Cidades

Moradores de rua de Maceió reclamam de Centros Pop

Espaço pequeno não oferece local adequado para refeição de todos; cardápio fraco é outra reclamação dos usuários

Por Valdete Calheiros – colaboradora / Tribuna Independente 03/08/2024 08h15 - Atualizado em 03/08/2024 09h05
Moradores de rua de Maceió reclamam de Centros Pop
Muitos dos moradores em situação de rua se alimentam do lado de fora por falta de espaço nos Centros Pop - Foto: Edilson Omena

Café da manhã e almoço. São as duas únicas certezas na vida das pessoas em situação de rua assistidas pelos Centros de Referência Especializada para Pessoas em Situação de Rua da prefeitura de Maceió (Centro Pop). São três na capital. Centro Pop I, II e III, respectivamente, em Jaraguá, Levada e Benedito Bentes. Todos expõem os desafios no atendimento à população em situação de rua em Maceió.

No Centro Pop II, na Levada, são distribuídas 90 senhas, diariamente, para cada uma das duas refeições ofertadas. O café da manhã é servido às 8h e o almoço às 11h.

Quem chegar primeiro na fila e pegar a senha garante a comida para forrar o estômago e se arriscar pelas ruas da capital entregando a própria vida à boa vontade de terceiros que ora ajudam, ora viram as costas.

A reportagem do jornal Tribuna Independente esteve no Centro Pop II. Na manhã da última quinta-feira, no café da manhã foi servido macaxeira com frango ao molho. A porção de tubérculo era generosa. A proteína encontrou espaço na quentinha e ia se espalhando pelas brechas deixadas pela raiz. Para acompanhar, uma boa dose de café servido em um copo descartável. O cheiro do café quentinho tomava conta do ambiente à medida em que era distribuído nos copos.

A falta de algum tipo de fruta no cardápio era visível. Pelo menos não tinha na oferta do dia. Não era dada a oportunidade para ninguém repetir. Na sequência da fila, outro usuário também esperava pela sua refeição. Boa parte dos presentes havia se alimentado ali mesmo, no dia anterior, às 11 horas da manhã. Quase 24 horas sem por nenhum alimento à boca.

Fila organizada. Senhas sendo chamadas em voz alta pelos funcionários. Em menos de 10 minutos, todas as 90 refeições já tinham donos. Alguns beneficiários conseguiam cadeiras e mesas. Outros comiam em pé. Outro grupo atravessava a rua para comer sentado na calçada.

A refeição logo foi consumida. A fome tem pressa. E tentar a vida na sorte da rotina diária não é para quem dorme acordado. Os beneficiários não reclamaram das refeições. Pelo contrário, queriam mais. Praticamente, de forma unânime, os quase 100 moradores em situação de rua pediram para que fosse oferecido também jantar.

Uma das primeiras da fila foi Daiane Alves da Silva, 27 anos, mãe de quatro filhos. Duas meninas de 11 e seis anos e dois meninos de 10 e oito anos. Ela está em situação de rua desde os 13 anos. Disse que foi apresentada às ruas pelas más influências que a levaram para as drogas. “Cheirar pó” é seu maior passatempo.

“Uso cocaína. É o que me dá forçar para levar a vida sofrida que tenho. Não quero meus filhos nas ruas”, afirmou.

MPF e DPU fizeram vistoria, mas ainda não tomaram providências

Em junho, no dia 14, o Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) realizaram vistoria nos Centro Pop I e II. Ao detectaram alguns problemas, os órgãos federais não gostaram muito do que viram.

Ao MPF e à DPU chegou a denúncia de que as refeições, preparadas pelo Restaurante Popular, “são insossas e servidas em pequena quantidade”.

Segundo o MPF divulgou, logo após a vistoria, a comida, embora não estragada, gera insatisfação entre os assistidos, especialmente por não haver uniformidade nas proteínas fornecidas.

De acordo com o que foi divulgado pelo MPF, quando da ocasião da vistoria, das 100 quentinhas diárias, foi denunciado que apenas 10 continham galeto assado, 40 unidades continham almôndegas e outras 50 tinham carne moída de soja.

Houve ainda denúncias de tratamento desigual na distribuição de alimentos e bebidas, com algumas pessoas recebendo café com leite enquanto outras recebem apenas café preto. Os usuários reclamam também que são impedidos de fazerem suas refeições no Restaurante Popular.

Quem chega mais cedo ainda consegue fazer a refeição sentado, apesar do aperto no interior do local (Foto: Edilson Omena)

A vistoria também observou que faltam portas nos banheiros do Centro POP II. Em relação às atividades recreativas e de interação social, a visita pontuou que são limitadas. No Centro Pop II, uma mesa com peças de dominó era bastante disputada.

A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social, Primeira Infância e Segurança Alimentar (Semdes) informa que já foram feitas reformas nas unidades de acolhimento para pessoas em situação de rua. Inclusive, o Serviço de Acolhimento Manoel Coelho Neto (antigo Albergue Municipal) está funcionando em um novo espaço e melhor atendendo os usuários.

“A previsão de reparos para os Centro Pops está para ser iniciada este mês de agosto. Além disso, essas unidades receberam equipamentos novos, como ar-condicionado, ventiladores, entre outros materiais permanentes, incrementando a estrutura tanto para os assistidos quanto para servidores, diz a secretaria.