Cidades

Nomes de batismo raros e diferentes possuem origens aleatórias

Para adotar nome 'esquisito' é preciso que, ao menos, 20 pessoas já tenham sido registradas com ele, na mesma grafia

Por Valdete Calheiros – colaboradora / Tribuna Independente 30/08/2025 08h39 - Atualizado em 30/08/2025 13h21
Nomes de batismo raros e diferentes possuem origens aleatórias
Laodâmia Cícera Pereira Cosmo da Silva e Renicácia Moreira da Silva - Foto: Arquivo pessoal

Muitos alagoanos têm os nomes próprios tão diferentes, tão incomuns que não encontram, em todo o Brasil, pelo menos mais 19 pessoas com o mesmo nome. É que o próprio Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) só registra nomes em suas pesquisas quando existem no país pelo menos 20 exemplares deles.

A escolha do nome de um filho ou filha é um momento muito importante. Alguns pais, pesquisam ideias na internet, outros seguem uma tradição de família e há, também, quem espere o filho ou filha nascer para olhar o rostinho e ver se a opção é a “cara” do recém-nascido.

Pelo Brasil afora, existem pessoas cujos registros de nascimento estão escritos Agrícola Beterraba Areia, Amável Pinto, Amazonas Rio do Brasil Pimpão, Amin Amou Amado, Aricléia Café Chá, Asteroide Silvério, Ava Gina, Bizarro Assada Céu Azul do Sol Poente, Chevrolet da Silva Ford, Colapso Cardíaco da Silva, Disney Chaplin Milhomem da Silva, Dezêncio Feverêncio de Oitenta e Cinco, Dolores Fuertes de Barriga, Esparadrapo Clemente de Sá, Homem Bom da Cunha Souto Mai9or, Ilegível Inilegível, Inocêncio Coitadinho, Janeiro Fevereiro de Março Abril, Lança Perfume Rodometálico de Andrade, Marciano Verdinho de Antenas Longas e Maria Privada de Jesus, segundo levantamento da Consultoria proScore.

A Arpen – Associação dos Registradores de Pessoas Naturais – explicou que não pode fornecer dados sobre os nomes registrados nos cartórios alagoanos, devido à LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.

Entendem errado

A reportagem do jornal Tribuna Independente achou algumas pessoas com nomes um tanto quanto diferentes. É o caso, por exemplo, da auxiliar de secretaria escolar Renicácia Moreira da Silva tem 41 anos e já se acostumou a sempre ter que repetir o nome.

“As pessoas sempre acham que entenderam errado. Para mim, não tem problema nenhum, eu gosto de ter o nome diferente. Como moro em cidade do interior [Paulo Jacinto], costumo brincar dizendo que quem chegar na cidade me procurando, me acha logo. Só tem eu como o nome de Renicácia.

Seu nome foi dado de “presente” por uma amiga da mãe, para homenagear o pai de Renicácia. Ele se chama Renil. Ela já passou por algumas situações que, no começo, achou irritante, mas também já se acostumou.

“Semana passada, enviei uma encomenda pelos Correios e mesmo eu falando meu nome bem devagar, escreveram errado. De cara, me irritei, mas depois acabei rindo com a situação e com o nome que eles entenderam ser o meu: Pulicalia”.

Laodâmia Cícera Pereira Cosmo da Silva nasceu no dia 26 de junho de 2000 e teve o nome escolhido pela mãe, Márcia. “Ela me contou que o encontrou em um livro de nomes para bebês e gostou muito por ser diferente, único e bonito. Sempre que digo meu nome, as pessoas têm dificuldade de entender e preciso repeti-lo até conseguirem pronunciar corretamente. Isso acontece com frequência. Na escola, quando um professor novato tentava falar meu nome, a sala inteira já começava a corrigir rindo. Nos exames que eu fazia, quase sempre meu nome saía errado: já fui chamada de Leodania, Laudamia, Laodania, menos do meu nome correto, Laodâmia. Gosto do meu nome, significa que sou dominante”.

Viram apelidos

Formada em Recursos Humanos, ela contou que até mais ou menos 2013, 2014, toda sua família e amigos chamavam-na de Lao. Até quem um dia, conheceu uma menina que não conseguia pronunciar seu nome e disse que passaria a chamá-la de Lola, pois era mais fácil.

“O apelido pegou, e até hoje muitas pessoas me conhecem assim como Lola e não como Laodâmia. Atualmente, apenas minha família e alguns amigos próximos continuam me chamando de Lao”.

Laodâmia Cícera contou quem recentemente, no hospital, um rapaz que media sua pressão arterial perguntou seu nome. Ao ouvir a resposta, disse-lhe que também achava seu próprio nome feio.

“Eu apenas balancei a cabeça para não deixá-lo sem graça, mas a verdade é que eu gosto muito do meu nome. Ele me faz sentir única e exclusiva. Até hoje não conheci ninguém que se chame assim e, confesso, tenho até um certo ciúme dele. Pesquisei e descobri que sua origem é grega, gostei muito do significado.

A pedagoga Danúbia Silvestre de Lima, 34 anos, afirmou que um primo teve uma professora chamada Danúbia, achou o nome bonito e pediu a sua mãe que a registrasse com o mesmo nome.

“As pessoas erram muito a escrita, confundem com Nubia, acham incomum. Antes, eu não gostava muito do meu nome, de um tempo para cá aceitei e hoje acho o máximo, acho um nome forte. Acho engraçado quando eu falo o meu nome e as pessoas associam ao Rio Danúbio, dizem que é fácil para lembrar porque é só inverter o gênero”.

Apelidada pelos amigos de Dani, o que faz as pessoas acharem que seu nome é Daniele, ela atende também pelos apelidos carinhosos de Dan, Ninha, Branus, Daninha, Babu e tantos outros!

