Cidades

Audiência pública explica acordo da Braskem, mas lideranças de bairros discordam

Lideranças afirmam que moradores dos bairros não foram ouvidos para o acordo

14/01/2020 21h56
Audiência pública explica acordo da Braskem, mas lideranças de bairros discordam
Reprodução - Foto: Assessoria
Uma audiência pública sobre o caso de afundamento de bairros em Maceió aconteceu no final da tarde desta terça-feira (14), no Ginásio do Cepa, no bairro do Farol, em Maceió. Com o local lotado de moradores dos bairros Pinheiro, Mutange, Bom Parto e Bebedouro, a audiência prolongou-se até a noite e serviu como um diálogo entre moradores e os órgãos que estão lidando com a situação, principalmente para explicar melhor o acordo feito entre os órgãos e a Braskem. No ginásio, estavam presentes representantes do Ministério Público Estadual (MPE), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública do Estado de Alagoas (DPE) e Defensoria Pública da União (DPU). A Braskem – apontada como responsável pelo afundamento por causa do processo de mineração nos bairros – não enviou representantes. As lideranças dos bairros afetados marcaram presença e afirmaram que não ficaram nada satisfeitas com o acordo e com a audiência desta terça. O defensor público federal Diego Bruno Martins Alves falou ao público presente que a Defensoria Pública está prestando auxílio a quem reside nos bairros atingidos e necessita de apoio jurídico. O promotor de Justiça José Antônio Malta Marques, representando o Ministério Público Estadual, afirmou que o objetivo principal dos órgãos envolvidos “é trabalhar pelas comunidades dos bairros afetados”. “Nós estamos aqui para dizer a vocês que firmamos esse acordo com os melhores propósitos possíveis. No Brasil, esse é o acordo de melhor valor firmado até hoje”, disse o promotor. O acordo foi feito com anuência dos Ministérios Públicos (MPF e MPE) e das Defensorias Públicas da União e do Estado, e foi homologado na Justiça Federal no último dia 3 de janeiro. Segundo o acordo, aproximadamente 17 mil pessoas, moradoras de aproximadamente 4.500 casas dos bairros do Pinheiro, Mutange, Bebedouro e Bom Parto, serão beneficiadas. O acordo foi estabelecido com base no Mapa de Setorização de Danos elaborado pela Defesa Civil Nacional e Municipal, fundamentado nos estudos da CPRM (Serviço Geológico do Brasil). O acordo prevê a restituição de aproximadamente R$ 3,7 bilhões, até então bloqueados do caixa da Braskem, sendo que R$ 1,7 bilhão será transferido para uma conta bancária da empresa para o custeio do Programa de Compensação Financeira e Apoio à Realocação. “Os senhores não são obrigados a aceitar o acordo. Isso está em cláusula. Mas, se não aceitar, vai ter que entrar em juízo, e aí a situação vai demorar”, explicou o promotor José Antônio Malta Marques. “Povo não participou do acordo” Ouvidos pela reportagem da Tribuna, os principais líderes comunitários dos bairros atingidos tiveram a mesma reclamação: as autoridades deixaram a população de fora do acordo. O líder comunitário do Bom Parto, Fernando Lima, chamou a audiência no Cepa de “vergonhosa”. “Não contemplou a comunidade. Como é que você faz uma audiência depois que você fecha um acordo? Você tem que fazer antes e colher de cada localidade as suas particularidades. Como é que eu vou retirar todo mundo por igual? Não posso. Eu tenho que respeitar as desigualdades de cada um”, disse Fernando. Comentando sobre os 62 imóveis do Bom Parto que foram catalogados pelos órgãos de controle para desocupação, Fernando afirma que é muito mais do que isso. “Infelizmente, a Defesa Civil Municipal está deixando a desejar. A CPRM esteve lá [no Bom Parto] nesta semana e nos perguntou por que ainda estamos lá. São cerca de 400 imóveis que devem ser desocupados”, disse. Arnaldo Manuel é líder comunitário do Mutange e afirmou que a audiência foi útil, porém o acordo não teve a participação de nenhum morador. “A presença de lideranças comunitárias só iriam acrescentar nesse acordo. O morador para aceitar esse acordo, vai ter que assinar o documento e sair da sua casa. Um dos problemas é que a pessoa sai da sua residência e só depois de cinco dias úteis é que o dinheiro do aluguel social cai na conta do morador. Aí eu pergunto, a pessoa que está alugando a casa vai alugar fiado? Vai confiar? Como vai ficar o morador? Na rua?”, questiona Arnaldo. Representante do movimento SOS Pinheiro, Geraldo Vasconcelos era um dos mais revoltados com a situação. “O acordo já foi homologado. Não consultaram a população durante o acordo e agora consultam o povo para tirar dúvidas. Onde está a participação popular neste processo? Desde quando a Braskem apresentou a área de resguardo, a população não foi mais ouvida por órgão nenhum. O que está acontecendo aqui é dizer que está ouvindo o povo para amanhã isso sair na mídia”, afirmou Vasconcelos. Representando o bairro do Bebedouro, Waliston Bastos disse que no bairro há várias casas rachadas. “Teve gente que teve que sair de casa, mas teve que voltar, porque não tinha condições de pagar o aluguel, pois não estavam inseridos no aluguel social. A gente está dormindo com medo de não acordar no dia seguinte”, comentou Waliston. Texto: Rívison Batista Fotos: Adailson Calheiros

Representante do Bom Parto, Fernando Lima, fala sobre mais casas que deviam estar no acordo

Geraldo Vasconcelos, do SOS Pinheiro, diz que acordo foi homologado sem participação popular

Ginásio do Cepa ficou lotado durante audiência pública