equipe não pararam por aí. Em 2014, a equipe foi premiada mais uma vez no MPE Brasil na etapa estadual. “Ficamos entre as quatro empresas dentre o universo de mais de 50.000 mil , foi muito gratificante. Logo em maio de 2015 fomos para São Paulo representando não só Alagoas, mas todo o Nordeste no Prêmio Nacional de Inovação, categoria ALI (Comércio), quando tivemos a honra de ser reconhecidos como vencedores do prêmio. Foram mais de 1.000 empresas inscritas em todo o país e nós da Central das Impressoras arrematamos esse prêmio para o Nordeste”, comemora Thiago. [caption id="attachment_103603" align="aligncenter" width="400"] “ Esperamos que nos próximos anos possamos continuar nosso histórico de inovação”, diz diretor-executivo (Foto: Evellyn Pimentel)[/caption] Um passo à frente, agência digital “respira” tecnologia Outra empresa que soube aplicar métodos inovadores foi a Plus Agência Digital. Para Tiago Nogueira, diretor-executivo da agência, com o surgimento constante de novas tecnologias, quem não se atualiza diariamente fica para trás. “Nós sempre quisemos ser pioneiros na área de publicidade online. Antigamente não entendíamos muito de inovação, até termos uma consultoria com o Sebrae Alagoas que identificou nossa empresa com grande potencial inovador. Foi aí que aprendemos do que se tratava a inovação e começamos a padronizar nossos processos para este fim”, comenta. A Plus é a agência digital mais premiada de Alagoas. Com 12 anos no mercado de Web Design, Gestão de Mídias Sociais e Desenvolvimento de Intranets, o diretor-executivo explica que a empresa respira tecnologia. “Somos uma agência eficiente que respira tecnologia e inovação para oferecer serviços digitais de qualidade aos clientes. Com uma equipe multidisciplinar, oferecemos soluções com excelente usabilidade, desenvolvemos tecnologia própria e somos referência regional em gestão de serviços em tecnologias de informação e comunicação (TICs) e em inovação”, explica. O diretor explica que a consultoria mostrou que a inovação não está apenas na estrutura física, nos equipamentos e sim no modelo de gestão que o profissional adota. “Foi aí que aprendemos do que se tratava a inovação e começamos a padronizar nossos processos para este fim. Ao final da consultoria nós engatamos no prêmio MPE Brasil, onde fomos vencedores na categoria de destaque de inovação. Hoje nós adotamos a inovação como parte da nossa missão, visão e valores”, ressalta. Tiago afirma que aprender o que era inovação no contexto da sua empresa foi essencial para driblar a crise. “Posso afirmar que foi essencial para este momento de crise econômica no país. Além de trazer benefícios para a empresa e clientes, também trouxe benefício para nossos colaboradores. Eles são incentivados a participarem de cursos e treinamentos e, a depender do resultado deles, a empresa fornece benefícios extras para cada colaborador. É importante notar isto, pois a inovação deve vir majoritariamente dos colaboradores. Precisa ser uma construção cultural, não algo imposto de cima pra baixo. Desse nosso esforço, nos tornamos semifinalistas no Prêmio Nacional de Inovação em 2017. Esperamos que nos próximos anos possamos continuar nosso histórico de inovação, em especial agora com nosso novo produto no mercado, o Linnoplus”, explica Nogueira. Mais de 1.200 empreendedores apostam em inovação no Estado O gestor local de inovação do Sebrae, Fábio Rosa, aponta que a inovação pode ocorrer em qualquer processo da empresa, independente da área de atuação do negócio.  Atualmente mais de 1.200 empresas estão desenvolvendo a cultura de inovação no Estado com o apoio do Sebrae. “A proposta de inovação na verdade é que a empresa agregue valor ao cliente, saia da mesmice. Tenha algum diferencial e que com isso venha a vender mais, gere mais faturamento e lucro. Antes a gente pensava que apenas ME [microempreendedores] e EPP [empresas de pequeno porte] poderiam ter esse perfil inovador, mas até os MEI’s [microempreendedores individuais] podem realmente fazer inovação na empresa, vai muito do perfil e da liderança”. A novidade pode ser qualquer coisa, desde um produto mais trabalhado, um atendimento personalizado até um serviço adicional. “Por exemplo, eu tinha um cliente em Marechal Deodoro que queria fazer um e-commerce, essa seria a inovação da empresa dele. Que a gente chama de inovação de serviço. Só que na hora que ele foi fazer, ele procurou saber se isso alcançaria a necessidade do cliente e o cliente disse que não, porque na região a internet não pegava bem, não tinha smartphone, ou não teria computador. Então a ideia que a gente teve com ele foi fazer uma mudança organizacional, mudou o e-commerce para um delivery. O que o cliente queria na verdade era a comodidade de receber o produto em casa, isto foi uma inovação de processo”, exemplifica Fábio. Segundo o gestor, o mercado alagoano ainda é carente de empresas que tenham essa visão. Muitas, segundo ele, ainda estão presas em dificuldades financeiras e problemas organizacionais. O equilíbrio na estrutura da empresa é imprescindível para aplicar estratégias diferenciadas. “As empresas daqui ainda têm muitas dificuldades em gestão. Para acertar as contas, as finanças da própria empresa. Os empresários ainda têm muitas dificuldades em controlar o fluxo de caixa, por exemplo. A gente não pode falar de inovação enquanto todo o processo dele estiver bem definido, a base da pirâmide”. [caption id="attachment_103604" align="aligncenter" width="400"] “Essas empresas sabem para quem estão falando. São empresas com gestão de excelência", avalia assessora do Sebrae (Foto: Adailson Calheiros)[/caption] O que os T(h)iagos têm em comum? E não são apenas os nomes dos fundadores que essas empresas têm em comum.  A assessora da diretoria do Sebrae Alagoas, Sandra Vilela, avalia que as três empresas têm um alto nível de preocupação com o cliente e conseguiram ultrapassar as dificuldades. “Essas empresas certamente não começaram assim. Elas foram se tornando assim com o tempo, à medida que o cliente sinalizava. Certamente empresas com muita atenção ao que o cliente diz. Essas empresas sabem para quem estão falando. São empresas com gestão de excelência”, aponta a assessora. Para o economista Emanuel Lucas de Barros, a conjuntura econômica têm imposto dificuldades ao empreendedorismo. “As empresas buscam inovar na tentativa de fidelização e prospecção de clientes, utilizando-se de diversas estratégias, de marketing, facilidades da aquisição do produto, oferta de créditos, promoções e diferenciação do produto. A recuperação deste cenário não é trivial, depende de fatores externos, como melhoria do preço internacional de produtos de exportação, mas também depende de uma recuperação interna do Brasil, ter um governo democraticamente eleito e a favor dos direitos da classe trabalhadora, investimento na indústria, na ciência e tecnologia, e nas áreas sociais, garantindo saúde e educação de qualidade, e o acesso a previdência social”, pontua.