Cooperativas
STF valida lei que inclui cooperativas médicas no regime de recuperação judicial
Alteração na legislação pode vir a impactar nas mensalidades, atingindo consumidores
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ser constitucional a inclusão das cooperativas médicas como legitimadas a pedir recuperação judicial, na Lei n.11.101/05. Para a maioria do colegiado, não houve irregularidades no processo legislativo que deu origem a alteração que incluiu as operadoras. A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade, em que a Procuradoria-Geral da República alegava quebra no processo legislativo que resultou na edição da Lei 14.112/2020, que incluiu na Lei de Falências a parte final do parágrafo 13 do artigo 6º.
Segundo a PGR, a redação do projeto de lei que originou a Lei n.14.112 aprovado pela Câmara dos Deputados excluía do regime de recuperação judicial todas as cooperativas. O texto, contudo, foi alterado no Senado Federal, que incluiu o alcance da norma para as cooperativas médicas. Para a PGR, a exceção não estava no projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados e que a alteração deveria ter tramitado como emenda aditiva.
Segundo o advogado especialista em recuperação judicial, as cooperativas dessa natureza não eram incluídas originalmente na Lei de Falências baseada em uma interpretação restritiva de que, por serem sociedades de pessoas e não terem natureza empresarial estrita, não se enquadravam nas disposições da Lei. “Além disso, argumentava-se que o regime de autofinanciamento, típico das cooperativas, e a ausência de um objetivo de lucro as diferenciavam das sociedades empresárias”, explica.
Ainda de acordo com o advogado, a decisão do STF considerou o papel das cooperativas médicas na sociedade e na economia, especialmente no setor de saúde, além das necessidades de adaptação a crises financeiras e estruturais, o que seria uma medida de preservação da atividade econômica, bem como de proteção aos direitos dos usuários e dos próprios cooperados.
O ministro Luís Roberto Barroso, responsável pelo desempate pela constitucionalidade da lei, argumentou que a inclusão de palavras ou expressões em projeto de lei, desde que corrija imprecisões técnicas e torne o sentido do texto mais claro, não configura emenda aditiva. Ele frisou ainda que o fato de a Câmara dos Deputados nunca ter questionado a suposta não observância do seu papel como Casa iniciadora do projeto confirma esse entendimento.
Entre as mudanças esperadas para as cooperativas com essa inclusão, está o acesso a mecanismos legais que antes eram inacessíveis para enfrentar dificuldades financeiras. “Espera-se que elas consigam renegociar suas dívidas, reorganizar suas finanças e continuar operando sem interrupções. Essa mudança permite às cooperativas médicas estabelecer planos de reestruturação com segurança jurídica, o que pode atrair credores dispostos a negociar e facilitar a obtenção de novos investimentos ou linhas de crédito”, ressalta o advogado.
A recuperação judicial oferece a essas cooperativas uma estrutura formal para reorganizar suas dívidas e melhorar sua saúde financeira sem comprometer a continuidade de seus serviços. Isso é crucial, especialmente considerando que muitas cooperativas médicas operam em áreas com demanda essencial de saúde, atendendo um número significativo de pacientes e cooperados. Além de permitir a reorganização das dívidas com prazos e condições favoráveis, a recuperação judicial proporciona uma proteção temporária contra execuções judiciais e bloqueios financeiros, criando um ambiente mais estável para as cooperativas se reestruturarem.
Victor Lages salienta que a inclusão das cooperativas médicas na recuperação judicial pode trazer impactos positivos para o setor de planos de saúde, especialmente ao reduzir a frequência de encerramentos repentinos em função de dificuldades financeiras. “Como resultado, há uma maior proteção para usuários que dependem dessas cooperativas para atendimento médico. No entanto, em um primeiro momento, credores e fornecedores podem se mostrar cautelosos quanto a negociações, exigindo garantias específicas. Esse processo poderá estabilizar o setor a longo prazo, incentivando práticas mais sustentáveis e seguras entre cooperativas e fornecedores de saúde”, alerta.
Porém, por outro lado, os prestadores de serviços das cooperativas médicas tendem a precificar a possibilidade delas se utilizarem do instituto da recuperação judicial, de modo que os serviços a elas prestados vão passar a ficar mais caros, podendo ocasionar um aumento na mensalidade das cooperativas e impactando os consumidores.
Por fim, a decisão do STF pode abrir precedente para que outras entidades anteriormente excluídas do regime de recuperação judicial, como associações e outras formas de cooperativas, busquem tratamento similar. Essa abertura poderia ocorrer especialmente em setores considerados de interesse público ou social, como educação e agricultura, onde o impacto da continuidade das atividades é significativo. “No entanto, qualquer expansão do benefício da recuperação judicial para outras entidades dependerá de avaliações cuidadosas do legislador e do Judiciário sobre a viabilidade e o impacto econômico e social de tais mudanças”, finaliza o advogado especialista.
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