Cidades

Mercado de módulos escolares é alvo de reclamações e denúncias

Só este ano, Procon Maceió registrou 40 reclamações; Sinpro afirma que venda criou comercialização paralela de lucro às escolas

Por Texto: Evellyn Pimentel com Tribuna Independente 08/02/2020 11h21
Mercado de módulos escolares é alvo de reclamações e denúncias
Reprodução - Foto: Assessoria
A compra de módulos escolares ou sistemas de ensino é um dos “fantasmas” que assombram pais no início do ano letivo. Cada vez mais extensos, dinâmicos e caros, os módulos chegam a custar, em alguns casos, mais de R$ 2 mil.  Só no mês de janeiro, o Procon Maceió recebeu 40 denúncias formalizadas sobre o assunto. Para os pais sobram reclamações e segundo o Sindicato dos Professores da Rede Privada (Sinpro) o comércio funciona à base de “terrorismo financeiro”. “Só no início de 2020, o Procon Maceió recebeu cerca de 40 reclamações sobre o possível abuso na venda de módulos e livros escolares e cinco (5) escolas foram notificadas a esclarecer os possíveis abusos. Em 70% dos casos das reclamações recebidas, os pais não se identificaram. Ainda assim, os casos mencionados estão sob apuração com o devido processo legal”, informa o Procon Maceió. A pedagoga Andreza Teixeira de Lima conta que tem vivido um verdadeiro embate com a escola em que seu filho estuda. O sistema de ensino utilizado na instituição custa R$ 1.800. Na tentativa de reduzir os custos, ela comprou um o material utilizado por outro aluno no ano passado, pagando R$ 500 e foi surpreendida com a recusa da escola. “Disseram que meu filho poderia usar, mas que ele não teria como fazer as atividades online. Que teria que comprar um novo pacote para utilizar as aulas online. Aí todo o material vai ficar encalhado em casa? Porque o material não pode vender, porque as pessoas que comprariam, os filhos não vão poder utilizar, a chave de acesso é inutilizada. A escola me disse: Se quiser comprar usado não tem problema, só que ele não vai ter acesso as atividades online. Só que os professores quantificam as atividades, elas valem pontos para agregar às notas. Essa é uma estratégia para forçar você a comprar. Forçar o aluno a ter esse material. O aluno começa o ano sem saber o quanto vai valer de pontuação, eu consegui comprar por menos da metade do preço e meu filho não vai poder utilizar, vou ter que comprar tudo de novo. Porque ele fica receoso, que os professores estão passando atividades. Cheguei a conversar  com a direção para que os alunos que não estivesse com a chave de acesso fizessem atividades complementares, mas disseram que não podiam fazer nada, que o sistema já vinha pronto para a escola aplicar”, detalha. A situação não foi exclusiva, segundo Andreza. Outros pais têm enfrentado problemas com a compra de módulos tanto pelo valor quanto pela dificuldade em reutilizar materiais de outros anos. “Na verdade fui eu e mais duas amigas na mesma situação. As escolas particulares estão vendendo sistemas de ensino. A escola vende o sistema e aqueles livros que deveriam ser utilizados de um ano para o outro agora ficam inutilizados porque existe uma chave de acesso, uma senha quando compra esse pacote de livros, aí vem junto o acesso para um sistema online que tem atividades online e aulas. Antigamente os livros não eram consumíveis, você comprava o livro e podia doar, vender. Os livros eram reaproveitados. Agora com essa chave não mais. O valor é muito alto, é exorbitante. Um material imenso, a meu ver é humanamente impossível o aluno dar conta de todo aquele material, e você compra um material caríssimo, no ano seguinte o material está novo e você não pode fazer nada. As escolas são irredutíveis”, critica. O Procon Maceió esclarece que diante de práticas abusivas, os pais e responsáveis podem acionar o órgão de proteção. “O Procon Maceió esclarece que a prática de venda de módulo nas escolas particulares é legalmente permitida. Os pais e/ou responsáveis têm livre arbítrio para escolher a escola/método de ensino que desejam para seus filhos. Ainda assim, o Procon alerta que os casos de possíveis abusos devem ser denunciados para a devida apuração do órgão”, diz. Sinpro denuncia sistema paralelo de lucros O presidente do Sindicato dos Professores dos Estabelecimentos Privados (Sinpro-AL), Eduardo Vasconcelos, explica que é comum a entidade