Cidades

Moradores denunciam truculência em despejo de residências no Pinheiro

Residentes no bairro afirmam que foram retirados de casa à força durante noite e madrugada

Por Ricardo Rodrigues - colaborador / Tribuna Independente 01/12/2023 10h58
Moradores denunciam truculência em despejo de residências no Pinheiro
Dona Sônia Farias, despejada à força no Pinheiro, em foto com seu advogado Olavo Soares Bastos - Foto: Ricardo Rodrigues

Moradores do bairro do Pinheiro, que se recusaram a fazer acordo com a Braskem para desocupar seus imóveis, denunciaram as forças policiais, mobilizadas pela Prefeitura, de agirem com truculência, a serviço da Defesa Civil de Maceió, da Braskem e da Justiça Federal.

Eles alegam que foram retirados à força e de forma truculenta de suas casas, da noite de quarta-feira (29/11) para a madrugada de quinta-feira (30/11).

Dona Sônia Farias, de 64 anos, moradora do Pinheiro, disse que foi expulsa da sua casa, na noite da última quarta-feira, por uma comitiva de quase 100 pessoas, sob o comando da Defesa Civil de Maceió e um oficial de justiça da 3ª Vara da Justiça Federal de Alagoas.

“Compareceram à minha casa todo tipo de aparato policial, PF, PM, Polícia Civil, Exército e Guarda Municipal, além de representantes da Justiça, da Defesa Civil de Maceió, da empresa Diagonal e um advogado da Braskem. Eles aproveitaram o problema com a Braskem para fazerem isso comigo”, relatou dona Sônia.

Ela disse ainda que como não aceitou a proposta indenizatória da Braskem, continuou morando no Pinheiro, onde o marido tem uma empresa de refeições para eventos. “Botaram a gente para fora e fecharam a minha casa. Agora, a gente não pode mais entrar. Até os meus animais de estimação ficaram trancados, sem que a gente tenha como colocar comida para eles”, afirmou a idosa.

Segundo o advogado Olavo Soares Bastos, a Defesa Civil de Maceió sabia que dona Sônia tem problemas de saúde e mesmo assim foi com a polícia para desocupar à força a residência dela.

“Pela manhã, uma equipe da Defesa Civil, Diagonal e Braskem estiveram na casa dela, para tentar convencê-la a sair. Como ela não aceitou deixar o imóvel, eles voltaram à noite para retirá-la a força de casa”, afirmou Olavo.

Ele disse ainda que a casa da dona Sônia não apresenta risco de desabamento e fica numa rua movimentada, com saída para outras vias arteriais no bairro.

Justiça determina evacuação e alguns habitantes decidem ficar em suas casas

A 3ª Vara da Justiça Federal de Alagoas determinou, na quarta-feira (29/11), que seja feito o uso da força policial para retirar os moradores que não seguirem as orientações da Defesa Civil de Maceió e demais órgãos, para saírem das residências por causa do risco de colapso em uma das minas da Braskem. O alerta para evacuação foi dado via SMS para a população.

Com base nessa decisão judicial, um representante da Justiça Federal compareceu na noite de quarta-feira em uma área em que moradores do bairro do Pinheiro se recusam a deixar suas casas. O oficial de Justiça estava acompanhado de policiais da PF, da PM e da Guarda Municipal, além de integrantes da Defesa Civil Municipal, da Prefeitura de Maceió, da empresa Diagonal e da Braskem.

Segundo a bióloga Nirevane Nunes, a coordenadora do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem, a força policial usou de truculência na retirada dos moradores do Pinheiro, que não aceitaram a proposta de indenização da mineradora.

Bióloga Neirevane Nunes é coordenadora do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (Foto: Sandro Lima / Arquivo)

“Uma senhora passou mal e desmaiou, sendo levada pela ambulância às pressas para Unimed, na madrugada de quinta-feira, porque não queria deixar sua casa. Mesmo assim, ela foi retirada da residência dela e o imóvel foi fechado”, afirmou Neirevane.

Segundo ela, a polícia também foi desocupar a casa do procurador do Trabalho Cássio Araújo, que integra o MUVB, no bairro do Pinheiro, na noite de quarta-feira. “Como ele não estava em casa, porque trabalha em Aracaju, arrombaram a porta da casa dele”, denunciou a coordenadora do Movimento.

