Cidades

“Programa de segurança em bairros afetados por afundamento é falho”

Para sociólogo, medida é ineficaz e não resolve problemas das localidades: “ação serve mais para dar satisfação”

Por Texto: Evellyn Pimentel com Tribuna Independente 18/04/2020 09h38
“Programa de segurança em bairros afetados por afundamento é falho”
Reprodução - Foto: Assessoria
As medidas complementares de segurança implantadas pela Braskem nos bairros do Pinheiro, Bebedouro, Mutange e Bom Parto têm sido alvo de reclamações dos moradores. Consultado pela reportagem, o sociólogo Jorge Vieira avalia que a medida serve “para dar satisfação” e não seria eficaz para resolver a desenfreada onda de invasões e furtos nos bairros. “A gente sabe que é uma questão paliativa, de um problema que tem um impacto muito grande, incomensurável de destruição das famílias. Ele é totalmente ineficaz, é um paliativo que não atende. A gente vê constantemente casas sendo invadidas, isso é muito mais uma ação da Braskem para dar satisfação à população e a mídia ao profundo desgaste do que para resolver o problema. Essa medida não é eficaz, é uma ação para dar satisfação ao status social do que propriamente o benefício da sociedade que já foi afetada”, avalia o sociólogo. A ex-moradora do Mutange, Vanessa Santos conta que foi procurada para inclusão no programa de monitoramento da comunidade, mas considera a medida um “desrespeito” aos moradores. “Eu acho uma afronta, um desrespeito por parte da empresa, depois de tudo que passamos, depois de termos sido expulsos das nossas próprias casas, colocarem os bairros em risco, eles contratarem esses mesmos moradores para monitorar a área. Eles que façam parceria com Sesau para combate à dengue, ou outra coisa parecida. Os moradores estão adoecidos, é depressão, ansiedade... aí vai chamar o morador? Porque durante todo esse tempo de exploração eles não aproveitaram os moradores? Só depois de destruir tudo resolveram usar a mão-de-obra?” questiona. Eduardo Araújo ainda reside no bairro do Pinheiro e afirma que os moradores que ficaram no bairro precisam de mais segurança. Ele diz que as invasões tem ocorrido também nos imóveis que não foram desocupados. Os crimes têm ocorrido diariamente, segundo ele. “Eles já implantaram o programa, mas quem ficou no bairro, assim como eu, pensou que seria uma ronda constante, só que eles fazem mais a ronda onde foi desocupado. Eu moro no Pinheiro e essa semana, o segurança que eu pago para olhar a rua avisou que estavam tentando entrar numa casa em frente a minha, e nessa casa ainda tem gente morando. Também fiquei sabendo que numa outra casa, a moradora flagrou o meliante dentro do seu imóvel. Lá na parte alta, na região da encosta, tem um cidadão que é oficial de justiça e teve que voltar para a casa dele porque foram pegos dois camaradas na casa dele e já iam encostar o caminhão para tirar tudo, até as telhas e madeiras”, comenta. Ele afirma que é preciso que se faça mais na região. Atualmente ele diz que a sensação é de insegurança. “Essa patrulha não estou vendo muito efeito. A patrulha comunitária na região da encosta só funciona de dia e ao invés de circularem nas ruas, a gente vê batendo papo. Não estou vendo efeito, nem futuro nisso não. A expectativa dos moradores era ter uma segurança preenchendo as lacunas que a segurança pública não estava conseguindo preencher, mas não está acontecendo isso”. Fernanda Valéria é outra moradora que continua no bairro do Pinheiro. Ela também questiona as ações de segurança, tanto as públicas quanto as implantadas pela Braskem. “As invasões são recorrentes. Que modelo de segurança é esse? Eu mesmo já interpelei as equipes porque estavam invadindo uma casa na rua atrás da minha e disseram que iam acionar o coordenador, mas não fizeram nada. Eu estou acionando a polícia, porque não vejo nada, dizem que eles passam, mas só passa com carro e pronto. Eu deixo de sair porque tenho medo da casa ser invadida, eles não garantem nada a gente, é um faz de conta”, reclama. “População afetada está vivendo o caos” Jorge Vieira esclarece que a situação dos moradores dos quatro bairros inviabiliza medidas “comuns”, isto é, ações que em condições típicas dariam certo não podem ser aplicadas no caso dos bairros que passam por afundamento. “Uma coisa é você colocar um programa numa situação normal, com eficácia muito significativa, outra coisa é você pegar bairros nessas condições. É uma população que está vivendo um caos. Eu fui na comunidade, ouvi pessoas, moradores comuns, microempresários, todos que viviam no Pinheiro. O Pinheiro hoje é um caos, o impacto que todo esse processo da Braskem, as escavações é um drama que tem impacto psicológico, psicossocial. Tenho informações de pessoas que morrem, estão morrendo, porque construíram suas vidas ali. Teve gente que investiu, comprou... Analiso do ponto de vista do impacto psicossocial, econômico, as pessoas estão vivendo uma profunda crise de perspectiva”, defende. De acordo com informações da Braskem, as medidas de fiscalização de irregularidades foram implantadas desde o último dia 3 deste mês e são “adicionais” às medidas já realizadas nos bairros do Bebedouro, Mutange e Bom Parto pelo poder público. “A proposta, já apresentada para a Secretaria de Segurança Pública de Alagoas, foi construída em conjunto com a área de Segurança Corporativa da Braskem e líderes comunitários dos bairros, que sugeriram que a fiscalização fosse feita por pessoas conhecidas no local e que já conhecem a vizinhança. São duas equipes de 26 pessoas, num total de 52 contratados formalmente por uma empresa especializada em segurança patrimonial, que já estão realizando a capacitação para o trabalho em uma série de treinamentos. A equipe vai atuar como apoio de comunicação e alerta”, disse a empresa em comunicado liberado à imprensa. Já no Pinheiro, ocorre uma prestação de serviço de segurança motorizada contratado pela empresa. Segundo a Braskem entraram em vigor esta semana e “complementa a fiscalização comunitária que está em andamento nos bairros do Mutange, Bebedouro, Gruta do Padre e Bom Parto”. “As rondas de vigilância motorizada no Pinheiro contam com uma equipe total de 80 profissionais qualificados, contratados formalmente por uma empresa especializada em segurança patrimonial, que se dividem em turnos durante 24 horas por dia. As rondas são feitas com carro e motocicletas e o equipamento inclui rádio e celular, além de fardamento. O programa conta ainda com equipamentos para vigilância eletrônica. Além de registro periódico de imagens via drone no bairro, sistemas de alarme e câmeras de segurança começam a ser instalados no final de abril, com previsão de conclusão no final de maio, quando também passa a funcionar uma central de monitoramento. A central vai reunir todas as informações levantadas pelos equipamentos eletrônicos e pelas equipes de campo para o devido encaminhamento. Haverá comunicação às autoridades policiais e, quando necessário, abertura de boletim de ocorrência”, explicou a petroquímica.