receber reclamações de pais envolvendo o mercado de módulos escolares. Eduardo concedeu entrevista no início da semana ao programa TH Entrevista, da TV Tribuna denunciando a situação. Para ele, há um mercado paralelo de lucros envolvendo as escolas. [caption id="attachment_354253" align="aligncenter" width="884"] Vasconcelos destaca que sistemas de ensino ofertados por algumas escolas podem custar mais de R$ 2 mil (Foto: Adailson Calheiros)[/caption] “A gente recebe reclamações no sindicato, só que o sindicato age na relação de emprego. Sempre informamos para que seja encaminhado ao Procon, para que faça esse levantamento. Na verdade, isso é um lucro muito grande, a gente sabe disso, mas não entra na negociação salarial dos ganhos, dos lucros, é como se fosse suprimida, é uma grande caixa-preta que ninguém toca no assunto. Ninguém sabe, nesses módulos, por quanto as escolas pegam e quanto as escolas ganham quando vendem, isso deveria estar na planilha, para reajustar a mensalidade isto deveria estar na planilha. A grande reclamação dos pais é que antes era possível o livro passar de uma pessoa para outra. Existia feira de livros, era comum. Hoje, muitas escolas não aceitam material de um ano para outro. Isso é lucro da escola, se a gente não sabe, nem os pais sabem, tanto é que reclamam tanto... Por que não abre a caixa-preta? As escolas não querem abrir. A maioria das escolas grandes trabalham com esses sistemas de ensino. Virou uma onda tão lucrativa que até as escolas de médio e pequeno porte também estão aderindo”, denuncia Vasconcelos. Os sistemas de ensino ofertados por algumas escolas podem custar mais de R$ 2.000. Na prática, segundo o presidente da entidade, os valores não entram nos cálculos de reajuste de mensalidade, tampouco nas negociações salariais da categoria. “Os valores chegam a R$ 2.000 em algumas escolas. Se um material que custa R$ 2.000 numa escola com três mil alunos, quanto isso dá de lucro? É um comércio extremamente lucrativo. Na minha concepção isso é venda casada, só pode ser na escola, só pode ser naquele ano. É um terrorismo financeiro. É uma fortuna, uma escola de grande porta tira basicamente a folha de pagamento só com essa venda. Se a gente soubesse de forma objetiva, na hora da negociação seria muito melhor, porque mesmo com inadimplência, o lucro de material entraria na conta”, avalia Vasconcelos. VENDA CASADA? Para Eduardo Vasconcelos a prática deveria ser alvo de rigorosas fiscalizações. Ele também defende que os pais procurem órgãos de proteção e a Justiça caso enfrentem problemas. “Tudo bem que o conhecimento é dinâmico, mas Matemática, Física, Química, conhecer um elemento químico novo demora décadas. Será que o conhecimento está tão dinâmico assim que justifique que o livro mude todo o ano? Na minha área mesmo, Língua Portuguesa eu sei que não é. Houve a Reforma, foi que mudou basicamente em dez anos. O que não justifica que um irmão não possa passar para o outro. Código? E se o aluno repetir, o pai tem que comprar de novo? É comum, a gente recebe direto ligação e pede que procure Procon, Justiça, isso virou um filão extremamente lucrativo e eles mantêm em segredo.” Segundo o Procon Alagoas, a venda de sistemas de ensino pelas escolas é uma prática legal. O consumidor deve ficar atento para a chamada “venda casada” onde a escola exige a compra do livro mediante matrícula. “O módulo pode ser cobrado à parte, o que não pode, é ser exigido que o módulo seja comprado juntamente com a matrícula, porque aí configura venda casada. O aluno tem direito a matrícula mesmo sem comprar o módulo. Porque ele pode querer reaproveitar o módulo de uma irmã, colega por exemplo. E diante de prática abusiva os pais podem abrir uma denúncia ou reclamação pelos números 151, 98876-8297, aqui na nossa sede na Rua do Livramento no Centro, ou na central de atendimento nos Já’s”, destaca o Procon Alagoas. Também segundo o Procon estadual há registros de reclamações contra as instituições envolvendo a compra de livros, no entanto, as denúncias são contabilizadas como reclamações em geral contra as escolas. O Sindicato das Escolas Particulares de Alagoas (Sinepe-AL) foi procurado para comentar o assunto, mas até o fechamento desta edição, a presidente da entidade, Bárbara Heliodora, não atendeu ou retornou os contatos realizados.