Cidades

Paisagem histórica sofre alterações com retirada de árvores centenárias no Centro

Historiador e urbanista defendem alternativas de preservação da Rua Augusta como espaço verde para população da capital

Por Emanuelle Vanderlei com Tribuna Independente 12/12/2019 09h19
Paisagem histórica sofre alterações com retirada de árvores centenárias no Centro
Reprodução - Foto: Assessoria
A árvore que caiu no final da tarde da última terça-feira (10), no Centro de Maceió, causou não apenas tumulto e correria na hora, mas uma grande mudança na paisagem. Conhecida tradicionalmente por Rua das Árvores, apesar de na verdade se chamar Rua Augusta, uma das principais vias do bairro foi condenada a perder cinco das dezenas de oitizeiros que formam a paisagem do local. A Prefeitura de Maceió explica que o serviço está sendo realizado conforme a avaliação técnica de engenheiros agrônomos do Núcleo de Monitoramento Arbóreo (Numa) da Superintendência Municipal de Desenvolvimento Sustentável (Sudes), que determinaram a retirada em decorrência do risco eminente de tombamento pelo estado sanitário dos exemplares. Nesta quarta (11), um dia depois da queda, Fernanda Souza, que trabalha diariamente em uma calçada próxima ao local onde aconteceu o incidente, relatou o momento. “Estalou, deu uns quatro estalos e caiu em câmera lenta. Os galhos amorteceram a queda e caiu por cima dos carros. Graças a Deus não tinha ninguém embaixo. Deu tempo de correr porque todo mundo viu ela caindo”, ela garante que não ficou com medo de ir trabalhar no local no dia seguinte. Fernanda já sente falta das árvores. “O ventinho que trazia e a sombra fresca... era uma sombrinha ótima, essa hora [15h] não tinha mais sol”, conta ela se protegendo em um guarda sol. O engenheiro agrônomo Valdir Martiniano é um dos servidores da Sudes que diariamente realizam o acompanhamento das árvores na capital e explica as causas do incidente. De acordo com os critérios avaliados, Martiniano esclarece que a árvore estava com infestação de fungos e bactérias gerada pelo lançamento clandestino de esgoto diretamente na raiz principal, que apodreceu e quebrou na base. Segundo a Sudes, há ainda problemas urbanos que ao longo do tempo prejudicaram o estado sanitário e contribuíram para o tombamento. “São árvores que atingiram os 25 metros e que não são recomendadas para vias públicas por conta da altura e diâmetro”, relata Martiniano. A perspectiva da Sudes é de que, com a retirada desses exemplares, podem ser feitas ações de fiscalização para identificar ligações clandestinas, uma das responsáveis pela queda da árvore. Cobertura vegetal tem função de proteger a vida das pessoas na cidade   Segundo o Arquiteto e Urbanista Norlan Dowell, a cobertura vegetal compõe a malha urbana e tem função de proteger a vida das pessoas. “Aumenta a absorção do som, reduz a poluição sonora. E também a polução atmosférica, como a fumaça”, explica. Considerando as altas temperaturas do Nordeste, ele constata que Maceió não é uma cidade arborizada, o que dificulta a locomoção até em pequenos percursos. “O cidadão chega sempre muito suado. As pistas estão desprotegidas nesse sentido”. No caso da Rua da Árvores, a proposta de Dowell é preservar. “São arvores centenárias, as normas atuais não existiam, o fluxo de veículos era quase nulo. Era outra época”. Ele apresenta alternativas. “É um ícone da cidade. O ideal é nunca remover, sempre manter e adaptar. Talvez fosse o caso de modificar o trânsito, transformar aquilo em calçadão”, sugere o especialista. A Prefeitura explica que vai ser avaliado um novo formato de arborização com tipo adequado à via levando em consideração os aspectos urbanísticos e de mobilidade, sobretudo do ponto de vista do fluxo de pedestres e veículos. Norlan defende ainda o aumento da plantação na cidade, mas com cautela. “Cidades que são mais verdes têm uma qualidade de vida muito melhor, mas é preciso verificar estrutura subterrânea e a fiação aérea também”. Citando a Avenida Fernandes Lima, uma das principais vias da cidade, ele critica o problema com as placas de sinalização que acabaram ocasionando uma redução da área verde. “Sinalização foi prejudicada e podaram as árvores. Na pouca cobertura vegetal que temos, é importante pensar em não interferir na vegetação. A Fernandes Lima já é um caos, e agora sem cobertura vegetal fica extremamente quente”. HISTORIADOR O historiador Douglas Apratto vê a mudança com preocupação. “Cortar as árvores e não plantar o dobro é um crime ambiental. Existe uma carência enorme de verde na capital, está relacionado à qualidade de vida da cidade”. Ele lembra que o nome “Rua Augusta” é relacionado a imperatriz, mas assim como o Estádio Rei Pelé, que é mais conhecido pela população como Trapichão, essa via é a Rua das Árvores. “É simbólica, emblemática. Num estado que tem carência enorme de verde, a mercê de calor, esse lugar traz proteção, sombra. Nem parece que estamos em Maceió”. Na perspectiva histórica ele vai além. “O lugar está caracterizado há várias e várias décadas, o prejuízo não é só ambiental, mas histórico. Eu queria que todas as ruas de Maceió fossem a Rua das Árvores, um espaço urbano que se pode passear e ter o aconchego das árvores”.