Cidades
Braskem é acusada de 'mentir' em matéria paga sobre o Projeto Flexais
Segundo moradores, revitalização da área pela mineradora é engodo; comunidade quer 'realocação já!'
Com o título “em Maceió, região dos Flexais recebe ações da Braskem para mitigar isolamento socioeconômico”, a petroquímica publicou uma matéria paga no UOL – site de informações administrado pelo jornal Folha de São Paulo – no início desta semana, divulgando o projeto de revitalização da região de Bebedouro – um dos cinco bairros atingidos pelo afundamento do solo provocado pela mineração predatória de sal-gema, na capital alagoana.
A petroquímica diz que há cinco anos, quando veio à tona a tragédia da subsidência do solo nos bairros afastados pela mineração, a companhia criou um programa para desocupar a área com segurança e garantir a indenização de quem ali vivia. “De lá para cá, cerca de 40 mil pessoas já foram realocadas, dentre outras ações e programas da Braskem para reparar, mitigar e compensar os efeitos da subsidência do solo, todos eles frutos de acordos com as autoridades e o Poder Público”, garante a empresa, na matéria publicada pelo Portal UOL.
Segundo a reportagem paga pela Braskem, “apesar da proximidade com os bairros desocupados, a região dos Flexais, que margeia a Lagoa Mundaú, não apresenta indícios de subsidência relacionada à extração de sal-gema e, por isso, não foi incluída no perímetro de risco criado pela Defesa Civil em 2020. Os moradores dali, no entanto, foram afetados por outro fenômeno, chamado de ‘ilhamento socioeconômico’”.
Ilhamento
“Este ilhamento se desenhou a partir do momento em que partes de cinco bairros próximos ficaram sem moradores. Como se sabe, numa cidade, a vida das pessoas não se resume ao bairro onde mora, e a interação entre habitantes de diferentes áreas é que cria, naturalmente, as engrenagens sociais e econômicas. No caso de Maceió, os moradores dos Flexais ficaram isolados”, acrescenta a reportagem do UOL.
No entanto, para os moradores dos Flexais, nunca houve uma preocupação autêntica e espontânea da Braskem para resolver os problemas da comunidade. “Muito pelo contrário, a gente aqui vive isolado e sob ameaça, os vigilantes da mineradora nos intimidam e nos vigiam 24 horas por dia. É como se a gente tivesse confinado numa espécie de curral de gado. Um inferno”, relatou o vendedor ambulante Valdemir Alves, que é morador do Flexal de Cima.
Ele lembrou que, de todas as autoridades que acompanham o Caso Braskem, apenas o defensor público estadual Ricardo Melro tem se posicionado, verdadeiramente, a favor dos moradores dos Flexais. Foi com base num pedido dele – destacou Alves – que a Ufal fez o estudo técnico acerca da situação dos Flexais, chegando à conclusão que a melhor saída é a retirada dos moradores da localidade.
A mineradora disse na reportagem do UOL que, para mitigar o impacto social do isolamento, criou o Projeto Integração Urbana e Desenvolvimento dos Flexais, visando promover o acesso dos moradores a serviços públicos e estimular a economia da região.
“O Projeto ganhou forma a partir de um Termo de Acordo assinado pela Braskem, Município de Maceió, Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual e Defensoria Pública da União. Homologado pela Justiça em outubro de 2022, o acordo prevê 23 medidas socioeconômicas para reverter a situação de ilhamento da região, pagamento de indenização para famílias, comerciantes e empresários e, ainda, transferência de verba ao Município para a realização de ações adicionais”, completou a mineradora, na matéria do UOL.
Apesar das lideranças dos Flexais dizerem que não foram consultadas, a mineradora garante que “o projeto foi formatado depois de muitas reuniões, pesquisas e entrevistas com moradores da região, além de encontros com autoridades e audiências públicas, chegando assim a um conjunto de ações e sua ordem de prioridades”.
OPORTUNIDADES
A mineradora disse também que tem criado oportunidades de emprego e renda para a comunidade. “Uma das medidas criadas a partir da colaboração da comunidade foi o programa ‘Aprendi no Flexal’, que oferece cursos de capacitação profissional para que os moradores da região cheguem ao mercado de trabalho em condições mais competitivas”, garantiu a mineradora. Foram criados, segundo ela, 14 cursos com formações em áreas diversas, que seguem em andamento.