Ela disse ainda que recebeu um relato dramático de outra moradora do Pinheiro, denunciando que foi retirada de casa de forma truculenta. “Ela disse que até a arma do pai, que estava sem munição, os policiais levaram, sem mandado de busca e apreensão expedido pela Justiça”, afirmou Neirevane, acrescentando que tanto essa moradora como dona Sônia foram despejadas sem receber nenhuma ordem de despejo ou determinação judicial.

Prefeitura e Braskem apresentam suas versões

A reportagem da Tribuna Independente procurou ouvir a prefeitura de Maceió (Defesa Civil) e a Braskem sobre a denúncia de truculência policial, na desocupação dos imóveis no Pinheiro.

“A Defesa Civil de Maceió informou que o cumprimento da ação vem sendo conduzido pela própria Justiça Federal, junto às Polícias Federal e Militar. O Município acompanha a ação por meio das equipes da Defesa Civil, Secretaria Municipal de Saúde e Secretaria Municipal de Bem-Estar Animal”, afirmou a prefeitura, em nota.

Em resposta ao questionamento da Tribuna Independente, a Braskem divulgou posicionamento:

“Desde a noite dessa quarta-feira, 29, a Braskem está apoiando a realocação emergencial dos moradores que ainda resistem em permanecer na área de desocupação. Essa realocação emergencial foi determinada judicialmente, e está sendo coordenada pela Defesa Civil.

A realocação preventiva de toda a área de risco foi iniciada em novembro de 2019 e 99,3% dos imóveis já estão desocupados (dados de 31 de outubro de 2023).

A Braskem continua tomando todas as medidas cabíveis para minimização do impacto de possíveis ocorrências, e segue colaborando estreitamente com as autoridades competentes”.

Mineradora

A Braskem divulgou nota à imprensa, no início da tarde de quinta (30/11), dizendo que “continua mobilizada e monitorando a situação da mina 18, localizada no bairro do Mutange”. E que “os dados atuais de monitoramento demonstram que o movimento do solo permanece concentrado na área dessa mina”.

Área de minas está sob risco de colapso, no bairro do Mutange (Foto: Edilson Omena)


Mineradora diz ter sido intimada em ação de R$ 1 bilhão

Em nota de “fato relevante”, a Braskem comunicou nesta quinta-feira (30) ao mercado e os acionistas que está sendo processada, junto com a Prefeitura de Maceió, por conta da possibilidade do colapso das minas de sal-gema que, caso ocorra, pode provocar uma verdadeira cratera na unidade da mineradora do bairro do Mutange, em Maceió. O valor da causa foi estipulado pela Ação Civil Pública em R$ 1 bilhão.

“A Braskem, no âmbito do evento geológico em Alagoas, vem comunicar aos seus acionistas e ao mercado que foi intimada, na presente data, do deferimento de tutela de urgência requerida pelos autores em uma Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado de Alagoas e Defensoria Pública da União contra a Companhia e o Município de Maceió”, afirmou a petroquímica.

No comunicado, assinado pelo Diretor Financeiro e de Relações com Investidores, Pedro van Langendonck Teixeira de Freitas, a Braskem elenca os pedidos feitos pelos órgãos ministeriais, para que a empresa explique o que está acontecendo com a operação de tamponamento das minas e aumente a área de criticidade contida no Mapa de Risco, traçado em parceria com a Defesa Civil Municipal.

Foi solicitada a “inclusão da nova área de criticidade no Mapa da Defesa Civil e no Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação (“PCF”) instituído pela Companhia em Maceió, e viabilizar a inclusão facultativa de todos os atingidos cujos imóveis estão localizados nessas áreas de criticidade, com a atualização monetária correspondente aos valores praticados pelo Programa”, afirmou a mineradora.

Na ação, os órgãos ministeriais solicitam também “a contratação de empresa independente e especializada para a identificação do alegado dano material dos imóveis”. Pedem ainda “a contratação de assessoria técnica independente e especializada, a fim de dar suporte ao atingido (morador) na avaliação dos cenários e tomada de decisão acerca de sua realocação ou permanência na área”.