Cidades
Sururu some da Lagoa Mundaú e preço 'explode' em Maceió
Grande produtor do molusco, capital precisa importar; pescadores e marisqueiras pedem mais estudos para explicar sumiço
O catador de sururu Josivan Pereira dos Santos está prestes a completar 50 anos, dos quais praticamente 40 dedicados ao ofício de marisqueiro. Ele chega a perder o sono ao pensar que, um dia, poderá ficar sem seu sustento. O marisco é, para ele, o pão à mesa, o alimento de cada um dos oito membros da família. Todos vivem da cata do molusco na Lagoa Mundaú, em Maceió, onde o sururu se mistura à paisagem alagoana. Mas, atualmente, com o sumiço do molusco, muito sururu tem que vir de outros estados, principalmente de Sergipe.
Para conseguir o sururu, Josivan Pereira já chegou a mergulhar até cinco metros de profundidade. Sua rotina é cansativa. Trabalha quase 15 horas por dia entre a cata e o cozimento do alimento. Cada quilo é comercializado a R$ 35, R$ 40. Dependendo da oferta e da demanda, pode chegar a R$ 70. Para garantir o sustento do final de semana, ele não parou de despinicar o alimento, processo em que se tira o sururu do casco, nem mesmo durante a entrevista concedida à reportagem do jornal Tribuna Independente.
Sua clientela é pequena, mas fiel. São donas de casa que gostam de comprar o sururu para ter uma refeição tipicamente alagoana. O período de inverno não favorece muito. Naturalmente, o sururu fica mais escasso. As chuvas diminuem a salinidade da água. Com os sedimentos vindos dos rios, o sururu fica sem oxigênio, sem alimento e morre.
No entanto, diante das clientes que não desistem de tê-lo à mesa nem mesmo nessa época, Josivan Pereira se esforça ainda mais para levá-lo a sua banca de venda.
Ele é uma exceção na cadeira do sururu. Setenta por cento das pessoas que trabalham com o alimento são mulheres.
A presidente da Federação de Pescadores de Alagoas (Fepeal), Maria Fia, afirmou que a entidade trabalha com uma estimativa de aproximadamente sete mil mulheres que sobrevivem como marisqueiras, pescadoras no complexo lagunar.
“Não temos o número exato de quantas pessoas vivem exclusivamente do sururu porque estamos fazendo um recadastramento no Banco de Dados do Governo Federal junto ao Ministério da Pesca, estamos consolidando esse número”.
A representante da Fepeal contou que por períodos muito extensos o sururu fica bastante escasso, principalmente, no Vergel, Trapiche e Bebedouro.
“Pedimos mais estudos, análises, ações para entendermos o que está acontecendo com o nosso sururu. Precisamos resolver esse problema porque a gente tem uma cadeia muito grande com muitas marisqueiras que dependem da produção de sururu no nosso complexo lagunar. Sentimos falta de apoio dos governos federal, estadual e municipal.
O pescado do sururu representa 100% da renda da comunidade lagunar. A maioria não tem escolaridade ou experiência em qualquer outra área de trabalho o que dificulta inserção em outros empregos.
Assoreamento lagunar pode causar desaparecimento, diz pesquisador
O professor do Instituto de Química e Biotecnologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Josué Carinhanha Caldas Santos, explicou que o sumiço do sururu não é algo pontual, nem atual. “Em um histórico recente, isso já vem sendo reportado pelos pescadores há alguns anos”.
Segundo o pesquisador, as prováveis causas estão associadas ao processo assoreamento da laguna, algo que acontece há muitos anos. “Para termos uma ideia alguns locais na laguna tinham profundidade aproximada de oito, dez metros. Atualmente, essas áreas têm profundidade da ordem de dois metros. Associado a isso, temos um processo constante de contaminação ambiental, sobretudo esgoto urbano, alguns pontos são notoriamente vistos com facilidade naquela área, isso evidentemente vai levar a variações em parâmetros químicos e físico-químicos e biológicos da qualidade da água. E também relacionada à redução dos nutrientes, principalmente fitoplâncton, que são uma fonte de alimento do sururu”, detalhou.
O professor possui graduação em Licenciatura em Química pela Universidade do Estado da Bahia, mestrado e doutorado em Química Analítica pela Universidade Federal da Bahia com período na Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto (Portugal).
Aliado a isso, completou Josué Carinhanha, nos últimos anos foi reportado o aparecimento de outra espécie, o que nós denominamos de espécie invasora, e que comumente é reportada pelos pescadores como sururu branco.
“Ele não tem as mesmas propriedades organoléticas em relação a sabor, o que infelizmente impede o consumo, e também a casca dele é mais frágil, o que até atrapalha, caso o sabor fosse adequado, a comercialização.
Além disso, tem fatores climáticos associados. Por exemplo, em períodos de alta índice pluviométrico, com muitas chuvas, acontece a variação, por exemplo, do pH da água, ela fica mais doce, de uma maneira simplista, e isso evidentemente torna o ambiente impróprio para a reprodução e o crescimento do sururu”, explicou.
Segundo ele, é o conjunto desses fatores que está levando, sistematicamente, a redução da carga e da produção de sururu naquele ambiente. “A gente não pode colocar ou pensar em um fator único como algo que está relacionado, mas sim uma relação desses diferentes fatores”.
Na avaliação de Josué Carinhanha, a solução gira em torno de pensar na Laguna como um sistema dinâmico.
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