“Também foi criada a Feira dos Empreendedores do Flexal, que na segunda edição, realizada em agosto de 2024, reuniu 24 expositores, 17 profissionais de beleza, serviços de saúde e atividades de lazer. O evento contabilizou mais de 370 atendimentos gratuitos na área de serviços”, pontuou a mineradora.
Ela disse ainda que “por meio do Projeto de Desenvolvimento dos Flexais, já estão em fase de planejamento duas ações para beneficiar diretamente os pescadores da região”.
“A primeira é a construção de um píer, garantindo o acesso seguro dos profissionais da pesca. Por fim, integrado ao píer, será criado um Centro de Apoio aos Pescadores, com galpão para guarda de equipamentos, equipamento para conservação e pesagem do pescado e área de comércio”, concluiu.
“Vivemos num inferno patrocinado pela Braskem”, afirmam moradores
Os moradores dos Flexais, Quebradas, Rua Marquês de Abrantes e Vila Saem, que sofrem as consequências da mineração predatória praticada pela Braskem embora estejam fora da área de risco traçada pela Defesa Civil de Maceió, contestam todas as informações divulgadas pela empresa no portal UOL.
“É ilusão, é façanha, é mentira da Braskem e da própria Justiça que não tem sensibilidade com a gente. O isolamento social imposto pela Braskem transformou nosso bairro numa comunidade fantasma. Vivemos num inferno patrocinado pela Braskem”, afirmou o vendedor ambulante Valdemir Alves, que é morador do Flexal de Cima.
Segundo ele, a região toda do Bebedouro está pior do que antes. “As obras que foram feitas são mal-acabadas e colocam em risco a vida das pessoas. Portanto, em posso dizer que esse Projeto Flexais da Braskem é um fracasso”, completou Alves.
“Só quem sabe o inferno, o sufoco que a comunidade está passando é quem mora aqui no bairro com a gente. Esses projetos da Braskem só pioram a vida da comunidade”, acrescentou o morador, lembrando a morte da Dona Pureza, que tomou veneno e deu veneno de rato para a filha e para um gato, decepcionada com o projeto de revitalização do bairro imposto pela Braskem. Ela e gato morreram na hora. A filha que tinha necessidades especiais morreu uma semana depois, no Hospital Geral do Estado (HGE).
Antes de se matar e tentar matar a filha e o gato, no dia 31 de outubro, dona Pureza deixou um recado escrito de próprio punho, numa folha de papel, dizendo: “Cada vez que vejo os benefícios da Braskem a minha desilusão aumenta. Estou cada vez mais deprimida, em saber que vou ficar nesse isolamento para sempre”.
Ativista cita desespero diante do fracasso de revitalização
Para a bióloga Neirevane Nunes, integrante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), a reportagem da Braskem no portal UOL representa o desespero da mineradora, diante do fracasso do Projeto Flexais.
“Estão investindo pesado nas últimas semanas em matéria paga, sobre os Flexais principalmente. Estão incomodados”, afirmou a bióloga, lembrando que a Band News também exibiu uma reportagem de tevê, com as mesmas mentiras divulgadas pelo UOL.
Neirevane lembrou também que, recentemente, técnicos da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) publicaram um estudo feito sobre a situação dos Flexais, quando constaram que a comunidade enfrenta as consequências da mineração predatória, com minas d’água jorrando dentro e fora de várias casas da Rua Marquês de Abrantes, em Bebedouro.
Com base nesses estudos, os pesquisadores da Ufal recomendaram a realocação dos moradores da região dos Flexais, alegando que eles também enfrentam risco de vida, a exemplo das demais famílias vítimas da mineração expulsas dos bairros que afundam em Maceió.
A realocação, reivindicada pela maioria dos moradores dos Flexais, também é defendida pela Defensoria Pública do Estado de Alagoas (DP/AL), numa ação movida pelo defensor público Ricardo Melro.
Já o presidente da Associação dos Empreendedores Vítimas da Mineração em Maceió, Alexandre Sampaio, fez uso da ironia ao comentar a matéria do UOL. “Está tudo ótimo, sobretudo pela passividade daqueles moradores e líderes”, disse, indignado com a passividade das pessoas prejudicadas pelo afundamento do solo e com a falta de empatia da população como um todo.
OUTRO LADO
Procuramos ouvir a Braskem, por meio da sua assessoria de comunicação, sobre a reação dos moradores dos Flexais acerca da matéria publicada pelo portal UOL – que para eles a reportagem “é mentirosa” –, mas a mineradora não quis se manifestar e muito menos provar que a comunidade estaria satisfeita com o isolamento social a qual vem sendo submetida.
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