Cidades

Quadrilhas juninas se reinventam na pandemia

Grupos realizam lives no isolamento; não poder se apresentar este ano causa em quadrilheiro sentimento de frustração

Por Tribuna Independente com Lucas França 24/06/2020 09h52
Quadrilhas juninas se reinventam na pandemia
Reprodução - Foto: Assessoria
Para os amantes de quadrilha junina, a pandemia do novo coronavírus (Covid-19) trouxe muita nostalgia e tristeza em não poder se apresentar durante o mês de junho. Muitos grupos já estavam com 80% pronto para as apresentações segundo a Liga das Quadrilhas Juninas de Alagoas (Liqal). Os grupos guardaram tudo para as apresentações no ano que vem. “Assim que tudo voltar ao normal, todos darão continuidade aos seus projetos num todo. Pois a grande maioria já estava com 80% dos projetos prontos’’, pontua José Cláudio Menezes da Costa, vice-presidente da Liqal e presidente da Quadrilha Junina Luar do Sertão. Ele diz que todas as atividades dos grupos juninos, como os ensaios, eventos para angariar verbas, confecção de figurinos de produção, tiveram que parar em decorrência da pandemia. “A promoção de lives foi exatamente a alternativa encontrada para tentar levar ao nosso público um pouco dos festejos juninos. A maioria dos grupos usou essa alternativa, por exemplo: Quadrilha Santa Fé, Luar do Sertão, Xodó e Xamego, Flor de Chita e outras. Inclusive a própria liga vem realizando lives, tanto de diversão quanto de informação. Nesse momento de isolamento, as lives são a melhor alternativa. Acredito até que, mesmo quando tudo voltar ao normal, no São João de 2021 teremos lives, uma vez que estão sendo um sucesso’’. Para os quadrilheiros, a frustração é imensa, mas sabem que logo tudo vai passar. “O sentimento é de nostalgia e saudades daquilo que não pode ser vivido esse ano. Não ter festa de São João era inimaginável. Faz parte das tradições populares do Nordeste. Muito triste mesmo’’, fala Diogo Lima, presidente da Quadrilha Junina Amanhecer no Sertão, do Benedito Bentes, em Maceió. Membros da quadrilha junina estão realizando um trabalho também por meios remotos. Com temas diferentes e importantes na produção e formação do espetáculo apresentando pela quadrilha. “Uma alternativa foi produzir conteúdo digital e realizar lives para levar ao público um pouco da magia do movimento junino. Apesar da distância física a interação em tempo real vai acalmando o coração dos quadrilheiros. A quadrilha estava na etapa de fechar com os fornecedores, comprar os insumos e iniciando a fabricação de cenários. O investimento não foi muito alto, pois estava ciente dos decretos e paralisações de alguns setores da economia e principalmente o cultural’’, pontua Diogo. Para o quadrilheiro, a expectativa para o São João 2021 só aumenta, e com ela a responsabilidade de realizar um trabalho ainda melhor. “Quanto às lives, a quadrilha tem feito algumas com as pessoas da própria junina. Já teve com maquiador, já teve sobre teatralidade no meio junino, teve com o marcador. A última será a live da banda dia 29 de junho’’. A presidente da junina Dona Ciça, de Arapiraca, região Agreste de Alagoas, Roxanne Rodrigues, ressalta que, antes do primeiro decreto de isolamento social, a equipe passou por momentos de incertezas em relação se ocorreria ou não os festejos juninos em sua forma tradicional. “Passamos por um momento difícil de incertezas se ocorreria as festividades juninas em 2020, após isso tivemos a confirmação que não seria possível este ano realizarmos o São João e as quadrilhas apresentarem seus espetáculos. Tivemos um sentimento de frustração pois já estávamos há cinco meses trabalhando no espetáculo 2020 e nutríamos a esperança da pandemia não se prolongar e se conseguisse realizar um São João nem que fosse fora de época’’. Segundo a quadrilheira, os membros