Cidades
Braskem responde a 675 processos na Justiça de Trabalho
Desse total, 420 processos foram movidos a partir de 2018, quando tragédia do afundamento do solo veio à tona
A Braskem responde a 675 processos na Justiça do Trabalho em Alagoas, de 1996 até o final de setembro de 2024. A informação é do Tribunal Regional do Trabalho em Alagoas (TRT/AL), repassada à reportagem da Tribuna Independente, com exclusividade, na semana passada. Desse total, 420 processos foram movidos a partir de 2018, quando o problema do afundamento do solo nos bairros atingidos pela mineração veio à tona.
Com isso, podemos dizer que a tragédia da mineração em Maceió fez aumentar o número de reclamações trabalhistas contra a Braskem na justiça trabalhista do Estado. Mesmo assim, a empresa não reconhece essa escalada de reclamações. Por meio de nota, disse que “desconhece o aumento de demandas trabalhistas relativas à desocupação de imóveis comerciais na área afetada pela subsidência”.
Questionada por que, então, os números de ações cresceram tanto, coincidentemente após os abalos sísmicos de março de 2018, a mineradora não deu qualquer explicação, preferiu se calar. No entanto, para os advogados trabalhistas, consultados pela reportagem, esse aumento no número de processos contra a Braskem está relacionado aos estragos provocados pela tragédia da mineração, na vida dos trabalhadores assalariados.
Não por acaso, o fenômeno geológico foi usado, pelo desembargador Marcelo Vieira, presidente do TRT/AL, como justificativa para reformular uma decisão de primeira instância e mandar a Braskem indenizar uma enfermeira demitida do Hospital Sanatório.
Mineradora terá que pagar indenizações trabalhistas
A unidade hospitalar, que estava localizada dentro da zona de risco de afundamento do solo, foi interditada no final do ano passado, logo após a mina 18 entrar em colapso.
A Braskem recorreu, alegando que a enfermeira não tinha vínculo empregatício com a mineradora, mas a decisão do TRT/AL foi mantida pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). A 2ª turma do TST determinou que a Braskem deve responder pelo pagamento de verbas trabalhistas devidas à técnica de enfermagem dispensada em razão das dificuldades financeiras do hospital onde trabalhava, decorrentes de problemas ambientais provocados pela atividade da mineradora em Maceió.
“Cenas de terror”
A técnica de enfermagem Ismênia Karollyne Gomes Amorim trabalhava no Hospital Sanatório, mas foi demitida antes do fechamento da unidade hospitalar. Em 2020, o hospital começou a enfrentar problemas estruturais graves, com rachaduras e salas interditadas, transformando o local em um “cenário de terror”, segundo depoimento da trabalhadora.
A região foi completamente evacuada, as residências da vizinhança interditadas e boa parte da população se mudou, o que impactou o funcionamento do hospital e as condições de trabalho da equipe. Devido à crise, o Sanatório começou a atrasar salários, o que levou a enfermeira a faltar ao trabalho. Por conta disso, em janeiro de 2022, ela foi dispensada por justa causa e acionou a Justiça do Trabalho, pedindo a responsabilização solidária da Braskem pelo pagamento de suas verbas rescisórias.
Em novembro de 2023, quase dois anos após a demissão da enfermeira Ismênia, o Hospital Sanatório foi completamente evacuado, por determinação da Defesa Civil de Maceió, preocupada com o impacto do colapso da mina 18 da Braskem, localizada no bairro do Mutange, atualmente um bairro fantasma, em Maceió.
Na ação judicial, a Braskem defendeu que não poderia ser responsabilizada pelas dívidas trabalhistas do hospital, alegando que não mantinha qualquer relação de emprego com a técnica.
Poluidor é que paga por prejuízos
No entanto, o TRT da 19ª região reformou a sentença de 1ª instância e condenou a Braskem a pagar as verbas trabalhistas que a enfermeira teve direito, além de pagar a ela uma multa de R$ 5 mil por danos morais.
Teoria do fato
Na decisão, a ministra Liana Chaib, relatora do recurso da Braskem no TST, destacou que, apesar de não haver vínculo empregatício com a petroquímica, a inadimplência do hospital estava diretamente ligada ao desastre ambiental causado pela mineração. A decisão foi fundamentada na “teoria do fato do príncipe”, que, por analogia, se aplica a casos em que ações de terceiros, como o poder público ou empresas, impedem o cumprimento de contratos.
A ministra Liana Chaib também ressaltou o princípio do poluidor-pagador, previsto na lei dos crimes ambientais (Lei 9.605/98), que impõe a quem causa danos ambientais a responsabilidade de reparar os prejuízos em todas as esferas sociais, incluindo ações trabalhistas. “A degradação ambiental causada pela Braskem requer reparação nas várias esferas violadas, entre elas a garantia dos direitos trabalhistas da técnica de enfermagem”, concluiu a ministra.
Para o coordenador do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem, Cássio Araújo, a decisão do TRT/AL foi completamente acertada, por isso foi mantida pelo TST. Segundo ele, que é procurador do Trabalho, o tribunal reafirmou a competência da Justiça do Trabalho para julgar casos em que desastres ambientais causam prejuízos a trabalhadores, mesmo quando a empresa responsável pelo desastre não é o empregador direto.
Outro lado
A Braskem foi procurada, por meio da sua assessoria de comunicação, para se posicionar sobre os 675 processos que responde na Justiça do Trabalho em Alagoas, de 1996 para cá, mas a empresa não quis se manifestar.
Como do total de processos quase o dobro foram movidos a partir de 2018, a mineradora foi questionada se reconhece que essas reclamações trabalhistas aumentaram depois que a questão do afundamento do solo veio à tona, mas também não quis se posicionar.
Em nota, sua assessoria de imprensa disse apenas que “a Braskem desconhece o aumento de demandas trabalhistas relativas à desocupação de imóveis comerciais na área afetada pela subsidência”.
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