Sua companheira também tem um nome pouco comum. É a arquiteta Katiléa Melo, 33 anos. Ela é segunda filha de um casal que, em comum acordo, decidiu que o nome da primeira filha seria escolhido pela mãe escolhia e a segunda teria o nome escolhido pelo pai.

“Meu pai sempre foi apaixonado pela natureza, por plantas, flores. Um dia folheando uma revista, ele se deparou com uma orquídea chamada Cattleya e assim ele escolheu meu nome. Quando contou à minha mãe sobre a escolha, ela estranhou, se perguntou se saberia chamar meu nome, mas assim foi feito, na hora de me registrar ele quis mudar a escrita e assim nasceu meu nome: Katiléa”, detalhou.

Danúbia Silvestre de Lima e Hyarlly Mirian Correia de Melo (Fotos: Arquivo pessoal)

Ela disse que sempre recebe outros nomes, tais como Katilene, Katilucia, Katiane e por aí vai. Até a sogra passou anos chamando-a de Katine.

“Sempre me senti muito bem com meu nome, gosto dele, sempre me senti especial e diferente dos demais, principalmente pelo fato de ter sido escolha do meu pai. Gosto tanto que tenho uma tatuagem da Cattleya original no braço”.

Ainda segundo ela, tem um filme chamado Colombiana, onde a personagem principal se chama Cataleya, por conta da orquídea. “No filme ela é uma assassina que vinga a morte dos pais, e sempre deixa o desenho da orquídea como sua marca. Então quando digo meu nome, muitas pessoas associam ao filme, mas eu vim antes do filme”, brincou.

A manicure Katrinfiny Melo Pereira, 26 anos, é apaixonada pelo nome. “Acho especial, único, combina comigo eu amo meu nome. É muito autêntico. Hoje em dia existe muito nome diferente.

Hyarlly Mirian Correia de Melo, tem 11 anos, teve o nome escolhido pelo pai. Segundo a mãe, o esposo disse-lhe que achou o nome bonito e também é uma variação feminina do nome Harley. “Questionei no começo mais deixei ele colocar e acrescentei o nome Mirian. A maioria das pessoas nunca sabe pronunciar o nome da minha filha, acham que é Hylarry, assim sempre acabam chamando pelo segundo nome. No cartório, no dia do registro, achavam que o nome era do sexo masculino. Acabaram registrando errado”.

Sem nome comum

Na casa de Yasmin Carollyne, 32, não há espaço para nomes comuns. Seu esposo, da mesma idade foi registrado com o nome de Wellvans Klinger. Os filhos do casal seguiram o mesmo caminho. A mais velha, de 11 anos, atende pelo nome de Kimberlly Carollyne. Na sequência, vem Jasminy Valentinna, 8 anos. Os meninos até que tem nomes mais comuns, mas com grafias pouco usuais. É o caso de Arthur Rhavy, 5 anos e Dhavy Gabriel 3 anos.

“A inspiração veio do nome do meu esposo. Já que o nome dele é diferente, decidimos fazer o mesmo com nossos filhos. De todos os nomes da minha família, é justamente o do meu esposo, que dá mais trabalho para as pessoas escreverem ou pronunciarem. A Kimberlly, com o jeitinho dela, se esforçou e ensinou todos os amiguinhos da escola a pronunciarem e escreverem seu nome”.

Conforme o sociólogo Carlos Martins, o nome é como se fosse uma instituição, é um fenômeno socialmente regulado. Normalmente, explicou ele, as pessoas colocam escolhem para seus filhos nomes que já estão legitimados, que já fazem parte daquele contexto social.

Sociólogo Carlos Martins diz que “o nome é como se fosse uma instituição, é um fenômeno social regulado” (Foto: Sandro Lima / Arquivo)

“Quando alguém tem um nome diferente, a pessoa fica tendo que responder qual o significado do nome porque o nome é parte da integração social. Um nome comum é um nome que está dentro do regramento social, é um nome aceito. Em algumas situações que quando os pais vão registrar um filho, que esse nome é um nome incomum, em alguns momentos o cartório não aceita o nome, porque vai causar determinados constrangimentos àquela pessoa ao longo de sua vida. Então por isso que o nome atende a um regramento social, ele é regulado socialmente. O nome, é um código que vai estabelecer as relações a partir do significado, a partir do sentido que é dado aquele código, é uma marca social”, salientou.

Visão do sociólogo

Segundo o sociólogo, o nome da pessoa está associado a características da personalidade daquela pessoa. “A gente faz isso meio que inconscientemente. E aí como um marcador social, ele é também um estigma, uma marca que cumpre um papel. E o papel é nortear as relações. A primeira coisa que a gente procura saber quando conhece uma pessoa é o nome dela, é a marca que a representa. Então o nome serve como um elemento. Imagine se alguém não tivesse o nome, como é que essa pessoa viveria na sociedade”, indagou.

Mas e quem não gosta no nome e quer fazer alguma mudança? O que fazer? A Arpen informou que, de acordo com o provimento 149 do Conselho Nacional de Justiça, toda pessoa maior de dezoito anos completos poderá, pessoalmente e de forma imotivada, requerer no cartório a alteração de seu prenome, independentemente de decisão judicial. Essa alteração compreende a substituição – total ou parcial – do prenome, permitindo acréscimo, supressão ou inversão.

A pessoa interessada em trocar de nome deverá declarar a inexistência de processo judicial em andamento e, caso exista algum, deverá comprovar o arquivamento deste como condição ao para dar continuidade ao pedido administrativo. A pessoa deverá assinar o requerimento de alteração de prenome, na presença do oficial de registro civil das pessoas naturais, indicando a alteração pretendida.