Cidades

Destino de bairros atingidos por afundamento ainda é indefinido

Discussões sobre as áreas esvaziadas de Pinheiro, Bebedouro, Mutange e Bom Parto podem levar até dois anos para começar

Por Evellyn Pimentel com Tribuna Independente 11/08/2020 08h24
Destino de bairros atingidos por afundamento ainda é indefinido
Reprodução - Foto: Assessoria
Um ano e meio após as primeiras desocupações, nem órgãos de controle, tampouco a Braskem sabem ou divulgam qual destino será dado para as áreas esvaziadas nos bairros do Pinheiro, Bebedouro, Mutange e Bom Parto. O acordo firmado em janeiro deu prazo de até dois anos para que a Braskem retire os moradores das áreas críticas. Ou seja, a discussão sobre o que será feito pode ser iniciada apenas após este prazo e a concretização pode levar ainda mais tempo. Em meio às polêmicas envolvendo a desocupação dos quatro bairros, moradores também questionam e temem que a região vire uma “área fantasma”. No Mutange, por exemplo, após a desocupação da encosta e interdição da Rua Major Cícero de Góes Monteiro o cenário se assemelha a um “filme de terror”. No Pinheiro, as demolições de oito blocos deixaram um vazio num dos pontos residenciais mais antigos da região. Em Bebedouro, moradores temem que o histórico bairro “suma do mapa”. Já no Bom Parto, o avanço das rachaduras e da Lagoa Mundaú põe em xeque as condições já precárias de moradia. A estimativa é de que mais de mil casas estejam em situação crítica, afirma a liderança do bairro. Desde as primeiras desocupações aspectos como criminalidade, proliferação de pragas, possibilidade de invasões e retorno às moradias são alguns pontos discutidos entre os moradores, tanto os que saíram como os que permaneceram. Segundo Augusto Cícero, presidente da Associação de Moradores do bairro de Bebedouro, a ampliação da área de criticidade tem causado pânico entre os moradores que permanecem. “A situação em Bebedouro se complicou muito. Foi incluída mais uma parte e o medo dos moradores é que o bairro se transforme em outro Mutange, num bairro fantasma. As pessoas com problemas de saúde, muita reclamação, muita tensão, a situação não é boa. Pelo que nós estamos vendo o bairro amanhã vai virar um deserto. Há uma indignação muito grande por parte dos moradores. Os moradores de Bebedouro não imaginavam que isso iria chegar desse jeito [ampliar], mas chegou”, detalha Augusto. A Tribuna Independente buscou respostas dos órgãos de controle envolvidos na questão e da Braskem para expor quais caminhos poderão ser tomados na resolução do problema. No mês passado, o Ministério Público Estadual (MPE) instaurou um inquérito civil público sobre os danos no patrimônio dos quatro bairros e as implicações disto no contexto da capital. Em outras palavras, o MPE quer saber qual o real impacto da desocupação para o espaço urbano de Maceió. “A investigação pretende medir a extensão dos danos urbanísticos causados pela extração mineral, além de buscar, junto a quem de direito, as adequadas soluções arquitetônicas quanto a destinação, restauração e/ou o aproveitamento dos citados espaços vazios deixados. Também será objetivo do Ministério Público apurar e, se for o caso, apontar as responsabilidades reparatórias pelos danos causados à ordem urbanística da capital alagoana”, diz o MPE. Órgãos e Braskem sequer começaram a planejar   O Ministério Público Federal (MPF) também acompanha o tema. Na ação impetrada pelo MPF constam aspectos como o dano ambiental e urbanístico. No entanto, não há prazo ou planejamento sobre a real destinação das áreas. “Quanto às questões urbanísticas, mais à frente, serão discutidas no âmbito da nossa ação ambiental, a partir do plano socioambiental. Para o presente, o MPF continua a cobrar a execução do Termo do Acordo para Apoio na Desocupação das Áreas de Risco, nos autos da Ação Civil Pública nº 0803836-61.2019.4.05.8000 - em trâmite na 3ª Vara Federal de Alagoas-, para que a Braskem garanta o controle de pragas, realize tamponamento e também a segurança patrimonial. Considerando ainda a necessidade de que o poder público cumpra sua parte”, diz o MPF. Na prática, o destino dessas áreas segue indefinido. Procurada, a Braskem afirma que tem dado prioridade à desocupação das áreas de risco. A petroquímica diz ainda que uma decisão sobre o futuro das áreas será tomada “posteriormente”. “No primeiro momento, todo o esforço foi direcionado para a realocação dos moradores, por uma questão de segurança. O acordo – firmado e acompanhado pelas autoridades públicas – estima um prazo de até dois anos para a conclusão do Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação. A destinação da área desocupada será discutida posteriormente com as autoridades competentes. Até lá, a Braskem segue implementando ações nos bairros, a exemplo do mutirão de limpeza, controle de pragas e do programa de segurança patrimonial. As medidas são adicionais às realizadas pelo poder público”, afirma. MUDANÇAS De acordo com a petroquímica, em seis meses, mais de 2,6 mil mudanças foram realizadas das áreas de risco e que as negociações continuam com os moradores. “Após seis meses de acordo, o programa já realizou 2.618 mudanças de famílias das áreas de risco. Além disso, 721 propostas de compensação financeira foram aceitas pelos moradores. As negociações continuam acontecendo à distância, por conta da pandemia de covid-19, e seguem o cronograma homologado pela Justiça. Nas últimas semanas, uma ampliação da área de desocupação, com a inclusão de cerca de 1.918 imóveis conforme levantamento da Defesa Civil, vem sendo discutida com as autoridades, visando a adequação das medidas conjuntas nos bairros. Essa possibilidade de ampliação já estava considerada no acordo de janeiro.” ENTENDA O CASO O processo de afundamento de solo, apontado pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM) como decorrente da extração de sal-gema vem afetando mais de 40 mil moradores no Pinheiro, Bebedouro, Mutange e mais recentemente no Bom Parto. A situação de calamidade pública foi decretada no fim de 2018 e renovada por duas vezes, a última em julho pela Prefeitura. Desde o dia 3 de março de 2018 quando um tremor de 2,5 na escala Richter foi sentido no Pinheiro e adjacências a escalada de rachaduras em imóveis e vias não parou de se intensificar.  Devido ao problema, mais de 2.500 moradores já deixaram seus imóveis no Pinheiro. Em 3 de janeiro deste ano um acordo judicial firmado entre órgãos de controle e a Braskem estabeleceu a retirada de 17 mil pessoas das áreas de maior criticidade dos quatro bairros.  Além de retirar as pessoas, a Braskem deve indenizar. As ações, previstas no acordo podem levar até 2 anos. Em cronograma divulgado pela Braskem e órgãos de controle, a saída dos moradores das áreas consideradas de risco deve ocorrer até o dia 1º de abril. No entanto, um relatório do CPRM pede que a área de desocupação seja expandida devido à aceleração do processo. As análises apontam que entre os anos de 2016 e 2019 já houve 70cm de afundamento. Em junho, uma modificação no nível de risco determinou a desocupação de mais 1.900 imóveis nas regiões monitoradas.