da junina, apesar de frustrados entendem a situação. “Entendemos desde o início a importância do isolamento para a preservação da vida, apesar da tristeza de não poder fazer quadrilhas, nós quadrilheiros desde começo colocamos a vida de todos em primeiro lugar e permanecemos em casa”. “Tivemos que cancelar um evento que já estava anunciado e programado’’ Na semana do Decreto estadual, a junina Dona Ciça estava para realizar um evento show de arrecadação de fundos para o projeto e custear o espetáculo. “Não pôde acontecer como queiramos, mais realizamos de um formato digital, como sorteio dos prêmios rifados pela rede social Instagram em formato de live. Já estávamos a todo vapor na construção do espetáculo. Então já havíamos iniciados alguns processos criativos. Agora está tudo parado. Após a pandemia iremos dar continuidade’’, ressalta Roxanne. [caption id="attachment_383686" align="alignleft" width="300"] Junina Dona Ciça de Arapiraca (Foto: Cortesia)[/caption] Ela explica que, com a pandemia e a não realização das apresentações em 2020, o projeto será apresentado ano que vem. “A expectativa só aumenta para podermos apresentar ao público o lindo espetáculo que está em preparação. Será árduo pelo que a cultura está passando neste período de pandemia, mas estamos ansiosos para voltar aos trabalhos e finalizar com um maravilhoso espetáculo junino’’, pontua a presidente da junina Dona Ciça. Até tudo isso passar, a quadrilheira conta que os projetos do grupo não param. “A Quadrilha Dona Ciça vem realizando lives com diversos temas para mantermos forte nossa cultura. Já foram algumas e no decorrer do mês iremos realizar mais. É momento de se conectar e viver o São João da forma segura para todos. Hoje a internet nos proporciona isso, podendo ‘matar’ um pouco a saudade dos quadrilheiros pelos palhações...’’ Para José Cláudio, vice-presidente da Liqal, o prejuízo maior com a pandemia é emocional. “Ao meu ver, o único prejuízo é você não ter o prazer de se apresentar ao vivo para o público, pois todo o restante é aproveitável. O que nos deixa triste mesmo é não viver o dia a dia dos festejos juninos.” Ele ressalta que também houve prejuízos financeiros aos grupos. “Mesmo não sendo um grande investimento, os órgãos públicos, tanto municipal como estadual, sempre têm colaborado com os grupos. Com a pandemia, não haverá esse investimento’’. PSICÓLOGO O psicólogo Carlos Gonçalves explica que frustração é um sentimento de impotência quando algo que era esperado não acontece. “Sentir alguma frustração leva a um desânimo e incômodo. Eles costumam criar obstáculos para que a pessoa realize o que gostaria. Essa decepção pode causar uma desestruturação emocional em vários níveis que acarreta consequências mais sérias. Ao mesmo tempo, sentir-se frustrado é essencial para o desenvolvimento da mente dos seres. A partir das experiências frustradas é possível aprender, crescer e criar novas formas funcionais de interagir com o mundo”. [caption id="attachment_383688" align="alignleft" width="300"] Psicólogo Carlos Gonçalves diz que é normal acontecer essa ansiedade (Foto: Cortesia)[/caption] ”Nós moramos numa região onde a tradição junina é muito forte, os concursos de quadrilhas fazem parte da vida dos nordestinos, e principalmente daqueles que fazem dessa arte, sua motivação, sua alegria, dançar para essas pessoas é liberdade é sonho. Mas, infelizmente, um vírus invisível mudou toda essa programação. Entender cada evento como uma oportunidade de mudança e uma chance para fazer diferente é um objetivo que se alcança a passos curtos. Primeiro compreendendo suas ações. Depois agindo para modificá-las em seu benefício, transformando o sentimento de frustração em motivação. E observar se pode fazer algo para mudar e pensar que tudo isso passará logo”, esclarece.